O presidente Jair Bolsonaro (PL) defendeu de forma ferrenha que integrantes do PT ou do PC do B chefiassem o Ministério da Defesa após a primeira eleição de Luiz Inácio Lula da Silva (PT) para o Palácio do Planalto, em 2002. As notas taquigráficas da Câmara dos Deputados, consultadas pelo Brasil de Fato, mostram que Bolsonaro chegou a sugerir que o então deputado federal José Genoino, que foi um dos integrantes da Guerrilha do Araguaia contra a Ditadura Militar, chefiasse a pasta.
No debate da noite de domingo (16), na TV Bandeirantes, Bolsonaro disse: "Lula, se respeitasse as Forças Armadas, você botaria gente competente para ser Ministro da Defesa, e não companheiros lá para dentro". A afirmação desconsidera que o próprio Bolsonaro defendeu que aliados de Lula chefiassem a pasta.
A primeira manifestação de Bolsonaro sobre o tema na Câmara dos Deputados foi em 6 de novembro de 2002, quando defendeu que o cargo de ministro da Defesa do governo eleito fosse ocupado por um petista. Segundo o ex-capitão, integrantes do PT e de partidos aliados teriam competência para a função, que exerce controle sobre o Exército, a Marinha e a Aeronáutica.
"Sr. Presidente, no primeiro turno das eleições, trabalhei na campanha de Ciro Gomes e afirmei publicamente que votaria no Lula, caso o meu candidato não fosse para o segundo turno. Assim o fiz. Só espero que o Governo do PT nomeie para o Ministério da Defesa um homem competente e honesto que tenha um mínimo de conhecimento sobre a área militar. O Partido dos Trabalhadores e os partidos que o apoiaram nas eleições dispõem de pessoas aptas a desempenhar a função. Esperamos não seja um traidor ou dedo-duro, mas alguém que engrandeça as Forças Armadas", afirmou Bolsonaro.
No dia 27 de novembro, ele voltou a fazer lobby sobre a escolha do futuro ministro da Defesa de Lula: "Sr. Presidente, posto ser o momento oportuno, espero que o nosso querido Luiz Inácio Lula da Silva, futuro Presidente da República, tenha o devido carinho para escolher um Ministro da Defesa que realmente esteja à altura das tradições do nosso Exército".
Poucos dias depois, Bolsonaro foi à Granja do Torto, em passagem registrada no jornal Folha de S.Paulo, para tentar convencer Lula de que os militares não seriam contra a nomeação de Aldo Rebelo, então no PC do B. Em discurso feito na Câmara em 18 de dezembro de 2002, Bolsonaro subiu à tribuna para comentar a indefinição na escolha para o chefe da Defesa no governo Lula. Antes disso, ele chegou a fazer uma série de elogios ao petista.
"Não tenho como indicar alguém para o Ministério da Defesa. Não faço parte da equipe do Lula nem tenho poder de veto, mas tenho voz nesta Casa. Sugiro até mesmo o nome de José Genoíno, por quem não tenho grande amizade, mas reconheço sua competência. Não faria oposição à possibilidade de S.Exa. ir para o Ministério da Defesa. Também não me oporia se o eleito fosse Aldo Rebelo, do PCdoB. Ambos são competentes. Não quero falar sobre a história de ninguém. Temos de pensar apenas no Brasil daqui para a frente", declarou, na tribuna da Casa.
"Então, Sr. Presidente, Sras. e Srs. Deputados, o temor da politização das Forças Armadas não se deve à possibilidade de o novo Ministro sair desta Casa, seja ele do PT, seja ele do PCdoB. Para a grande maioria dos oficiais-generais e a tropa como um todo, não há qualquer restrição. A politização virá se, em vez de escolhermos por critério técnico ou político uma pessoa decente, escolher um indecente, desonesto, a exemplo do Dr. Geraldo Quintão [ministro da Defesa no final do governo FHC]", disse Bolsonaro.
Folha registrou Bolsonaro tomando chuva para defender Aldo Rebelo
No dia anterior, em 17 de dezembro, poucos dias antes da posse de Lula, que ocorreu em 1º de janeiro de 2003, o jornal Folha de S.Paulo publicou uma reportagem com a seguinte manchete em suas edições impressa e online: "Bolsonaro dá apoio a Aldo Rebelo para a Defesa". "Defensor da pena de morte, o deputado federal e capitão da reserva do Exército Jair Bolsonaro (PPB-RJ) apareceu de surpresa ontem na Granja do Torto para fazer lobby pela indicação do deputado comunista Aldo Rebelo (SP) para a Defesa", dizia a abertura texto.
A matéria tem uma declaração do então deputado à reportagem da Folha: "Vim tentar um espacinho na agenda do Lula para desmentir essa história de que o Aldo tem restrições nas Forças Armadas. Pelo contrário, é uma pessoa que entende do assunto e tem grande respeito". A Folha de S.Paulo ainda registra que, segundo Bolsonaro, não é estranho um representante histórico da direita trabalhar em favor de um esquerdista. "As coisas mudaram. Hoje, comunista toma uísque, mora bem e vai na piscina."
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O texto termina dizendo que Lula não recebeu Bolsonaro, que, frustrado, deixou a portaria da Granja do Torto: "Sem horário marcado, o deputado esperou por 45 minutos por uma chance de falar com Lula, mas ela não apareceu. No meio da tarde, com o início de uma forte chuva, ele foi embora". O lobby não deu certo. Poucos dias depois, Lula nomeou o diplomata José Viegas como ministro da Defesa. Anos depois, porém, em 2015, Aldo Rebelo finalmente assumiu o Ministério da Defesa, durante a gestão da presidenta Dilma Rousseff (PT).
Debate: Bolsonaro disse que Lula não teve ministro
Durante o debate entre presidenciáveis na TV Bandeirantes, no último domingo (16), Lula disse que Bolsonaro não fazia oposição contra ele na Câmara dos Deputados porque sabia que ele era o presidente que mais investiu nas Forças Armadas.
"Procurei nos anais do Congresso Nacional a raiva que esse cara tinha do Lula, se ele tem fazia discurso contra o Lula. Não! Não, ele não fazia. Sabe por quê? Porque no fundo, no fundo, ele sabe que eu fui o presidente que mais investi nesse país, e mais ainda, foi o que mais cuidei das Forças Armadas. A Aeronáutica não tinha avião, não tinha navio, o Exército não tinha nem coturno, e eu dei", disse Lula.
Bolsonaro, então, respondeu: "Na verdade, nas Forças Armadas não tinha ministro. Você botou gente incompetente na frente do Ministério da Defesa. Gente que não tinha conhecimento de nada. Uma vergonha na frente! Agora falar que não fiz nenhum discurso contra você, Lula, 8 anos de Governo? Eu não vou nem rebater isso aí. Pelo menos, 2 por semana eu fazia, mostrando as mentiras e inverdades e corrupção do seu Governo".
Edição: Thalita Pires