Após o Supremo Tribunal Federal (STF) suspender o piso nacional da enfermagem, lideranças partidárias do Senado abriram, nesta segunda-feira (19), uma mesa de negociação para debater possibilidades de fontes de custeio para a medida. Os parlamentares estudam uma série de propostas que já tramitam no Congresso Nacional e que, na avaliação deles, poderiam ser adaptadas para contribuir com o financiamento do piso. O grupo também ventila outras alternativas que podem se converter em novos projetos de lei.
As lideranças debatem atualmente mais de cinco medidas que podem ser adotadas para se canalizar recursos para a sustentabilidade orçamentária do piso.
“Várias alternativas foram discutidas [hoje], como a aprovação do PLP 44, de autoria do senador Heinze (PP-RS), que faz um remanejamento de recursos que já existem nos estados e municípios, mas aquilo fica dentro de uma caixinha e não pode ser utilizado, a não ser naquela função. Seria só um remanejamento, e eu acho que é a maneira mais prática e mais objetiva que nós podemos tomar,” disse após a reunião o relator do Projeto de Lei Orçamentária Anual (PLOA) de 2023, senador Marcelo Castro (MDB-PI).
Entre as possibilidades que pairam na mesa de negociação, há medidas com diferentes vias de financiamento. Além do PLP 44, há, por exemplo, o PL 758/2021, que prevê uma atualização de patrimônio por meio da qual proprietários de imóveis poderiam atualizar o valor do bem junto à Receita Federal. Na visão de alguns parlamentares, o aumento de imposto a ser pago pelo proprietário, nesse caso, poderia ser utilizado para custeio do piso. A proposta está atualmente na Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) da Câmara dos Deputados.
Outra medida possível de ser adotada, na visão de alguns líderes, seria o PL 1417/2021, que fixa um auxílio financeiro a ser dado pela União para Santas Casas e hospitais filantrópicos que atuam pelo SUS. Também se cogita a possibilidade de uma regulamentação da exploração de jogos de azar, proposta detalhada no PL 442/1991, que avançou na Câmara no início deste ano, mas enfrenta resistência de alguns parlamentares, com destaque para a bancada evangélica.
Também se somam às alternativas vislumbradas pelos senadores dois PLs que estão em fase de elaboração pela bancada do PT em associação com a liderança da minoria. Um deles proporia uma alteração na Lei da Partilha (Lei Nº 12.351/2010) para determinar uma descentralização do excedente em óleo correspondente à União por conta do pré-sal para ser encaminhado a estados e municípios em valores proporcionais ao impacto do piso de enfermagem.
A outra medida ainda em gestação seria uma proposta de emenda constitucional (PEC) que estabelecesse a alocação de verbas atualmente destinadas ao orçamento secreto, de forma que esses valores pudessem cobrir os custos adicionais previstos por conta da efetivação do piso da enfermagem.
“Acho que os projetos foram bem escolhidos. Apenas houve complementação de ideias, mas os listados pelo presidente do Senado não sofreram nenhum reparo. Eu diria que eles foram bem recebidos. A questão do RP9 [orçamento secreto] eu diria que é preliminar. Ela fica ali no ponto zero, antes dos demais”, comentou o líder da minoria, Jean Paul Prates (PT-RN), durante coletiva de imprensa, ao pontuar que a medida precisa ser mais bem discutida.
Nos cálculos do líder da minoria na Casa, Jean Paul Prates (PT-RN), o piso custaria anualmente um montante que varia de R$ 16 a R$ 18 bilhões, incluindo os gastos necessários à esfera privada. Para esse segmento, ele acredita que a melhor solução seja a desoneração da folha de pagamento, mas a ideia necessitaria de uma costura a ser feita com o Ministério da Economia.
Teto de Gastos
Marcelo Castro (MDB-PI) calcula também a chance de o piso da enfermagem ficar de fora do Teto de Gastos do próximo ano. Ele apontou essa sugestão durante a conversa com senadores. O relator projeta que o assunto poderia constar em uma emenda constitucional, mas anunciou que ainda irá se reunir nesta terça (20) com Rodrigo Pacheco (PSD-MG) para debater melhor a ideia e ajudar a costurar soluções para o entrave. O presidente do Senado está atuando como presidente interino do país por conta da viagem de Jair Bolsonaro (PL) à Inglaterra.
“Estamos discutindo essa alternativa e o Pacheco vai, naturalmente, chamar os técnicos pra gente discutir. Nós vamos encontrar uma maneira de tentar resolver esse problema sem maiores danos, mas que nós vamos resolver, vamos”, assegurou Castro.
Encaminhamentos
De acordo com o líder da oposição, Randolfe Rodrigues (Rede-AP), Pacheco irá iniciar “uma série de conversas e tratativas” especialmente com o Ministério da Economia para discutir o tema e apontar alternativas de financiamento. O presidente interino também deve tratar do assunto com os ministros da Casa Civil, Ciro Nogueira, e da Secretaria de Governo, Célio Faria.
Ainda segundo Randolfe, as mobilizações incluem também a convocação de uma nova reunião entre senadores nos próximos dias – provavelmente na quinta-feira (22), para que o debate possa avançar entre os parlamentares. “Nós temos muita consciência e confiança de que ainda nesta semana iremos apontar para o STF como resolveremos o financiamento do piso nacional da enfermagem”, disse em vídeo publicado no Twitter após a reunião.
URGENTE! Acabamos de ter reunião de líderes no Senado e temos novidades acerca do piso salarial para os profissionais da Enfermagem. Estamos por aqui na luta sempre! Acompanhe: pic.twitter.com/5rm38yUYF7
— Randolfe Rodrigues (@randolfeap) September 19, 2022
O piso
O piso nacional da enfermagem foi aprovado pelo Congresso Nacional este ano, por ampla maioria, e entrou em vigor em agosto por meio da Lei 14.434/2022. Mas a medida foi suspensa, pela maioria dos membros do STF, em julgamento virtual finalizado na semana passada e após o ministro Luís Roberto Barroso conceder uma liminar que previa essa suspensão durante 60 dias.
O magistrado estipulou esse prazo para que entes públicos e privados esclareçam detalhes orçamentários relacionados ao cumprimento dos novos valores salariais previstos para a categoria. A medida de Barroso veio após pedido da Confederação Nacional de Saúde, Hospitais e Estabelecimentos e Serviços (CNSaúde), entidade que reúne atores do setor empresarial. Com a chancela do plenário do STF, ficou valendo neste momento a suspensão da aplicação do piso durante 60 dias até que sejam fixadas fontes de custeio para a medida.
Edição: Rodrigo Durão Coelho