Depois de um Carnaval atípico em abril do ano passado, com o adiamento da festa em razão da variante ômicron da covid-19, a folia carioca retorna à data regular em 2023. Nos dias 19 e 20 de fevereiro, as escolas de samba do Grupo Especial do Rio de Janeiro passarão pela Marquês de Sapucaí na disputa pelo título do Carnaval 2023.
O Brasil de Fato preparou um resumo de cada enredo das 12 escolas que desfilarão no sambódromo, com link para a letra dos sambas. Na ordem dos desfiles, a Império Serrano abre a noite do dia 19, um domingo, a partir das 22 horas. Na sequência, vêm a Grande Rio, que é a atual campeã, Mocidade Independente, Unidos da Tijuca, Salgueiro e a Mangueira, que encerra o dia.
Já na segunda-feira (20), a noite começa com a Paraíso do Tuiuti, continua com a Portela, veterana do Grupo Especial e que está completando 100 anos em 2023, seguida pela Vila Isabel, Imperatriz, Beija-Flor e a Viradouro, já fechando o segundo dia de desfiles por volta das quatro horas da manhã.
DESFILES DE DOMINGO (19)
Império Serrano
Carnavalesco: Alex de Souza
A escola de Madureira, fundada em 1947, volta ao grupo de elite do Carnaval carioca com o enredo "Lugares de Arlindo", faz uma homenagem a um de seus mais importantes sambistas, o músico e compositor Arlindo Cruz, figura máxima do grupo Fundo de Quintal. Arlindo, que se recupera desde 2017 de um acidente vascular cerebral, é um dos mais prolíficos autores de samba da escola do subúrbio carioca.
O enredo da Império Serrano lembra a importância de Bárbara Cruz, a Babi, grande amor de Arlindo e importante porta-bandeira da Mocidade Independente: “Em plena passarela, na ‘festa da massa’, que cantava seus hinos, onde imperou sua porta-bandeira, o grande amor”, diz a letra do samba.
Confira o samba da Império Serrano
Grande Rio
Carnavalescos: Gabriel Haddad e Leonardo Bora
Atual campeã do Carnaval carioca, a Grande Rio, escola de Duque de Caxias, na Baixada Fluminense, homenageia Zeca Pagodinho, um de seus mais ilustres moradores e um dos nomes mais importante do pagode. O enredo "Ô Zeca, o pagode onde é que é?" cita a música "Zeca, cadê você?", composição de Jorge Aragão e Zeca Pagodinho, refaz os trajetos do artista e leva para a Sapucaí um "Zeca way of life".
"Deixa a vida me levar / Onde o samba tem valor / Meu candiá / Encandeou! / Sou Grande Rio carregada de axé / Minha gira girou na fé!", canta uma das estrofes do samba". Segundo o enredo, é uma singela e jocosa homenagem a Jessé Gomes da Silva Filho, Zeca Pagodinho, “a cara do povo brasileiro”, na definição de Beth Carvalho; aquele que, nas palavras da jornalista Flávia Oliveira, pode ser lido como um “cronista de um subúrbio mais amoroso e solidário”.
Mocidade Independente
Carnavalesco: Marcus Ferreira
A Mocidade, escola de Padre Miguel, na zona oeste do Rio, mostrará ao público um pouco do legado de artistas discípulos do mestre Vitalino, o popular ceramista do Alto do Moura, região de Pernambuco. Vitalino Pereira dos Santos (1909 - 1963) se tornou bastante conhecido por suas peças de cerâmica que trazem figuras inspiradas nas crenças populares, no cotidiano, em rituais e em cenas do universo rural e urbano.
"Segue o carro de boi / O peão no barreiro / Ó rainha bonita / Sou teu rei, cangaceiro / É a vida um xadrez / Pra honrar o legado / Quem foi que fez? Foi Deus do Barro", diz o samba em uma das principais estrofes, mencionando Vitalino com o nome pelo qual ele ficou conhecido, Deus do Barro, no enredo "Terra de meu céu, estrelas de meu chão".
