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Porcaria!

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Era dia de retirar o esterco dos chiqueiros e, ao revirar aquilo tudo, o cheiro se espalhava - Wikimedia Commons
A fazenda era um modelo de racionalidade e produtividade

Uma época eu passei anos viajando no interior paulista, levando atividades de cultura e esportes, como empregado do Sesc. A gente viajava em dupla, e o meu parceiro era o Manetti, que pegou mania de criar porcos, mas só teoricamente. Estudava o assunto e planejava ter uma grande criação porcos.

Um dia, passávamos por uma rua de São João da Boa Vista, com o Manetti dirigindo a perua do Sesc, e ele meteu o pé no freio de repente. Assustei. Ele tinha visto um açougue e resolveu parar desse jeito, de supetão. Encostou o carro e me chamou pra ir ao açougue. 

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Entramos no “estabelecimento”, ele disse ao dono que era criador de porcos e perguntou quanto o sujeito pagava pela arroba de carne suína. Negoceou um pouco, pra ver se o sujeito oferecia um pouco mais e, por fim, saímos. Eufórico, ele calculava os lucros que teria quando tivesse mesmo sua criação.

No meio do ano, a gente estava em Itapira, trabalhando com um grupo de adolescentes orientados para fazer trabalhos comunitários, e um dos rapazes era filho do dono de um frigorífico que tinha sua própria fazenda de criação de porcos. Marquei uma visita lá e chamei o Manetti e o Airton, nosso coordenador.

A fazenda era um modelo de racionalidade e produtividade. Plantava tudo utilizado na ração, usava o esterco do porco para adubar as terras etc. Antes de chegar lá, um cheiro insuportável tomava conta do ar. Era dia de retirar o esterco dos chiqueiros e, ao revirar aquilo tudo, o cheiro se espalhava. 

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A mais de um quilômetro, o cheiro já era horrível. Eu fumava cachimbo o tempo todo pra não sentir o cheiro.
Vimos como tudo funcionava e voltamos. Paramos num posto de gasolina pra abastecer a perua, o frentista olhou a sola dos sapatos, incomodado, pensando que tinha pisado em cocô. Na verdade, o cheiro estava impregnado em nós e no carro. 

O Manetti nos deixou no hotel e foi mandar lavar a perua. Eu tirei a roupa no corredor do hotel e telefonei pra portaria pra pegarem aqueles molambos fedorentos pra lavar. Entrei direto debaixo do chuveiro, onde fiquei por quase meia hora, me ensaboando sem parar.

O futuro criador de porcos pesquisou e tentou descobrir uma fórmula pra estrume de porco não feder tanto. Não teve jeito. O estrume venceu.

 

*Mouzar Benedito é escritor, geógrafo e contador de causos. Leia outros textos

**Este é um artigo de opinião. A visão do autor não necessariamente expressa a linha editorial do jornal Brasil de Fato.

Edição: Daniel Lamir