Coluna

A batalha pelo verde e amarelo

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Cada partida é decisiva para deixar para trás um passado de negacionismo e derrotas - Nelson Almeida / AFP
Na política, como no futebol, o país vive novos tempos

Olá! Na política, como no futebol, o país vive novos tempos. E cada partida é decisiva para deixar para trás um passado de negacionismo e derrotas.

.Não vai ter Copa! Não só de patriotas pedindo intervenção extraterrestre vive o bolsonarismo. O que se vê são três frentes de atuação golpista coordenadas pelo general Braga Netto desde seu QG em Brasília. A primeira, evidentemente é a cara pública do movimento, os patriotas nas estradas e na frente dos quartéis. Mas, se a maioria das manifestações só produzem memes diários, que inclui até uma campanha de boicote à Copa do Mundo, a turma do agronegócio e os bolsonaristas de Santa Catarina mostram disposição para começar logo o golpe com atos terroristas. O financiamento deste grupo tem sido o foco das ações do Supremo Tribunal Federal (STF) e do Tribunal Superior Eleitoral (TSE). A segunda frente são os próprios militares. Seja o alto escalão, como o próprio Braga Netto e o general Villas Boas e família  - que tem atuado como uma espécie de porta voz do movimento - como também outros generais e coronéis da ativa, que fazem coro às críticas às eleições, a Lula, Alckmin e aos tribunais superiores. Por fim, há uma frente institucional, que vinha atuando nos bastidores mas que ganhou a cena nos últimos dias. Quem tocou o berrante nesta frente foram o ministro do TCU, Augusto Nardes, cuja aliança com Bolsonaro foi paga a preço de diamantes, e o presidente do PL, Valdemar da Costa Neto. Mas é neste ponto que Bolsonaro encontra sua principal fraqueza, já que a frente institucional é permeável às ambiguidades e aos freios e contrapesos da política. Assim, a fala de Nardes, que deveria ser uma espécie de ultimato golpista à posse de Lula, foi desacreditada pelos seus próprios colegas como “blefe puro” e agora o ministro pode virar alvo do STF e do TSE. O mesmo vale para o pseudo-relatório que comprovaria a fraude no segundo turno das eleições presidenciais. Bolsonaro sonha em apoiar publicamente os patriotas de plantão, mas como não tem coragem de pôr a cabeça para fora com medo da lâmina do Judiciário, terceirizou a tarefa para Costa Neto. E o presidente do PL, que foi pego de calças curtas no improviso por Alexandre de Moraes, agora terá que pagar uma dívida de irônicos R$22 milhões, enquanto vê o PP e o Republicanos abandonarem o barco de Bolsonaro para não irem a pique.

.Canarinho pistola. Apesar da resiliência das manifestações bolsonaristas e do discurso golpista, a estratégia do PT parece ser fingir que nada está acontecendo. O cálculo é que responder nas ruas seria engolir a isca para criar o caldo de instabilidade e turbulência que o bolsonarismo tanto quer para tumultuar ou impedir a transição. Porém, mesmo que a estratégia de ignorar o bolsonarismo funcione, Lula só estará protelando um problema de primeira ordem: com a evidente participação dos militares nas ações golpistas, como será a relação com a caserna nos próximos anos? Será preciso definir também o destino de cerca de 6.000 militares hoje alocados no governo. A chave para resolver o imbróglio passa pela escolha do ministro da Defesa, onde, assim como nas outras pastas, há mais especulações do que certezas. E uma das poucas certezas é que Lula não tem nenhum aliado próximo e de peso suficiente nessa área. O sinal de que as relações são tensas é que os atuais comandantes do Exército, da Marinha e da Aeronáutica podem deixar seus postos ainda este ano, num gesto que sinalizaria insatisfação e distanciamento do novo governo. Daí entende-se porque a defesa é a única área que não conta com um GT na equipe de transição. Para resolver o impasse, está prevista uma consulta a todos os ex-comandantes das forças armadas. Os contatos iniciaram pelos que ocuparam cargos durante os governos do PT, como Enzo Peri, o brigadeiro Juniti Saito e os almirantes Julio Soares de Moura Neto e Eduardo Bacellar Leal Ferreira e pelos militares que ocuparam postos de comando no governo Bolsonaro mas que defenderam a autonomia das forças armadas, como Edson Leal Pujol e Fernando Azevedo e Silva. Há ainda a delicada transição no setor da Inteligência, que depende da colaboração do bolsonaríssimo general Heleno, que se encontra à frente do Gabinete de Segurança Institucional.

