Caso seja confirmado nas urnas o favoritismo do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) demonstrado nas pesquisas eleitorais, a economia dará um salto e empresas como Eletrobras e Petrobras terão papel de destaque na transição para a energia sustentável.
A afirmação foi dada em entrevista ao Estadão nesta quarta-feira (28), por Guilherme Mello, economista da campanha da candidatura Lula/Alckmin. Durante a sabatina, ele reforçou a importância da Eletrobras, privatizada recentemente pelo governo de Jair Bolsonaro (PL), na retomada do crescimento.
“Petrobras e Eletrobras terão um papel estratégico na transição ecológica e energética. O governo federal, apesar de ter perdido o controle majoritário da Eletrobras, ainda é um acionista relevante da empresa. Para nós, a questão fundamental é dispor de diferentes instrumentos para promover as transições que o Brasil precisa. Alguns deles são empresas puramente públicas. Outros são empresas mistas. Cada uma tem uma função e pode exercer um papel”, disse o economista.
Questionado se, caso eleito, o candidato da coligação Brasil da Esperança vai reestatizar a Eletrobras, Mello disse que o importante para o Brasil não é se o governo vai ter 51% ou 49% de participação. E sim que todas as empresas, principalmente as que têm uma participação relevante no setor público, sejam rentáveis e tenham capacidade de investimento.
Essas empresas, segundo ele, também precisam “dialogar com o processo de transição portador de futuro”. “Se a Petrobras não se tornar rapidamente uma empresa de energia que dialogue com a sustentabilidade e com os combustíveis renováveis, se tornará cada vez mais uma empresa do passado”, ponderou.
Sob Bolsonaro, a Petrobras deixou a produção de energia eólica em 2021 ao vender sua participação majoritária no parque eólico Mangue Seco 2, no Rio Grande do Norte, ao fundo de investimento em participações FIP Pirineus. A empresa já era sócia da estatal no projeto, com 49% de participação.
Antes, a Eletrobras também se retirou do Mangue Seco 2. Vendeu sua participação por R$ 27,6 milhões ao mesmo fundo de investimento Pirineus, em outubro de 2020. O valor foi considerado irrisório pelos analistas.
Janela de oportunidade para Lula
Para Guilherme Mello, o atual cenário desfavorável da economia, com desaceleração global, juros altos e as medidas eleitoreiras adotadas por Bolsonaro, constitui um grande problema, mas também é visto mais como uma oportunidade pela candidatura Lula. Isso porque o país tem estado à margem das demais nações, seja do ponto de vista diplomático, seja daqueles definidores do futuro, como a sustentabilidade da atividade econômica.
“Esses temas têm potencial de atrair investimentos. Há investidores que querem vir para o Brasil, mas não vêm devido às incertezas políticas e institucionais. Acreditamos que existe perspectiva para a economia brasileira caso o próximo governo seja capaz de recuperar credibilidade, transparência e diálogo com diferentes setores da sociedade e diferentes países”, disse.
Mello referiu-se às medidas do governo de Jair Bolsonaro que acabaram com todo e qualquer tipo de transparência e credibilidade nas contas do setor público. “Não se sabe o que esperar não só do ponto de vista fiscal, mas de vários ângulos: das medidas sociais, institucionais, das relações com os governadores, com o STF (Supremo Tribunal Federal) e com a própria democracia. Isso gera incerteza”, disse.
Do ponto de vista de políticas concretas para reverter a situação, especialmente com impacto direto sobre a vida da população, o economista mencionou o Desenrola, um programa de renegociação de dívida das famílias e a discussão sobre o novo Bolsa Família, que dependem do Legislativo. E que entre os planos para o BNDES está o financiamento de pequenas empresas e investimentos que favoreçam a transição energética.
Já sobre o sistema tributário, destacou que não haveria aumento na carga com Lula. Em vez disso, medidas que alterem a forma como os impostos são cobrados atualmente e a revisão de alíquotas irão garantir uma política tributária mais justa, reduzindo o que atualmente é pago pelos mais pobres e aumentar progressivamente a taxação dos mais ricos.
Combustíveis e “teto dos gastos”
O economista de Lula também falou sobre medidas para regular os preços dos combustíveis. “Nosso objetivo é criar instrumentos para gerir preços. Instrumentos que sejam capazes de minimizar essas oscilações. Isso tem de ser obviamente construído de maneira dialogada com a Petrobras, com governadores.” O que não quer dizer congelamento de preços, segundo ele.
“Um país como o Brasil, que tem a Petrobras, que tem petróleo, que refina uma parte dos combustíveis, tem múltiplos instrumentos para utilizar. O fato de não utilizarmos esses instrumentos tornou o Brasil um dos países mais suscetíveis aos choques de preço e que teve uma das inflações mais altas do mundo.”
A construção de um “arcabouço fiscal” para substituir o “teto de gastos” e que também deverá ser discutido com o Congresso e com a sociedade também foi tratado na entrevista. “Tem de ser flexível, que se adeque a momentos de crise. Ser anticíclico, ou seja, que, em um momento de grande crescimento, não superaqueça a economia e, em um momento de queda do crescimento, não jogue a economia mais para baixo. Ter mecanismos de acompanhamento dos impactos dos gastos públicos. Nosso objetivo é compatibilizar sustentabilidade fiscal, ou seja, uma estabilização da relação dívida/PIB ao longo do tempo, ao mesmo tempo que se recupere investimento público e o gasto social de boa qualidade”.