Unidos da Tijuca
Carnavalesco: Jack Vasconcelos
A maior baía do Brasil, com mais de mil quilômetros de extensão e mais de 50 ilhas será narrada, pela Unidos da Tijuca. A Baía de Todos os Santos, no estado da Bahia, recebeu esse nome por conta da chegada de portugueses em 1501, em 1º de novembro, o Dia de Todos os Santos, imediatamente depois do 31 de outubro, data pagã de celebração de bruxas e espíritos que vinham assustar as pessoas.
Mas a Baía de Todos os Santos se tornou referência das diversas crenças, como narra o enredo da Tijuca. De kirimurê, como chamavam os tupinambás, em referência ao "grande mar interior", pela embocadura da baía, aos versos do samba da escola em referência às religiões de matriz afro: "Beira de baía que desagua minha fé / Pode ser na missa ou no xiré do candomblé".
Confira o samba da Unidos da Tijuca
Acadêmicos do Salgueiro
Carnavalesco: Edson Pereira
As figurações e representações da treva e do paraíso pelos olhos e pela imaginação de Joãosinho Trinta, um dos mais importantes carnavalescos da folia carioca, serão relembradas pela escola do Borel, na zona norte do Rio, que apresenta o enredo "Delírios de um paraíso vermelho". Um dos outros eixos do samba da agremiação é a liberdade de expressão e a liberdade reivindicada para o artista na Sapucaí.
"No toque sublime de amor / O profeta pintou o paraíso / Intenso vermelho que tinge a emoção / Tá no meu coração Salgueiro / A vida em perfeita harmonia / A plena liberdade de viver / Mas a tentação que seduziu Adão e Eva / Fez o pecado florescer / Quem será o pecador? Quem irá apontar? / Há um olhar de querer julgar / Se cada um tem seu jeito / Melhor conviver sem preconceito", canta o Salgueiro.
Estação Primeira de Mangueira
Carnavalescos: Annik Salmon e Guilherme Estevão
Com o enredo "As Áfricas que a Bahia canta", a Mangueira vai abordar a diversidade e a pluralidade de construções, imaginações e recriações de África através dos cortejos negros do carnaval baiano. Destacando a centralidade da musicalidade e o forte protagonismo feminino, a escola irá retratar diferentes organizações afrocarnavalescas.
O desfile se divide em cinco formas históricas de cortejo negro do carnaval baiano: os cucumbis; os clubes uniformizados; os afoxés; os blocos afro; e o axé. Esta divisão tem um recorte temporal que vai da primeira metade do século XIX até hoje, explicam os carnavalescos. "Eparrey oya! Eparrey mainha! Quando o verde encontra o rosa toda preta é rainha / O samba foi morar onde o Rio é mais baiano / Reina a ginga de iaiá na ladeira / No ilê de tia fé, axé Mangueira!", diz trecho do samba.
DESFILES DE SEGUNDA-FEIRA (20)
Paraíso do Tuiuti
Carnavalescos: Rosa Magalhães e João Vítor Araújo
Agremiação do antigo bairro imperial de São Cristóvão, na zona norte do Rio, a Paraíso do Tuiuti abre os desfiles do segundo dia com o enredo "Mogangueiro da cara preta". Das especiarias com alto valor na Europa e a descoberta de temperos e condimentos no "descobrimento" do Brasil e das Américas, o enredo sobre a chegada de búfalos, originários da Índia, à Ilha de Marajó.
O enredo fala da reverência do povo da ilha a esses animais. Aproveitando as influências de festas nortistas, Mestre Damasceno, grande artista popular marajoara, criou um "Búfalo – Bumbá", uma adaptação do Auto do Boi, tendo como figura central o búfalo. A presença do boi foi largamente disseminada entre os povos Bantos africanos que, no período da colheita, conduziam um boi estilizado, em procissão animada por cantos e danças.
Confira o samba da Paraíso do Tuiuti
Portela
Carnavalescos: Renato Lage e Márcia Lage
A Portela comemora 100 anos e vai fazer um desfile em que relembra não só seus grandes carnavais e enredos do passado, como também homenageia suas figuras mais ilustres. Com o enredo "O Azul que vem do infinito", o samba é narrado por Paulo Portela, um dos fundadores da escola de Madureira ao lado de Rufino e Caetano: "Prazer novamente encontrar vocês / Ali pelas bandas de Oswaldo Cruz", canta Paulo, lá do infinito do enredo.