.Retranqueiros. O ônus da estratégia de ignorar o adversário é o vazio político do lado petista que, sem criar fatos novos, deixa o controle da bola com o lado derrotado. Os anúncios de nomes para a equipe de transição perderam o fôlego e já está claro que as nomeações são um misto de afago e reconhecimento de aliados com a sinalização de que o governo pretende mesmo ser uma frente ampla. E a nomeação de ministros, que sinalizaria o que será mesmo o novo governo, só deverá ocorrer depois da Copa do Mundo. Outro problema é que este vazio político se reflete na negociação da PEC da Transição, fundamental para o início da gestão, mas que patina justamente pela desconfiança do Congresso com os interlocutores. A pressão vem de todos os lados: parlamentares que não se reelegeram mas emplacaram emendas para o próximo ano, Arthur Lira e a expectativa de se reeleger na presidência da casa e partidos aliados de olho na divisão de ministérios. Sem Lula, afastado por motivos de saúde, a solução do PT foi reforçar os negociadores, especialmente no Senado. Além disso, o próximo governo ainda tem que conviver com o chilique permanente do mercado financeiro. Solenemente ignorado pelo presidente eleito, que ainda por cima promete barrar privatizações, resta à Faria Lima se valer dos próprios mecanismos de chantagem como as projeções de inflação e taxas de juros e até o desaparecido risco-Brasil do qual não se ouviu falar por quatro anos. A militância bolsonarista do mercado financeiro é tanta que vai na contramão inclusive das projeções de Wall Street.

 

.Ponto Final: nossas recomendações.

.Richarlison, o voo do “pombo” que se destaca na seleção por suas posições políticas e sociais. No Congresso em Foco, um perfil, dentro e fora de campo, do centroavante que garantiu a vitória da seleção brasileira na estreia da Copa.

.No true crime à brasileira, a vítima é sempre negra. Pesquisa do Núcleo de Justiça Racial e Direito da FGV-SP demonstra a lentidão do Judiciário em crimes do Estado com vítimas negras. Na Piauí.

.Racismo fundiário: negros são maioria no campo, mas têm menos terras do que brancos. Maior parte da população camponesa, os negros têm as menores propriedades de terra, comenta o escritor Itamar Vieira, autor de Torto Arado.

.“Fazer um filme sobre o Racionais me ajudou a entender quem eu sou”. Na Piauí, a cineasta negra Juliana Vicente relembra os sete anos de produção do documentário sobre os Racionais Mcs.

.O Brasil do agronazifascismo. No Diplomatique Brasil, Luiz Fernando Leal Padulla recupera os laços entre a indústria de agrotóxicos e o nazismo.

.O que seria da Copa do Mundo sem a Coca? O Joio e o Trigo descreve como a Coca-Cola contribuiu para tornar a Fifa uma grande corporação de negócios escusos em troca de publicidade nociva à saúde infantil.

.Quando Saramago se preparava para ser Saramago. Em homenagem ao seu centenário, o Jornal da USP recupera entrevistas do escritor português muito antes de sua consagração com o Nobel de Literatura.

 

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Ponto é editado por Lauro Allan Almeida Duvoisin e Miguel Enrique Stédile.

 

 

 

Edição: Vivian Virissimo