Energia

Após acordo entre governo e oposição, EUA liberam operações da Chevron na Venezuela

Empresa estava impedida de atuar no país por sanções; produção petroleira venezuelana pode aumentar

Caracas (Venezuela) |
Governo espera diversificar setor produtivo e gerar divisas sem depender do petróleo - AFP

O Departamento do Tesouro dos EUA publicou no último sábado (26) uma licença geral que permite que a gigante do setor energético Chevron volte a operar em território venezuelano.

A medida foi anunciada horas depois da assinatura de um acordo entre as delegações do governo e da oposição da Venezuela que estavam reunidas no México para reiniciar a mesa de negociações que havia sido suspensa em outubro de 2021.

Com a licença, a Chevron agora está autorizada a produzir e extrair petróleo nas quatro plantas mistas nas quais opera na Venezuela como sócia minoritária da PDVSA, a estatal petroleira venezuelana. Além disso, a empresa está liberada a exportar para os EUA o petróleo e derivados produzidos nestas plantas.

A permissão para que a Chevron voltasse a operar no país sul-americano era aguardada desde a primeira visita de uma delegação estadunidense enviada por Joe Biden a Caracas para conversar com o governo venezuelano sobre possíveis acordos comerciais em matéria energética.

Em comunicado, o Departamento do Tesouro dos EUA alegou que a liberação concedida à Chevron tem relação direta com o "importante passo" que representou a reinstalação da mesa de diálogo entre governo e oposição.

"Essa ação reflete a permanente política dos EUA de promover alívios pontuais de sanções baseados em passos concretos que aliviem o sofrimento da população venezuelana e apoiem a restauração da democracia", disse Washington.

No entanto, o reinício da mesa de diálogo deve servir apenas para baixar os custos políticos para o governo Biden de uma reaproximação com a Venezuela, já que tanto os EUA quanto a Europa chegam ao final de 2022 ameaçados pela crise no abastecimento de petróleo e gás causada pela guerra na Ucrânia e já manifestavam desde meados do ano interesse no petróleo venezuelano.

Além disso, a Casa Branca esperava a realização das eleições de meio mandato para iniciar a suspensão de algumas sanções contra a Venezuela. Como já havia sido adiantado pelo Brasil de Fato, o governo Biden temia que possíveis acordos com Caracas retirassem votos dos democratas em alguns estados.

Venezuela não vai receber nada?

Estima-se que juntas, as quatro plantas mistas que possuem participação da Chevron podem chegar a produzir 200 mil barris de petróleo por dia, o que poderia levar a produção venezuelana a 1 milhão de barris diários.

Uma cláusula da licença emitida pela Agência de Controle de Ativos Estrangeiros (OFAC, na sigla em inglês), no entanto, diz que a Chevron está proibida de "pagar qualquer taxa, royalties, [...] ou dividendos" para a PDVSA ou para o governo da Venezuela, dando a entender que o país não se beneficiaria financeiramente da produção que será reativada.

Ao Brasil de Fato, Franco Vielma, especialista em política petroleira, explica que em nenhuma condição uma empresa estrangeira poderia retirar petróleo do território venezuelano sem pagar pela exploração. Esse pagamento viria de forma indireta.

De acordo com Vielma, a Chevron de fato não pagaria nada para a estatal petroleira venezuelana nem para o governo pois isso seria função da empresa mista na qual a empresa é sócia minoritária. “Formalmente, a Chevron não paga de maneira direta, quem vai pagar as taxas correspondentes serão as empresas mistas das quais a Chevron é acionista, mas o dinheiro vai sair da comercialização do que for produzido nessas plantas”, disse.

Vielma alega que, ao afirmar que a Chevron não pagará nada à PDVSA ou ao Estado venezuelano, o documento emitido por Washington se utiliza de um artifício de relações públicas para eximir o governo dos EUA de aparentar estar financiando o governo venezuelano de alguma maneira.

“É uma manobra retórica, eles colocam uma razão técnica para conter danos políticos entre a opinião pública, ou seja, eles retiram sanções e capitulam de sua estratégia de pressão máxima contra a Venezuela ao mesmo tempo em que se declaram vencedores”, explica.

Entre as outras proibições expressas no documento da OFAC estão a impossibilidade de expansão para novas plantas, a venda de petróleo ou derivados para qualquer outro país que não os EUA ou a realização de negócios com outra empresa que seja propriedade da Rússia.

Desbloqueio de fundos

O anúncio do retorno das operações da Chevron na Venezuela foi apenas um dos alívios no bloqueio contra o país que ocorreram neste final de semana. No mesmo sábado, governo e oposição assinaram um acordo que prevê o desbloqueio de fundos estatais que haviam sido congelados no exterior pelas sanções dos EUA.

"Dos mais de US$ 20 bilhões (cerca de R$ 107 bi) retidos em bancos estrangeiros pelo sistema financeiro, queremos anunciar que por meio desse acordo estamos resgatando mais de US$ 3 bilhões (mais de R$ 16 bilhões) que vão diretamente ao financiamento da educação, cultura, saúde e eletricidade", disse no sábado Jorge Rodríguez, presidente do Congresso venezuelano e chefe da delegação governista na mesa de negociações.

Segundo o documento assinado por ambas as partes, será constituída uma comissão formada por representantes governistas e opositores para dar prosseguimento na aplicação do acordo. Os fundos liberados serão geridos pelas partes com supervisão da ONU.

A suspensão de sanções é uma das principais pautas do governo na mesa de negociação. Após a assinatura do acordo, Rodríguez garantiu que pedirá que "todas as medidas coercitivas unilaterais sejam suspensas".

Edição: Rodrigo Durão Coelho