Apesar do bolsonarismo... acho que esse Congresso tem gente com muita garra, com muita capacidade
Em 2016, a democracia brasileira passou por um de seus maiores traumas: o golpe contra a ex-presidenta Dilma Rousseff. Retirada da presidência da República por acusações de "pedaladas fiscais" - hipótese negada por vários articuladores da manobra ao longo dos últimos seis anos - a figura de Rousseff concentrou grande parte das críticas da imprensa, da oposição e de alguns analistas políticos ao Partido dos Trabalhadores e à economia brasileira.
Desde então, o PT precisou lidar com o avanço da Operação Lava Jato, a prisão de sua maior liderança durante 580 dias em uma carceragem na sede da Polícia Federal em Curitiba e a derrota nas eleições de 2018. Agora, aponta a ex-presidenta, a sociedade brasileira "digeriu" a perseguição ao petismo e a seus principais expoentes.
"A ditadura brasileira levou 21 anos para ser metabolizada pelos brasileiros. Porque a sociedade digere. E nós conseguimos fazer esse processo em menos tempo", explica Rousseff.
"Veja que, em seis anos nós estamos em plena eleição, podendo agora eleger o presidente Lula no final desse mês, e isso eu acho que representa uma vitória da sociedade brasileira. Não é uma vitória minha, do Lula, de quem quer que seja. É uma vitória da sociedade brasileira."
A ex-presidenta é a convidada desta semana no BDF Entrevista. Figura ativa na campanha presidencial de segundo turno de Luiz Inácio Lula da Silva (PT), Rousseff acredita que os apoios ao petista são mais consistentes do que aqueles recebidos pelo adversário, o presidente Jair Bolsonaro (PL).
Na última semana, dois ex-candidatos à presidência, Simone Tebet (MDB) e Ciro Gomes (PDT) - mesmo que de maneira mais comedida - demonstraram apoio a Lula. Outras figuras importantes, como o ex-presidente Fernando Henrique Cardoso (PSDB) e economistas que integraram a confecção do plano real ao lado do tucano, também depositaram sua confiança no petista.
Por outro lado, Bolsonaro conseguiu o apoio de governadores que lideram colégios eleitorais importantes como Minas Gerais, São Paulo e Rio de Janeiro. Para a ex-presidenta, no entanto, esses apoios já estavam presentes - mesmo que de maneira velada - ainda no primeiro turno das eleições e não tendem a ter grande impacto agora.
"Acho que o apoio dos governadores que hoje apoiam a outra chapa, a chapa do Bolsonaro, ele já estava precificado. Em Minas Gerais, o [Romeu] Zema (Novo), mesmo escondendo, porque ele tinha medo de falar que apoiava o Bolsonaro e perder voto, agora ele vai abrir. Mas o que ele podia dar ele deu. E acho que o apoio a Bolsonaro faz perder votos em Minas Gerais. Nós sempre tivemos sempre uma força muito grande lá", comenta Rousseff.
Apesar do avanço da extrema direita no Congresso Nacional, com nomes abertamente bolsonaristas eleitos tanto para a Câmara, como para o Senado, Dilma acredita que as candidaturas de mulheres negras, indígenas e trans que se saíram vencedoras neste pleito, farão um importante combate ao conservadorismo.
"Vai ser um Congresso combativo. Eu apoiei muitas candidaturas através de lives, de anúncios e o que me chamou muita atenção foi a quantidade de mulheres negras que participaram do Oiapoque ao Chuí, de Leste a Oeste, e que foram eleitas. Acho que esse Congresso tem gente com muita garra, com muita capacidade", diz.
"Outra coisa que me chamou muita atenção é essa imensa consciência ambiental que se manifestou nesta eleição. Eu estou muito otimista, sabe? Eu acho que, mesmo com essa presença bolsonarista em algumas áreas, nós teremos também uma presença popular, democrática, uma presença comprometida com as mulheres negras, com os trans, com os indígenas, com o meio ambiente, com a defesa da soberania nacional, contra a fome", completa a ex-presidenta.
Na conversa, Rousseff também fala sobre o papel do vice-presidente em um eventual governo Lula, sobre a decisão do MPF (Ministério Público Federal), que a inocentou das "pedaladas fiscais" que se tornaram artifício para sua queda da presidência da República e comenta ainda a derrota eleitoral da direita tradicional nestas eleições.
