Uma região onde há pouca chuva, os rios secaram, e o agronegócio avança. Assim sobrevivem aproximadamente 11 mil pessoas no território indígena Xacriabá. Mesmo com tantas adversidades, é possível observar avanços nos hábitos alimentares das 37 aldeias da etnia que ficam no município de São João das Missões (MG).
"Hoje a gente vê as crianças saudáveis. A gente não tem mais aquele impacto de criança doente, porque tem etnia que além das crianças, os adultos também estão [doentes]", relata o indígena Nicolau Gonçalves, a partir da transformação no território com a conquista do Programa Nacional de Alimentação Escolar (PNAE).
Atualmente, as famílias indígenas trabalham com extrativismo sustentável e vendem suas frutas, polpas, raízes e hortaliças para dez escolas da rede estadual de ensino. São mais de 100 famílias xacriabá participando das vendas para as unidades escolares. Os recursos possibilitaram também criar mecanismos para atender as comunidades indígenas mais vulneráveis.
"Era uma comunidade bastante carente, conseguimos comprar uma 'pareia' de boi, carroça, burro para ajudar, caixa para trabalhar o extrativismo. Dentro do projeto também compramos freezer para ajudar no armazenamento. Então assim, essas políticas públicas [do PNAE] deram um passo a frente para o nosso acesso à alimentação", explica Nicolau Gonçalves, destacando as transformações a partir do PNAE.
Desde 2017, Jorge Aparecido de Jesus, sobrevive exclusivamente da venda dos legumes e hortaliças por meio do PNAE. Laranja, ameixa, ponkan, raízes, tubérculos, e até flores. Tudo chega às crianças de 15 escolas de São João do Triunfo, no Paraná.
"Eu espero produzir e continuar entregando o máximo possível para que tanto os meus filhos como as outras crianças recebam um alimento saudável na escola também", ressalta o agricultor.
Jorge é um dos 60 agricultores vinculados à Cooperativa Mista Triunfense dos Agricultores e Agricultoras Familiares, que fornece alimento orgânico e agroecológico na região.
Hoje, a base da alimentação escolar no município é fruto da agricultura familiar. Cresceu também, a partir de 2017, a variedade de produtos entregues às escolas, um salto de 15 para 52 tipos de frutas e verduras. Todos orgânicos. Uma realidade que se contrapõe ao monocultivo do fumo, uma das cadeias produtivas predominantes na região e que não atua para a melhora da qualidade de vida da população.
"Eu vejo que que na verdade já tem até vizinhos, amigos deixaram de assumir a fumicultura e já tão produzindo produzindo verdura. Eu acho que esse é o esse é o caminho", destaca Jorge.
Segundo dados da Rede Brasileira de Pesquisa em Soberania e Segurança Alimentar e Nutricional (Rede Penssan), que acompanha os números da soberania e segurança alimentar no país, em pouco mais de um ano, a fome dobrou nas famílias com crianças menores de 10 anos, subindo de 9,4%, em 2020, para 18,1% na atualidade. O quadro faz com que o fortalecimento da mais antiga política pública de segurança alimentar e nutricional do Brasil se torne uma reivindicação urgente de entidades do campo.
"Nesse último ano a gente sabe que os alunos estão se alimentando mais na escola, a gente sabe que tem alunos que é a única, a base da alimentação deles diária é na comunidade escolar", afirma Silvia Mara Woiciechowski, da Cooperativa dos Agricultores Familiares de São João do Triunfo, ao mesmo tempo que ressalta que desde 2017, os repasses feitos pelo Fundo Nacional de Desenvolvimento da Educação não são reajustados.
Assista:
No fim de agosto, o Governo Federal chegou a vetar uma emenda parlamentar à Lei de Diretrizes Orçamentárias que previa o reajuste de 34% ao PNAE. A proposta tinha sido aprovada em julho, pelo Congresso Nacional, como lembra Silvia Mara.
"Reduzindo a quantidade de produtos já adquiridos na agricultura familiar é eles vão usar do recurso próprio do estado para comprar das empresas. Então acho que isso impacta e muito tanto na questão da agricultura familiar, enquanto cooperativa, enquanto os agricultores, quanto na alimentação escolar, que veja a gente eh manda um alimento saudável pra escola, mas na escola está abarrotada de produtos processados, enlatado então eu acho que isso impacta muito na questão do processo de alimentação dentro da escola mesmo".
Entre os xakriabá, Nicolau Gonçalves aponta que o PNAE favorece a alimentação própria do território.
"Os xakriabá graças a Deus a gente percebe que que a gente vê as criança tudo a vapor, tudo eh da merenda da escola e também o que trabalha na aldeia com a merenda que o pai também usa na nas na casa também a maioria está sendo um está a própria aldeia né? Poucas coisas hoje que estão vindo um pouco do mercado".
O PNAE foi fortalecido em 2009, a partir da lei que garante que 30% dos produtos de estados e municípios devem ser adquiridos da agricultura familiar, responsável por 70% da alimentação das famílias brasileiras.
Edição: Daniel Lamir