Um estudo, realizado com crianças de 0 a 6 anos de idade, moradoras de áreas afetadas pelo rompimento da barragem da Vale em Brumadinho, identificou altos índices de contaminação por metais pesados.
Organizada pela Fiocruz Minas e a Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ), a pesquisa avaliou a dosagem de metais presentes nos organismos de 172 crianças, de todas as comunidades do município.
Entre as amostras, foi identificada a contaminação, com pelo menos um metal acima do valor de referência, em 50,6% das crianças. O estudo avaliou a presença de cádmio, arsênio, mercúrio, chumbo e manganês. Das crianças, 41,9% apresentaram níveis elevados de arsênio no organismo. Para o chumbo, o índice foi de 13%.
Jerônimo Vaz, da equipe de saúde da Associação Estadual de Defesa Ambiental e Social (Aedas), enfatiza que a pesquisa não descreve as rotas de exposição e, portanto, não permite afirmar quais são as causas da contaminação.
Porém, ele destaca que os resultados encontrados pela Fiocruz Minas e a UFRJ não divergem dos encontrados por uma consultoria contratada pela Aedas, que analisou uma série de compartimentos ambientais na região.
“Os resultados da consultoria apontam valores de manganês e arsênio acima das concentrações máximas aceitáveis e identificam potencial risco à saúde humana pela rota de exposição da ingestão”, afirma.
Riscos
O relatório da pesquisa da Fiocruz afirma que o “arsênio possui efeitos tóxicos na saúde e no desenvolvimento infantil” e, quando há exposição crônica durante a infância, pode prejudicar o desenvolvimento neuropsicomotor.
Mesmo sem estar necessariamente associado à presença de metais nos organismos, o estudo demonstrou que, em relação ao desenvolvimento neurológico, 38% das crianças não tinham alcançado as habilidades esperadas para a idade, no momento da pesquisa.
O local onde as urinas das crianças apresentaram maior concentração de arsênio foi a comunidade Aranha, que fica a mais de 10 quilômetros de distância da área diretamente afetada pelo rompimento.
Famílias sofrem
Em nota, divulgada na segunda-feira (12), o Grupo de Mães e Pais da comunidade denunciou a falta de assistência do poder público e da Vale.
“Estamos em contato diário com os metais pesados contaminantes. Para nossa tristeza e indignação, nada foi feito de providências urgentes pelo poder público, muito menos pela mineradora Vale”, afirma a carta.
Para as famílias, a empresa tem priorizado outros gastos, em detrimento das necessidades de seus filhos. “Nossas crianças nos questionam, ao verem os comerciais da Vale nos horários nobres da TV, gastando muito dinheiro com propaganda, e aqui vivemos o drama de ver nossos filhos contaminados”, enfatiza a nota.
Ao Brasil de Fato MG, um dos moradores da comunidade, que prefere não se identificar por medo de represálias, conta que as famílias têm buscado auxílio dos órgãos competentes e feito propostas para a resolução do problema. Porém, segundo ele, as demandas não são atendidas.
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“Aqui no Aranha, pedimos medidas urgentes, como abastecer a escola municipal de água mineral, mas nem isso foi atendido. Recentemente, minha filha teve vômitos e dores de barriga. Não entendemos o porquê o poder público não age”, lamenta.
Jerônimo, da Aedas, conta que, além da preocupação com os familiares, a população ainda convive com a falta de informação.
“São constantes os relatos de medo e angústia vivenciados pelas crianças e pelos seus familiares, que sofrem com a preocupação sobre o estado de saúde dessas pessoas contaminadas, com a falta de informações, de ações concretas de acompanhamento e de resolução”, enfatiza.
Crime continuado
Além da morte de 272 vítimas, o rompimento da barragem em Córrego do Feijão, em 2019, foi responsável por contaminar o Rio Paraopeba com 12 milhões de metros cúbicos de rejeitos. Em 2020, a ONG SOS Mata Atlântica apontou que a presença de cobre nas águas, por exemplo, era 44 vezes maior do que o permitido.
Os pesquisadores da Fiocruz e da UFRJ recomendaram que sejam realizadas consultas clínicas com as crianças para identificar quais são as fontes de contaminação. Eles consideram que o consumo de água e o contato com a poeira, por exemplo, podem ser responsáveis pelo cenário.
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O estudo também aponta que 49% dos responsáveis pelas crianças identificaram, após o rompimento da barragem, alguma alteração no estado de saúde dos menores. Entre as mais citadas, aparecem problemas respiratórios e na pele.
Mais dados
A Fiocruz e a UFRJ também avaliaram as condições de saúde de adolescentes e adultos das comunidades. Entre os últimos, 337% apresentaram altos níveis de arsênio na urina. Já os adolescentes avaliados, mais da metade possuíam quantidades elevadas de manganês no sangue.
O outro lado
Procuradas pela reportagem para comentar sobre o caso, a Vale e a Prefeitura de Brumadinho não responderam até o fechamento desta matéria. O espaço segue aberto para manifestações.
Fonte: BdF Minas Gerais
Edição: Larissa Costa