"Lamentavelmente, a direita tradicional cavou seu próprio túmulo, quando ela saiu de uma posição democrática e passou para uma posição golpista. Eu localizo isso lá em 2016, no processo de impeachment. A partir dali, jamais eles conseguiram manter a posição tradicional que tinham de ser, por exemplo, nossos adversários nas eleições. Eles se seduziram por um canto de sereia autoritário e golpista", afirma.
Confira a entrevista na íntegra:
Brasil de Fato: Presidenta, nos últimos dias a campanha presidencial já ganhou cara de segundo turno mesmo. Alianças já foram consolidadas de lado a lado e há uma análise de que os apoios a Jair Bolsonaro foram importantes, de governadores de colégios eleitorais muito relevantes, mas que na verdade já eram apoiadores de Bolsonaro há algum tempo, com exceção do governador Ronaldo Caiado, talvez. Por outro lado, o Lula conseguiu apoio do Helder Barbalho, também uma novidade, e dos ex-candidatos Simone Tebet, e um pouco menos enfático, digamos, de Ciro Gomes - outras figuras importantes como Fernando Henrique Cardoso, enfim. Como é que a senhora vê esse cenário de segundo turno?
Dilma Rousseff: Olha, eu queria te falar que nós temos uma grande experiência em segundo turno, o PT, com a eleição do Lula e a minha são quatro eleições. Nós sempre ganhamos no segundo turno. O segundo turno é de fato uma eleição diferente do primeiro. Neste segundo turno o que importa é primeiro é de onde nós partimos.
Nós partimos de uma grande acumulação de forças. Foram, na prática, 57,2 milhões aproximadamente eleitores que votaram em nós. Houve uma diferença de mais de 6 milhões. Então, hoje nós temos um grande acúmulo e esse grande acúmulo que nós tivemos ele está reforçado.
Eu queria destacar o PDT. É importante, obviamente, o apoio do Ciro Gomes, mas o apoio decisivo é do partido, do PDT, que tem no Rio de Janeiro, aqui em Porto Alegre e em outros estados da federação uma força acumulada, que é a força do partido do [Leonel] Brizola. Foi muito importante também o próprio posicionamento do Ciro, não muito explícito, mas já foi um grande avanço.
Na verdade, foi muito importante ver o presidente do PDT, o [Carlos] Lupi com o Lula, apoiando o Lula. É um reencontro das forças progressistas do Brasil nesse segundo turno. Acho importantíssimo o apoio do Helder Barbalho, porque ele representa no Pará uma força própria, talvez seja o governador proporcionalmente mais votado do país pela sua própria população.
Então eu acho relevante e acho muito significativo, de alta qualidade, o apoio da Simone Tebet (MDB). Acho que o manifesto que ela lê, as propostas que ela faz, são propostas que são muito similares às nossas. A importância que ela dá, por exemplo, as crianças.
Nós tivemos, José Eduardo, uma política de creches, porque a gente percebia que a questão da desigualdade vem desde a infância. Então ao enfatizar essa questão das crianças, eu achei muito relevante. Uma outra questão que eu gostei muito da proposta que ela faz é sobre as mulheres. Eu quero dizer que nós tivemos no meu governo o maior número de mulheres em um governo, até então.
E agora é necessário dar um passo à frente e isso eu acho que o Lula vai poder fazer. E acredito que sejam dois apoiamentos da terceira via que que envolvem em torno de 9,2 milhões de votos. Podem não vir todos para nós, mas majoritariamente virá para o PT, eu tenho certeza disso.
E concordo contigo, acho que o apoio dos governadores que hoje apoiam a outra chapa, a chapa do Bolsonaro, ele já estava precificado. Em Minas Gerais, o [Romeu] Zema, mesmo escondendo, porque ele tinha medo de falar que apoiava o Bolsonaro e perder voto, agora ele vai abrir. Mas o que ele podia dar ele deu.
E acho que o apoio a Bolsonaro faz perder votos em Minas Gerais. Nós sempre tivemos sempre uma força muito grande. Eu ganhei uma eleição dificílima em Minas Gerais do representante tucano de Minas e acho importante também destacar que hoje nós temos uma situação de muita solidez dos votos do presidente Lula. É isso que todas as avaliações refletem tanto no presidente Lula, quanto no presidente Bolsonaro.
As definições estão dadas e são claras. Então, neste segundo turno, nós partimos de um ponto muito melhor. Nós precisamos de menos votos para ganhar, mas eu acredito que nós não só queremos ganhar os 50% mais um voto, mas nós queremos aumentar a diferença. É isso que eu acho que a campanha do Lula está se movimentando para fazer e que vai conseguir. Eu estou muito otimista, sabe Zé Eduardo. Muito otimista.
