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Relatório revela ganhos imensos e alta dependência externa no mercado agroquímico brasileiro

O agro não resolverá a fome; seu crescimento trouxe mais veneno e insegurança alimentar

Da Campanha Permanente Contra os Agrotóxicos e pela Vida |
Venenos paraquate e glifosato foram responsáveis por 214 mortes no Brasil na última década - Arquivo / EBC

 

Entra ano sai ano, governos entram e saem ,crises abalam a economia, mas uma coisa nunca muda: a indústria de agrotóxicos sempre aumenta seus ganhos no Brasil. Este é um dos destaques do relatório anual apresentado pela Abiquim, associação que reúne as empresas do ramo químico no Brasil.

A série histórica compilada pela entidade mostra um desempenho impressionante: de 1996 a 2022, em apenas 4 anos o faturamento da indústria de agrotóxicos no Brasil não subiu. A média anual de crescimento ao longo destes 26 anos é de impressionantes 9,7% ao ano. Os outros segmentos da indústria química tiveram crescimento anual no mesmo período bem menor, entre 2,6% e 5,9%. Há apenas uma exceção: o setor de fertilizantes, que supera os agrotóxicos nessa série, com uma média de 9,9% ao ano.

Esse crescimento não possui paralelo em nenhum país do mundo. Desde 1996, a taxa de crescimento do PIB brasileiro nunca superou os 8%, tendo sido maior do que 5% em apenas 3 anos. A área plantada de soja, milho, algodão e cana-de-açúcar, que juntas respondem por 84% do uso de agrotóxicos no Brasil, cresceu apenas 3,68% ao ano de 1996 a 2021. Olhando a quantidade produzida, em toneladas, a taxa foi ainda menor, de 2,24% ao ano para as mesmas culturas.

Ou seja, nada justifica um crescimento de 10% ao ano ao longo dos últimos 26 anos que não seja a implementação no Brasil, no mesmo período, de um modelo agrícola projetado somente para beneficiar as transnacionais agroquímicas, em especial do ramo de agrotóxicos e fertilizantes químicos.

O relatório mostra ainda que este modelo – o agronegócio – possui ainda uma altíssima dependência externa. No caso dos fertilizantes químicos, das quase 42 milhões de toneladas vendidas em 2022, nada menos do que 84% correspondem a produtos importados. Para os agrotóxicos, o relatório mostra que foram importados U$ 6,2 bilhões, frente a um faturamento anual de U$ 14,9 bilhões, o que representa 42% do total vendido aos fazendeiros.

Por outro lado, os dados do Ibama de 2020 mostram que 77% dos produtos técnicos (insumos para a produção do agrotóxico vendido no mercado) utilizados no Brasil são importados. A pandemia da Covid19 demonstrou a fragilidade das cadeias de suprimento globais, e como essa dependência facilmente se transforma em desabastecimento e inflação.

O grau de profundidade da dependência, contudo vai além. Mesmo no caso dos produtos fabricados no Brasil, o lucro não fica por aqui. As campeãs do mercado de fertilizantes são Mosaic (EUA) e Yara (Noruega). No caso dos agrotóxicos, são as velhas conhecidas BASF (Alemanha), Syngenta (China), Bayer (Alemanha), Adama (Holanda), DowDupont (EUA), entre outras.

Este é o agronegócio: um modelo agrícola onde os maiores custos de produção são referentes a agrotóxicos e fertilizantes, que são importados ou fabricados por empresas estrangeiras e cuja produção das commodities agrícolas são também controladas por grandes empresas transnacionais: ADM, Bunge, Cargill, Cofco e Dreyfus.

As consequências? O mercado de agrotóxicos e fertilizantes crescendo 4 vezes mais ao ano do que a produção agrícola, lucros bilionários, metade da população sem se alimentar de forma adequada e 33 milhões de pessoas passando fome. E o aumento da contaminação das águas e dos alimentos por diversos agrotóxicos, incluindo o cancerígeno glifosato.

O presidente Lula foi eleito tendo como prioridade número 1 enfrentar o problema da fome. Os dados apresentados aqui são apenas mais uma prova de algo que já falamos há tempos: este problema não será resolvido pelo agronegócio. 

Somente uma reforma agrária popular e politicas de incentivo e proteção à agricultura familiar pode garantir terra e condições adequadas ao aumento da produção de alimentos pelas famílias que vivem no campo, como camponeses, quilombolas, indígenas e todos os povos do campo, floresta e águas.

As primeiras medidas do novo governo devem ter um caráter de emergência, e pari passo construir politicas de mudanças estruturais de nossa produção, com uma forte transição para a agroecologia, defesa da natureza, das águas e da biodiversidade.

A bancada ruralista sempre atuou e sempre atuará para alimentar de lucros a Bayer e suas parceiras. Confiamos que, a partir de primeiro de janeiro, se alimente com comida saudável o povo o que tem fome e pressa.

* As opiniões expressas nesse texto não representam necessariamente a posição do jornal Brasil de Fato.

 

Edição: Rodrigo Durão Coelho