Gilberto Carvalho, secretário nacional de Economia Popular e Solidária - pasta recriada no governo Lula - falou na tarde desta quarta-feira (25) no Fórum Social Mundial, realizado em Porto Alegre (RS).
Na mesa "Tecendo redes, transformando realidades, reconstruindo o Brasil", ele discorreu não só sobre a sua área, mas abordou aspectos como a participação social, a disputa interna e externa do atual governo e a necessidade de tornar mais concretas as realizações da atual gestão, para que não possam ser revertidas tão facilmente em uma eventual troca de governo ou tentativa de ruptura.
"Precisamos ousar, ter a ambição na seguinte perspectiva: não nascemos para governar o Brasil apenas. Tivemos uma experiência longa, de 14 anos de gestão, e temos orgulho dela. Não fizemos pouco, fizemos muito. Ocorre que algumas limitações, e talvez a falta de ousadia em alguns aspectos, fizeram com que todo esse trabalho fosse destruído em poucos meses com um golpe, e se aprofundou tragicamente no governo Bolsonaro", destacou. "Não vai adiantar termos um governo Lula se daqui a oito, dez anos, sofrermos outro golpe, e pior, sem nenhuma resistência real."
Para o secretário, é necessário promover um trabalho de conscientização. "Senão é uma roda em si mesmo porque a capacidade de destruição que eles têm é trágica e cruel."
Assim, para dar perenidade às conquistas sociais, a participação social se torna um aspecto fundamental.
"Não queremos fazer um Minha Casa Minha Vida em que as pessoas sejam chamadas na última hora sem saber o que representa aquele empreendimento", disse. "Queremos construir projetos em que os movimentos sociais estejam envolvidos e funcionem como fermento da massa, orientando, discutindo e ganhando para nosso projeto aquelas consciências."
"Espero que tenhamos um governo pedagogo, que construa com o povo a mudança material de vida mas também a mudança cultural, política e ideológica. Caso contrário, nessa mudança que tivemos na sociedade brasileira, corremos o risco de, em 2026, passarmos por apuros piores do que os que estamos passando", reflete.
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"E não nos iludamos: o fascismo não foi um fenômeno eleitoral, o fascismo que brota na família de cada um de nós, na macarronada do domingo que tem aquele cunhado chato, o primo com quem você não consegue mais conversar... Isso veio para ficar, está presente na sociedade, aqueles que manifestaram e boa parte daqueles que estão presos em Brasília não fazem parte da elite dominante, pertencem à nossa classe e foram ganhos nesse processo de implementação de fascismo, misturado com esse processo de fundamentalismo religioso. Foram ganhos pelas fake news e e são pessoas e setores da sociedade que precisamos trazer de volta, reforçar nosso polo, se não quisermos enfrentar uma divisão maior como o desse apuro todo das eleições."
A economia solidária como eixo central
"Um dos trabalhos mais importantes é primeiro fazer o próprio governo saber o que é economia solidária", disse Carvalho, apontando que o papel das políticas públicas é fomentar iniciativas que já existem. "O papel do governo não é dirigir o processo, mas estimular a amplificação dessa rede, ajudar na questão do suporte legal, avançar discussões como a da lei das cooperativas, é preciso aprovar uma lei que seja democrática e não contemple apenas os grandes. Estimular o surgimento de mais empreendimentos e buscar mais financiamento."
Carvalho destacou que é preciso também que o poder público contribua no processo de formação e qualificação de quem já empreende e que a área terá um papel central na gestão. "Há uma decisão de governo que o presidente Lula incorporou: economia popular e solidária não é nicho, para sua sobrevivência apenas. Tem um significado muito maior", assegura.
"A gente sonha com um dia em que o Ministério da Economia seja também o Ministério da Economia Solidária. Sonhamos com o dia em que a orientação geral da economia brasileira mude. A economia solidária tem que dar forma, consistência para um novo padrão de funcionamento econômico nacional", apontou. "Há uma nova revolução tecnológica e do próprio capitalismo, e é nesse processo que temos uma avenida a ocupar com novas formas de gestão do capital e de gestão coletiva dos meios de produção."
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Inovação e pesquisa também são pontos-chave, segundo Carvalho, para o desenvolvimento do setor. "Não podemos nos contentar em ser bons gestores, precisamos avançar muito mais. Por isso que aliança com as universidades e todo o setor de pesquisa é fundamental. Precisamos de tecnologia de ponta, não podemos ficar apenas com as sobras do capital."
"A economia solidária é ponta de lança nesse processo, ela tem a possibilidade de antecipar valores vitais, práticos, que nós esperamos viver em uma nova sociedade, mas [já podemos viver] hoje, sabendo que uma sociedade futura ou se constrói a partir de agora ou não se constrói. Ou se mudam valores e os praticamos agora ou eles nunca virão."
Edição: Rodrigo Durão Coelho