Os votos no Bolsonaro surpreenderam, de alguma maneira, as pesquisas que davam 37%, 38% por cento a ele, e chegou a 43%. A gente viu que as pesquisas não erraram tanto. O ex-presidente Lula, por exemplo, ficou dentro da margem de erro do que as pesquisas disseram. Mas a gente viu, tanto na eleição da Câmara e do Senado, esse voto maior em candidatos bolsonaristas, uma consolidação da extrema direita no Brasil e uma morte da direita moderada. Que Brasil é esse que a gente tem pra 2023, presidenta?
Lamentavelmente, José Eduardo, a direita tradicional cavou seu próprio túmulo, quando ela saiu de uma posição democrática e passou para uma posição golpista. Eu localizo isso lá em 2016, no processo de impeachment. A partir dali, jamais eles conseguiram manter a posição tradicional que tinham de ser, por exemplo, nossos adversários nas eleições.
Por quê? Porque eles se seduziram por um canto de sereia autoritário e golpista. O golpe condenou, infelizmente, o PSDB a uma posição de irrelevância. E hoje todos os analistas, não só nós, mas até aqueles analistas que eventualmente algum dia apoiaram o PSDB, todos eles constataram uma implosão do PSDB, que desapareceu de forma bastante lamentável.
E isso está expresso inclusive na própria posição do Rodrigo Garcia. Acho que para a tradição psdbista - eles eram nossos adversários, nunca foram nossos inimigos - que teve gente do porte do Franco Montoro, do Mário Covas, de todos de todos os os tucanos de alta plumagem, do [Tasso] Jereissati, é um desmerecimento a toda essa história deles o Rodrigo Garcia apoiar incondicionalmente o Bolsonaro.
Vai contra tudo que eles defenderam ao longo de toda a história da redemocratização e nos tempos recentes. Então essa derrota tem a ver com o fato de que eles não passaram impunes ao fato de terem sido articuladores do golpe, de não terem tido uma posição mais radical contra a prisão do Lula.
Eu acredito que é importante que nós percebamos - por isso a urgência do Lula ganhar a eleição - o fato de que nós derrotaremos Bolsonaro, mas o bolsonarismo criou as suas bases. Veja você que uma das coisas que está sendo aventada é que essa relevante participação de bolsonaristas raiz no Senado permite até, que eles ameacem o Supremo [Tribunal Federal] de impeachment, que eu acho gravíssimo.
Acho que nós vamos ter de nos manter alertas, nos manter com essa frente no sentido de evitar que o Congresso Nacional, que o Senado, seja tomado por esse tipo de proposta ultra radical que, de fato, vai desestabilizar o Brasil.
Falando ainda sobre o governo Bolsonaro, ele tem usado a máquina pública para tentar a reeleição faz algum tempo já. Mas alguns movimentos podem ser ainda mais danosos, como os recentes cortes na educação por exemplo, que podem ser um tiro no pé também. O quanto a máquina pública pode influenciar nesse segundo turno, presidenta?
Eu acho que já ficou claro que nunca um governo fez o que o Bolsonaro fez em toda a história do país. Nunca se viu uma manipulação, uma tentativa de uso brutal da máquina. Eu não acredito que houve, e ficou claro isso no caso do Auxílio Brasil, que eles não conseguiram reverter a visão que o povo pobre desse país tem a respeito deles. Por mais que mentiras sejam ditas.
Por exemplo, eles diziam, tendo feito só 7% da transposição do São Francisco - e nós termos feito mais de 90% - eles diziam que eles que tinham feito. Então é uma situação em que eles tentaram de todas as formas manipular. Agora, recentemente, eles fizeram essa barbaridade, que eu te digo, é a cereja do bolo, porque cortar da educação, recursos para as universidades federais e para os institutos, eles vem fazendo a tempo.
Só que agora ganhou uma proporção absurda. Nós temos um governo que não percebe que a educação é um elemento fundamental tanto para o país sair da pobreza, como para ele chegar a ser uma nação poderosa e próspera. Por quê? Sem apostar na educação, sem apostar nos professores, nas universidades federais que são aquelas que têm a base da pesquisa e da tecnologia, nós não chegaremos a nos transformar num país rico.
