Os dados obtidos pelo Mapbiomas, a partir de imagens de satélites, apontam que o Pantanal tem se tornado cada vez mais seco. O ano passado, 2021, entrou para a história do monitoramento como o ano mais seco observado desde 1985. Como o Pantanal é um bioma que varia sazonalmente, os pesquisadores avaliaram as mudanças entre os anos mais secos e os mais úmidos.
A comparação mostra que, entre 1988 e 2018, anos extremos dos picos de cheia, a redução dos campos alagados e das superfícies cobertas por água foi de 29%. Já entre 1986 e 2021, anos mais secos, a redução foi de 66%. O coordenador técnico do Mapbiomas, Marcos Rosa explica que a seca no Pantanal é ocasionado por fatores locais, regionais e mundiais.
De acordo com o especialista, no caso do fator local, o que se observa é que "dentro da área do Pantanal há uma conversão muito alta do que antes eram pastos naturais feitos pela vegetação nativa, para passos plantados, com exóticas. E ainda nesse local temos o entorno. Todos os rios do Pantanal nascem no que a gente chama da bacia do Alto Paraguai. Nessa área há um desmatamento muito maior do que dentro do Pantanal. E esse desmatamento inclui áreas de conversão para soja, mas há muita pastagem também e esse desmatamento vai até a beira do rio muitas vezes. E daí você tem a perda de nascentes, mais a remoção dessa proteção natural das florestas e assoreamento, que é quando chove e leva essa terra que está exposta, esse solo, para dentro dos rios", explica Rosa.
Impactos no bioma
Regionalmente, o coordenador também percebe uma diminuição do regime de chuva. "É parte da floresta Amazônia que gera essa umidade e depois faz chover nessas regiões dos cabeceiros do Pantanal, na região sudeste. E a diminuição dessa chuva regional faz com que o Pantanal vá ficando cada vez mais seco. E tem as mudanças climáticas, de aquecimento global", elenca.
O mapeamento indica que, nos últimos anos, as cheias no Pantanal não estão reduzindo somente em área como também em duração. Em 2020 e 2021, a área alagada ficou abaixo da tendência já decrescente, com os meses mais alagados menos expressivos do que os meses mais secos dos outros anos da série. Os dados mostram que todos os meses do ano apresentam tendência de diminuição da área alagada, independente da sazonalidade.
Como o Pantanal varia conforme a época do ano, a biodiversidade também se comporta dessa forma. Mesmo assim, os maiores períodos de seca e a redução das cheias impactam a vida no bioma, explica Rosa.
Interiorização do desmatamento
"O que a gente vê é com a diminuição da cheia e o Pantanal ficando mais seco, isso afeta também a questão do regime de incêndio. Tudo acaba moldado a ocupação também. Então muito do desmatamento dessas áreas campestres também está interiorizando. Porque as áreas que no passado enchiam e, que agora não estão mais enchendo, faz com que o ser humano possa ir lá e desmatar, porque 'agora vale a pena'. Quando porque você desmatava, plantava exótica e enchia, você perdia esse investimento. E agora a gente vê que esse desmatamento está sendo feito mais para o interior do Pantanal porque ele não está enchendo. É ruim para o Pantanal, para a diversidade, mas é péssimo para o bioma como um todo que foi moldado por esse modelo de cheia e seca que está sendo alterado", adverte.
O mapeamento também apresenta dados sobre a pecuária no Pantanal, atividade que, tradicionalmente, ocupa o bioma. As imagens de satélites obtidas pelo Mapbiomas evidenciam o avanço de pastagens exóticas sobre a vegetação natural ao longo dos últimos 37 anos. Em 2021, o bioma tinha um total de 12 milhões de hectares de áreas naturais, uma perda de 12% desde 1985.
De lá para cá, 1,9 milhão de hectares foram convertidos para a agropecuária. Em 1985, essa atividade ocupava 600 mil hectares do bioma. Já no ano passado, o número subiu para 2,8 milhões de hectares. O aumento é visto, sobretudo, no planalto, onde estão todas as nascentes dos rios que atravessam o Pantanal e que já tem 57% de sua área convertida para as atividades agropecuárias, enquanto a planície ainda tem 83% de conservação.
Recuperação
O coordenador de projetos da Wetlands Brasil – organização global sem fins lucrativos dedicada à conservação e restauração de zonas úmidas que integra o Observatório Pantanal – Fábio Bolzan diz que as atividades intensivas na região, como a conversão de campos naturais em pastagens, devem ser evitadas para garantir que seja possível mudar o quadro expressivo de seca registrado no bioma nos últimos anos.
Aliado a isso, Bolzan lembra da importância de barrar o desmatamento na floresta amazônica, fator que também influencia a umidade no bioma pantaneiro. "É importante a gente fortalecer e desenvolver políticas públicas que valorizem a floresta amazônica em pé. Mas olhando para o bioma e, na verdade a bacia do Alto Paraguai, que inclui o bioma pantanal, é importante nesse caso a restauração, o cumprimento da lei, das nascentes e dos rios que correm para o pantanal. E, por fim, evitar atividades de intenso impacto na planície pantaneira. Fazer jus ao uso sustentável do território através da pecuária extensiva como é feito há séculos e do turismo, do ecoturismo de contemplação, que são atividades de baixíssimo impacto e que valorizam a própria natureza e paisagem do pantanal", conclui.
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