"Abre a roda', malandro, que o samba chegou / Andei na Lapa, também já subi o Pelô / Macunaíma falou: nas maravilhas do mar, a brisa me levou / Eis um Brasil de glórias que incandeia / A vaidade é um conto de areia / Eu vim apresentar: Deixa a Portela passar!", diz um dos trechos do samba, que passa por versos de diversos sambas-enredo do passado glorioso da Azul e Branco.
Vila Isabel
Carnavalesco: Paulo Barros
Com o enredo "Nessa festa, eu levo fé!", a Vila Isabel faz um passeio pelas religiões desde as crenças pagãs em vários deuses, representado neste Carnaval sobretudo pela figura de Dionísio e a incorporação do deus da Grécia pela mitologia romana na figura de Baco, com seu vinho que entorpecia os sentidos, embriagava a alma, aproximava os corpos, que dançavam em rodopios para homenageá-lo.
O desfile aborda também os egípcios, que nos ensinaram a comemorar o ano inteiro a partir das festas aos deuses. Crenças andinos, indígenas, orientais, cristãs, o sincretismo religioso até a chegada à morte fazem parte do enredo. "Eu sou da Vila batizado no terreiro / São Jorge protetor, Salve! o padroeiro / A voz do morro traz o samba na raiz / O ano inteiro sou festeiro, sou feliz", canta a Vila.
Confira o samba da Vila Isabel
Imperatriz Leopoldinense
Carnavalesco: Leandro Vieira
A Imperatriz conta a história do temido cangaceiro Lampião e sua tentativa de entrar no inferno após a morte, frente à resistência do diabo que vê diante de si um homem pior que ele próprio. Lampião então volta à terra, se abriga por de trás do dente canino e pontiagudo de uma carranca que navegava no São Francisco, aparece nos versos de Patativa do Assaré, na sanfona de Luiz Gonzaga, nos bonecos de barro de Vitalino e, por fim, baixa na Sapucaí.
"Quando a sanfona chora, mandacaru aflora / bate zabumba tocando no meu coração / Leopoldinense, cangaceiro, a minha escola / Eis o destino do valente Lampião", canta a escola de Ramos, com o enredo O aperreio do cabra que o Excomungado tratou com má-querença
e o Santíssimo não deu guarida.
Confira o samba da Imperatriz Leopoldinense
Beija-Flor de Nilópolis
Carnavalescos: Alexandre Louzada e André Rodrigues
A Beija-Flor pretende ressignificar o sentido de independência do país na Avenida, não tanto a partir do bicentenário da Independência pelas mãos de Dom Pedro I, em 2022, mas por um outro fato histórico, que completa 200 anos em 2023: a Independência da Bahia, em 2 de julho de 1823, quando portugueses foram expulsos, havendo, enfim, protagonismo popular, notadamente afro-ameríndio e feminino.
"A revolução começa agora / Onde o povo fez história / E a escola não contou / Marco dos heróis e heroínas / Das batalhas genuínas / Do desquite do invasor / Naquele dois de julho, o sol do triunfar / E os filhos desse chão a guerrear / O sangue do orgulho retinto e servil / Avermelhava as terras do Brasil", canta a escola, com o enredo "Brava Gente! O grito dos excluídos no bicentenário da Independência”.
Unidos do Viradouro
Carnavalesco: Tarcísio Zanon
A Viradouro conta a história de Rosa Maria Egipcíaca, nascida em Benin, na África, capturada pelo tráfico negreiro e levada para o Rio de Janeiro, onde permaneceu por mais de dez anos, até 1733, e depois levada para Minas Gerais. Rosa viveu como prostituta durante 15 anos. Dotada de visões espirituais e considerada santa por alguns, passou a ser perseguida por religiosos e vigiada pela Inquisição da Igreja Católica.
"Rosa Maria, menina flor / Rainha do espelho mar / Na pele do tambor / Pranto das dores que resistiu / Deságua no imenso Brasil / Sua luz incorporou: / Distante meu encontro das origens / Caminho onde o corpo foi prisão / Ouro que deixou as cicatrizes / Esperança foi vertigem / A alma, libertação", canta a escola de Niterói, que encerra os desfiles do Grupo Especial.
Fonte: BdF Rio de Janeiro
Edição: Mariana Pitasse