Por quê? Porque nós estamos vivendo a quarta revolução industrial. E aí a gente precisa de investimento pesado em educação, em ciência, tecnologia e inovação. E o que o governo faz? Tira em torno de R$ 2 bilhões de recursos das duas principais instituições federais de educação, que são tecnológicos, e das universidades federais.
Eu te digo que é desesperador o que o governo Bolsonaro está fazendo. Mas ele nunca escondeu isso. Em 2019, eu queria te lembrar isso, em fevereiro, o senhor Bolsonaro visitou os Estados Unidos e teve uma reunião com a direita americana, entre eles estava presente o Steve Bannon. Momento em que ele disse que não tinha sido eleito para construir, mas tinha sido eleito para destruir o que tinha sido feito.
Essa é uma visão das mais tacanhas a respeito da relação republicana que deve existir entre governos, mesmo aqueles que pensam um diferente do outro. Então eu acredito que essa frente ampla que se formou para a eleição do Lula é poderosa também para ajudar na governabilidade. E eu espero que no dia 30 de outubro nós tenhamos uma grande diferença de votos. E eu vou te dizer uma coisa: eu acho que teremos.
Eu queria colocar um problema. Acho que nós temos de reduzir a abstenção, que foi de 20,95%, mais de 32 milhões de pessoas. Isso se deve a algumas coisas e uma das principais eu acho que é o transporte público. Acho que um país como o nosso, com esse nível de desigualdade de renda, com esse nível de dificuldade que as pessoas têm hoje, de fazer frente às suas próprias necessidades de alimentação, de cuidar dos seus filhos, o transporte pesa muito.
Então, era fundamental que no dia da eleição tivesse garantido o transporte gratuito para quem quisesse se transportar para votar. A outra coisa que tem que ser vista é porque das filas. Teve filas. Eu votei lá em Belo Horizonte e tinha filas de duas horas, duas horas e meia, de gente na fila para votar. Um dos motivos alegados era a biometria, que é outra coisa que também deve ser olhada. Porque uma coisa ficou clara, as pessoas queriam votar.
A senhora sofreu um golpe arquitetado pelo Congresso, mas que teve total conluio com o então vice-presidente Michel Temer. Passados todos esses anos, qual a senhora imagina que deva ser o papel de um vice-presidente? E qual papel Geraldo Alckmin (PSB) pode ter no governo Lula?
Não há como comparar o Geraldo Alckmin com o golpista Temer. Acho que se tem uma coisa que nenhuma civilização, desde a mais remota até a mais moderna, não perdoa, é a traição. E o golpe feito por um vice-presidente é uma traição explícita, rasgada.
Eu acho que o governador Alckmin, com seus quatro mandatos de governo em São Paulo, nunca escondeu a sua própria posição e vai ter uma grande contribuição a dar no governo do presidente Lula. E toda a tradição dele é de nunca ter se escondido, nunca disse que ele era uma coisa e era outra. Ele sempre foi o que foi.
Ele tem que ser respeitado por isso e acredito que ele tem um papel importante. Você veja, não é algo trivial ser governador de São Paulo. Já de início ele entra com essa bagagem, que é diferente do outro, que nessa área não tinha nenhuma bagagem.
Mas ele entra com uma capacidade hoje muito grande de gestão, de entender os problemas por que passa um governo. Tenho visto ele extremamente integrado à campanha e recebendo do presidente Lula um grau imenso de confiança e respeito.
Como a senhora recebeu a decisão do MPF (Ministério Público Federal), que decidiu pela sua inocência, por conta das pedaladas fiscais, sete anos após o golpe? Me parece um tanto tardia a resposta da justiça brasileira mas, de alguma maneira, ela veio.
Eu acho lamentável e vou te dizer porque eu acho lamentável. Que não tinha base para o impeachment nós falamos desde o início do processo. Que era uma armação ficou claro quando, veja você que coisa interessante - e por isso a gente tem de olhar quem são os responsáveis também, um dia nós vamos ter de olhar isso. Eu não sei se você sabe que, logo após a minha eleição no segundo turno de 2014, na bancada da Globo, o jornalista Merval [Pereira] disse que eu ia sofrer impeachment.
Ora, de onde ele podia tirar esta informação se os fatos ainda não tinham acontecido. Por que eu falo isso? A lei brasileira é clara, só se pode sofrer um impeachment no exercício do mandato vigente. Como meu mandato não tinha começado, como é que ele podia saber que eu ia sofrer impeachment?
