Um estudo do NetLab, da Escola de Comunicação da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ), mostrou que a página do YouTube privilegia conteúdos favoráveis ao presidente e candidato Jair Bolsonaro (PL) em anúncios que antecedem vídeos buscados pelos usuários da plataforma. Supostamente, o YouTube estaria reduzindo a disseminação de conteúdos falsos, como aponta a pesquisa.
"Como parte dos esforços para combater a desinformação, o YouTube lançou a campanha #AntesDoSeuPlay. Nela, o YouTube alega reduzir a propagação de conteúdo duvidoso, recomendar conteúdos de fontes confiáveis e recompensar os criadores de conteúdo de qualidade", diz trecho do documento.
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O NetLab realizou 18 visitas-teste entre os dias 23 e 30 de agosto, semana das sabatinas dos candidatos no Jornal Nacional. Nesse período de coleta de dados da plataforma gerenciada pelo Google, os canais do grupo Jovem Pan, de viés bolsonarista, foram identificados 14 vezes na primeira página, com um ou mais vídeos. Os vídeos dos canais Jovem Pan aparecem como primeira sugestão em 55% dos testes.
"Em nossa análise, o vídeo mais recomendado foi da entrevista concedida por Jair Bolsonaro ao Programa Pânico na sexta-feira (26/08). O programa deu espaço ao presidente para exaltar seu atual governo e atacar a candidatura de Luiz Inácio Lula da Silva, rebatendo a sabatina do ex-presidente no Jornal Nacional, realizada na noite anterior", afirma o relatório.
Influência
O estudo lembra que a recomendação de conteúdo tem forte impacto nas escolhas dos usuários, especialmente por fazer acreditar que os vídeos recomendados são baseados em critérios de relevância, e não guiados por acordos comerciais ou outros interesses.
O favorecimento da Jovem Pan pelo sistema de recomendação do YouTube ocorre em dois níveis de mediação, segundo o NetLab: (1) como primeiro vídeo sugerido na homepage e (2) na recomendação de vídeos relacionados ao primeiro clique.
"Isto é, quando se consome o conteúdo sugerido na primeira página do YouTube, o usuário é levado a mais vídeos da emissora mergulhando em um ciclo de retroalimentação auto-referenciado. Este fenômeno é chamado por Benkler et al. (2018) de 'propaganda feedback loop' e seu impacto se intensifica especialmente quando se considera que 70% do que os usuários assistem é fornecido a eles por meio de recomendações", diz o documento.
Explorando a página inicial completa do YouTube, foram identificados 31 canais de conteúdos informativos, pertencentes a 20 grupos de comunicação, que apareceram como sugestões para os 18 usuários anônimos criados. Entre os 31 canais, 8 pertencem ao grupo Jovem Pan que apareceram 25 vezes ao longo do experimento.
Entre os canais mais recomendados, segundo o NetLab, estão Jovem Pan (25), UOL (16), Grupo Bandeirantes (9), CNN (8), O Correio do Povo (7), SBT (6), Metrópoles (5), Fundação Padre Anchieta (5), Conversa Afiada (4), O Povo (3), Fórum (2), Rede TV! (2), MyNews (2), Gazeta do Povo (2), Editora Abril (2) e, com uma recomendação, TV Record, TV Coiote, Rede Litoral, Grupo SADA e Grupo Energia.
Metodologia
Simulando a experiência de um "novo usuário" no YouTube, o NetLab realizou o experimento acessando a página inicial da plataforma. Para isso, os pesquisadores navegaram pela aba anônima do navegador Google Chrome e utilizaram a ferramenta ExpressVPN, configurada para simular a utilização de um usuário brasileiro genérico.
A página inicial do YouTube foi conferida entre uma e três vezes ao dia. Ao todo, 18 acessos foram feitos à página. Nas visitas, foram identificadas quais fontes de conteúdo informativo foram sugeridas pelo YouTube em sua página inicial e a posição dos canais na página. Canais de outros tipos foram desconsiderados (ex: musicais, podcasts etc).
O Brasil de Fato enviou ao YouTube e ao Google questionamentos sobre o estudo da UFRJ. Em resposta, a empresa afirmou que seu sistema de recomendações se baseia "em vários tipos de 'sinais', dados que alimentam o sistema. Esses sinais incluem cliques, tempo assistindo, respostas a pesquisas, número de compartilhamentos, números de cliques em 'gostei' e 'não gostei', entre outros".
O YouTube informou, ainda, que é uma plataforma aberta em que qualquer pessoa pode compartilhar conteúdo, "desde que esteja de acordo com nossas políticas de comunidade" e que seu "robusto conjunto de regras está em constante processo de evolução e busca garantir equilíbrio entre liberdade de expressão e a segurança dos nossos usuários".
A empresa argumentou que desde 2019, seu sistema de recomendação vem passando por atualizações "para reduzir o conteúdo que está no limite das diretrizes" e que, atualmente, o consumo de conteúdo limítrofe que chega por meio das recomendações é inferior a 0,5%. "O YouTube também oferece aos espectadores uma variedade de ferramentas para melhorar a experiência deles na plataforma e decidir quais informações pessoais serão usadas para influenciar as recomendações", diz a nota.
Fonte: BdF Rio de Janeiro
Edição: Eduardo Miranda