O presidente do Banco Central, Roberto Campos Neto, informou que está em diálogo com o ministro da Saúde Marcelo Queiroga para o desenvolvimento do chamado Open Health, que permitiria o compartilhamento de dados de saúde entre as empresas e o governo federal.
A informação foi anunciada durante a palestra "O Futuro do Sistema Financeiro" no evento "DrumWave Day", em São Paulo, em 30 de setembro. Na ocasião, Campos Neto disse que o pix foi criado com o objetivo de implementar as tecnologias desenvolvidas pelo Banco Central, como o Open Finance, cuja base é utilizada como inspiração para o Open Health. "Temos cronograma", afirmou.
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O Open Health deve ser uma cópia do Open Finance, também conhecido como Open Banking. A ferramenta possibilitou o compartilhamento de dados financeiros dos cidadãos entre os bancos a fim de aumentar a concorrência entre si e moldar os serviços oferecidos para os clientes.
"Pegou-se essa ideia do setor financeiro – que não é um setor universal, exclui muita gente que não tem CPF em dia, que não tem acesso a cartão de crédito e que não tem acesso a uma conta corrente – e levou para o setor de saúde suplementar", explica Marcelo Fornazin, pesquisador da Escola Nacional de Saúde Pública Sergio Arouca da Fiocruz e professor da Universidade Federal Fluminense (UFF).
"No meu entendimento, isso significa que os planos de saúde poderão ter acesso ao histórico dos pagamentos associados aos clientes do setor privado de saúde de atendimentos realizados, serviços prestados, pagamentos de mensalidade, para que as operadoras pudessem modelar suas ofertas de plano de saúde", afirma Fornazin.
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O compartilhamento ocorreria somente mediante autorização dos clientes, de acordo com os limites estabelecidos pela Lei Geral de Proteção de Dados Pessoais (LGPD). O professor argumenta, no entanto, que não existe uma cultura de proteção dos dados no Brasil o que leva as pessoas a compartilharem as suas informações sem avaliar adequadamente os riscos.
Outro ponto é que, embora a instituição da ferramenta ocorresse de acordo com a legislação, que proíbe o uso de dados pessoais para seleção de risco na área da saúde, o desenvolvimento do Open Health já foi atrelado à escolha de clientes mais rentáveis, com menos demanda por serviços de saúde, e à diminuição dos serviços, como cirurgias e tratamentos com custos mais altos.
"O que preocupa muito é a exclusão de pessoas que não têm condições de saúde que gerem bons lucros às operadoras do plano de saúde e a exclusão de serviços que têm um custo mais caro", afirma Fornazin. "A partir de dados financeiros é possível selecionar aqueles perfis mais rentáveis, que gastam menos com consultas, internações, medicamentos, procedimentos, cirurgias, exames. Então, com os dados financeiros, os planos de saúde poderão calcular melhor os riscos e definir melhor o que vão ofertar e para quem."
Fornazin explica que a medida parte da concepção "equivocada" de que o setor privado deve ser utilizado para atender a população de forma complementar ao Sistema Único de Saúde. Com isso, as pessoas vão deixar de "reivindicar o direito a saúde pública, o direito a bons serviços do SUS e passar a se endividar para poder pagar" um plano de saúde.
"O Ministério deveria trabalhar para fortalecer o SUS e não intervir em um assunto de competência da Agência Nacional de Saúde Suplementar", conclui o professor.
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Em artigo escrito para o jornal Folha de S. Paulo em março deste ano, o ministro Marcelo Queiroga afirmou que o Open Health "traria novo ambiente de negócios no setor privado de saúde brasileiro". Para o ministro, a implementação é uma "questão de tempo, coragem e decisão".
A Associação Brasileira de Saúde Coletiva (Abrasco) já se posicionou contra a medida. Em carta aberta, a instituição declarou que "os perigos do Open Health extrapolam os problemas relacionados à proteção de dados pessoais, alcançando a falta de compromisso dessa proposta com a universalização do acesso à saúde".
Edição: Nicolau Soares