Em audiência transmitida pela internet, a Corte Interamericana de Direitos Humanos anunciou nesta segunda-feira (30) a sentença que condena o Estado colombiano por “ação premeditada para exterminar” o partido de esquerda União Patriótica, em ações que aconteceram entre os anos 80 e 2000.
O organismo judicial autônomo da Organização dos Estados Americanos (OEA) realizou a audiência em São José da Costa Rica, onde fica sua sede.
A decisão proferida pelos magistrados levou em conta uma investigação de mais de 13 anos, que apurou as causas e circunstâncias de cerca de seis mil assassinatos cometidos contra militantes da União Patriótica entre 1987 e 2003.
O tribunal considerou a Colômbia responsável por violações dos direitos à vida, integridade, liberdade, às garantias judiciais e à honra das vítimas, por homicídios, detenções arbitrárias, deslocamentos e desaparecimentos forçados, entre outros crimes.
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“A Corte Interamericana de Direitos Humanos declarou que o Estado da Colômbia é responsável pelas violações de direitos humanos, como consequência de um plano de extermínio dirigido contra o partido, seus membros, militantes e simpatizantes”, diz um trecho da sentença lida pelo juiz Ricardo C. Pérez, presidente da Corte Interamericana.
Detalhes da sentença
Entre as ordens de reparação, a Corte determinou que o Estado colombiano realize uma comissão para verificar a identidade e parentesco das vítimas.
Também solicitou medidas para promover novas investigações, reabrir casos e realizar “apurações mais amplas e sistemáticas, a fim de estabelecer a verdade dos fatos relacionados com graves violações de direitos humanos no presente caso e determinar as responsabilidades penais que possam existir”.
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“O Estado deverá realizar uma campanha nacional na mídia pública para sensibilizar a sociedade colombiana sobre a violência, perseguição e estigmatização a que foram submetidos os dirigentes, militantes, membros e familiares dos membros da União Patriótica”, acrescenta a sentença.
Com relação à reparação econômica às vítimas, a Corte ordenou que o Estado deverá entregar, por uma única vez, uma indenização que varia entre 10 mil e 15 mil dólares norte-americanos às 1.596 vítimas sobreviventes e familiares de falecidos identificados nas investigações já concluídas.
Sobre a União Patriótica
Apesar do massacre sofrido durante décadas, a União Patriótica ainda existe. O partido foi fundado em 1985 e rapidamente se transformou em referência da esquerda colombiana.
Sua primeira candidatura presidencial terminou sendo um indício do que a legenda teria que sofrer ao longo de décadas. Em 1986, o candidato da União Patriótica nas eleições presidenciais, Jaime Leal Pardo, obteve 10,93% dos votos. No ano seguinte, ele se tornou o primeiro membro do partido assassinado a tiros.
A segunda disputa eleitoral da União Patriótica foi em 1988, quando participou das eleições regionais e se impôs como terceira força política do país ao eleger 16 prefeitos próprios, mais 79 em coalizão com outros partidos, além de 18 deputados provinciais e 368 vereadores.
Também foi nesse ano que os militantes da legenda passam a ser alvos de constantes ataques armados. A segunda candidatura presidencial do partido sequer conseguiu chegar às urnas: Bernardo Jaramillo foi assassinado em março de 1990, dois meses antes do pleito. O partido decidiu não participar da disputa.
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Sempre se suspeitou da ação de partidos políticos de direita e até de figuras ligadas ao Estado colombiano, especialmente durante os mandatos dos presidentes Virgilio Barco (1986-1990), Cesar Gaviria (1990-1994), Andrés Pastrana (1998- 2002) e Álvaro Uribe (2002-2010).
No entanto, somente depois de mais de oito anos de investigação da Corte Interamericana se chegou a esta primeira sentença.
Eventos organizados pelo partido também eram alvo de ataques, no que resultou em chacinas conhecidas na Colômbia como os massacres de La Chinita (1993), Mondoñedo (1996), Mapiripán (1997), de Tocaima (1997), entre outros.
Atualmente, a União Patriótica é presidida pela senadora Ainda Avella, sobrevivente de um dos atentados realizados contra o partido em 1996. Nas eleições presidenciais de 2021, o partido compôs a coalizão Pacto Histórico, que elegeu o presidente Gustavo Petro e a vice-presidente França Márquez.