As religiões têm tido um papel preponderante nas eleições de 2022
Lusmarina Campos Garcia*
As religiões têm tido um papel preponderante nas eleições de 2022. A disputa acirrada tornou mais explícita a opção dos diferentes segmentos religiosos, de maneira que aqueles que advogam pela pluralidade e pelo Estado Laico se alinham com Luiz Inácio Lula da Silva, e aqueles que utilizam uma lógica de uniformidade, se posicionam com Bolsonaro. No entanto, a arena de maior concorrência se dá no âmbito das igrejas cristãs.
O segmento católico identificado com Bolsonaro moveu-se depois dos ataques contra o núcleo da representação da fé católica brasileira: a Basílica de Nossa Senhora Aparecida, no dia da padroeira. As pesquisas revelam que Lula passou de 55% para 57% nas intenções de voto entre católicos. Porém, maior deslocamento ocorreu entre os evangélicos uma vez que Lula cresceu 4 pontos percentuais. Bolsonaro caiu de 66% para 62% enquanto Lula subiu de 28% para 32%.
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Os evangélicos constituem ¼ do eleitorado brasileiro e as mulheres são a sua maioria. O Comitê Evangélico da campanha Lula/Alckmin investiu no diálogo com o segmento, principalmente com as mulheres. Lives, vídeos e demais materiais produzidos por lideranças religiosas e laicas contendo mensagens com linguagem específica, circulam pelas redes.
Dois encontros foram realizados entre Lula e o segmento: em São Gonçalo (RJ) e em São Paulo, capital. Uma carta específica foi dirigida ao setor na tentativa de afastar o pânico moral produzido por discursos centrados nas questões de gênero e visando afirmar o investimento nas famílias por meio de políticas públicas em diferentes áreas.
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Estamos a um dia das eleições e a vitória de Lula parece irreversível. Esta é uma vitória necessária para que a democracia seja religada no Brasil. A democracia brasileira foi desligada com o golpe de 2016 produzindo como resultado a eleição do atual Presidente, a crescente investida do autoritarismo, a eleição de uma bancada numerosa de extrema-direita ao Congresso Nacional, e a emergência do atual processo eleitoral.
Não estamos diante de eleições próprias da democracia porque não vamos decidir entre dois candidatos que se pautam pelos princípios do Estado Democrático de Direito; decidiremos entre regimes contrários: democracia e autoritarismo.
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Afirma-se que a democracia é o regime em vigor no país porque isto nos mune de argumento para enfrentar o autoritarismo, no entanto, o desligamento ocorrido em 2016 interrompeu o fluxo da comunicação construtiva de uma cultura democrática e estabeleceu rupturas, abriu brechas por meio das quais o monstro do autoritarismo tem ressurgido.
Esse monstro mantido no seio da sociedade brasileira, das instituições, da legislação, das decisões judiciais, dos discursos religiosos tem o poder de “corroer por dentro” a estrutura social. Ao falar do nacional-socialismo, Theodor Adorno (1995) diz que o mesmo sobrevive, mas não sabemos “se o faz apenas como fantasma daquilo que foi tão monstruoso a ponto de não sucumbir à própria morte, ou se a disposição pelo indizível continua presente nos homens bem como nas condições que os cercam”.
A experiência brasileira tem mostrado que o autoritarismo não permanece apenas como fantasma, mas como um mecanismo real que quando acionado, retorna, e encontra eco numa cultura autoritária existente em parte da população e das instituições. A vitória de Lula é a única possibilidade que temos para afastar o autoritarismo e religar a democracia no Brasil, e as religiões têm um papel central nessa empreitada.
*Lusmarina Campos Garcia é teóloga e pastora luterana e doutora em direito pela UFRJ.
**Este é um artigo de opinião. A visão do autor não necessariamente expressa a linha editorial do Brasil de Fato.
***Leia outros textos da coluna Direitos e Movimentos Sociais. Autores e autoras dessa coluna são pesquisadores-militantes do Instituto de Pesquisa, Direitos e Movimentos Sociais, movimento popular que disputa os sentidos do Direito por uma sociabilidade radicalmente nova e humanizada.
Edição: Vivian Virissimo