A não ser que ele tivesse informação que havia, vamos dizer, impulsos golpistas escondidos em algumas áreas, e eu acredito que ele sabia. Ele sabia que havia um projeto de impeachment caso eu fosse eleita. Por quê? Porque naquele momento eles queriam enquadrar o Brasil no neoliberalismo e não tinham votos. Precisavam então de tornar, como disse o próprio pai do neoliberalismo, “tornar possível aquilo que se mostrava impossível”.
Como? Utilizando a crise, utilizando a geração de fatos críticos. E o que eles fizeram durante todo o período, a partir do primeiro dia de 2015, quando eu assumi? Passaram a desestabilizar o meu governo e dale pautas bombas, e dale todos esses processos, até desaguar nesta história das pedaladas fiscais, que é fruto de uma construção que liga todos os golpistas. Entre eles a imprensa brasileira.
Por isso, eu te digo o seguinte, o que o MPF faz é constatar aquilo que a própria auditoria do Senado, durante o impeachment, constatou. Ou seja, não tem base para uma acusação, não tinha sequer, ato. Você já viu, sem ato, haver algum crime? Não tinham onde me acusar, esse processo é eivado de irregularidades, eivado de má intenção.
A má intenção é essa, de tentar conseguir por um golpe, aquilo que não se conseguia através do voto direto, secreto e democrático. Mas eu quero te falar agora - isso é a parte crítica - a parte que a gente tem de olhar tudo isso com olhos mais positivos.
A ditadura brasileira levou 21 anos para ser metabolizada pelos brasileiros. Como diziam os expoentes da Semana de 1922, para digerir a ditadura militar, porque a sociedade digere. E nós conseguimos fazer esse processo em menos tempo, então você veja que, em seis anos nós estamos em plena eleição, podendo agora eleger o presidente Lula no final desse mês, e isso eu acho que representa uma vitória da sociedade brasileira. Não é uma vitória minha, do Lula, de quem quer que seja. É uma vitória da sociedade brasileira.
De fato tem isso, esse aspecto lamentável do bolsonarismo aparecendo em algumas atividades, em posições, em cargos, mas tem também a força enorme da sociedade brasileira, digerindo esse processo e eu tenho certeza que, no dia da eleição, nós teremos uma vitória importante no país.
Como a senhora comentou agora, apesar do avanço da extrema direita na Câmara, no Senado, a gente teve candidaturas eleitas importantes também, mulheres indígenas, mulheres trans. Parece que essa resistência, de fato, ao projeto bolsonarista segue de pé no Congresso, não?
Eu acho que ele vai ser um Congresso combativo. Eu apoiei muitas candidaturas através de lives, de anúncios. Você sabe o que me chamou muita atenção? A quantidade de mulheres negras que participaram do Oiapoque ao Chuí, de Leste a Oeste, e que foram eleitas. Acho que esse Congresso tem gente com muita garra, com muita capacidade.
Eu queria destacar uma eleição que eu gostei muito, e que eu apoiei, fui até em São Paulo pra apoiar ele, que foi a do [Guilherme Boulos]. Acho que o Boulos é uma liderança popular, uma liderança comprometida com o país, com os mais pobres, com a nossa transformação, a nossa soberania, a nossa democracia, uma pessoa que tem compromisso com o meio ambiente.
Outra coisa que me chamou muita atenção é essa imensa consciência ambiental que se manifestou nesta eleição. Eu estou muito otimista, sabe? Eu acho que mesmo com essa presença bolsonarista em algumas áreas, nós teremos também uma presença popular, democrática, uma presença comprometida com as mulheres negras, com os trans, com os indígenas, com o meio ambiente, com a defesa da soberania nacional, contra a fome.
Gente que estava extremamente mobilizada para mudar o Brasil e perseguir a urgência. Ou seja, a gente não pode perder tempo, a gente tem que fazer isso agora, isso eu senti de forma muito forte com as as as candidaturas que eu vi majoritárias. Espero que nós tenhamos um Congresso combativo e acho que terá de ser um Congresso que debata, que não aceite o orçamento secreto.
Acho o orçamento secreto, talvez, uma das maiores e mais graves agressões permitidas pelo Bolsonaro, porque nós não fomos, durante esse período do Bolsonaro, nem parlamentaristas, nem tão pouco presidencialistas. Ele terceirizou o investimento para uma política clientelista, para uma política fisiológica do Centrão. Vai ser necessário a força pujante desse Congresso para que isso não se repita.
Edição: Nicolau Soares