Após recomendação feita pelo Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (Iphan), as obras da Estação14 Bis, que vai integrar a Linha-6 Laranja do Metrô de São Paulo, foram paralisadas na sexta-feira (10) por conta das fortes chuvas que alagaram a capital esta semana. A iniciativa atende a uma demanda colocada pelo movimento Mobiliza Saracura Vai-Vai, que teme o comprometimento do sítio arqueológico encontrado abaixo do canteiro, a alguns metros de profundidade.
A preocupação do grupo envolve a tentativa de evitar o apagamento histórico de um dos mais relevantes quilombos já localizados em São Paulo. Segundo especialistas, objetos ali encontrados datam dos séculos XIX e início do XX e por isso têm alto valor histórico. Na última terça (7), o movimento ingressou com uma ação judicial na 8ª Vara Cível da Justiça Federal pedindo que fosse feita uma perícia técnica para avaliar as condições do local depois da inundação que afetou as obras.
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“A gente queria que, com a designação de um perito pela Justiça Federal, ele fosse lá e avaliasse os riscos que o sítio corria e queria que a empresa [responsável pela obra] nos apresentasse toda a documentação - que não nos forneceu - sobre as medidas de segurança e tudo que estivesse sendo feito pra garantir que não houvesse alguma perda relacionada ao sítio”, afirma Luciana Araújo, uma das lideranças do Mobiliza Saracura Vai-Vai.
Ela destaca que a organização não é contrária à obra no local. “A comunidade do Bixiga demanda estação ali há muitos anos e essa é uma obra que ficou parada quase dez anos. O nosso problema não é o metrô. Agora, no mundo inteiro é possível fazer metrô e preservar o patrimônio histórico. Ninguém imagina demolir o patrimônio de nenhum outro povo que não o povo negro. Só o racismo permite isso”, critica.
Luciana afirma que o local concentra diferentes objetos históricos que precisam de preservação. “O terreno da estação é gigante. Existe uma área de sítio grande, que tem a ver com todo o terreno da estação, mas a área onde eles vão efetivamente retirar as peças, que é o que chamam de ‘área de resgate’, é um pedaço do terreno onde foi localizado uma concentração maior de peças – muita cerâmica, muitos sapatos”.
Na quarta-feira (8), uma vistoria do Iphan constatou que uma barreira havia se rompido e que seria inviável dar seguimento ao trabalho no canteiro. Por conta disso, a recomendação que trata da suspensão das obras deve vigorar enquanto durarem as precipitações, segundo nota oficial divulgada pelo instituto na sexta (10).
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“A área inundada já foi drenada e as escavações arqueológicas poderão ser retomadas após o período de chuvas intensas. Apesar de terem sido instaladas barreiras de rochas para a contenção e o bombeamento das águas pluviais, estas não foram suficientes para a contenção do volume da chuva”, afirma o documento. O Iphan aponta também a relevância do local em termos de novas e futuras descobertas histórico-científicas.
“As escavações aconteciam a uma altura de 2,5 metros, distante da parte mais densa do sítio arqueológico, que se situa a 5 metros e permanece soterrada à espera de pesquisas. Realizado pela Secretaria dos Transportes Metropolitanos, o monitoramento arqueológico foi requisitado preventivamente pelo Iphan em etapa de reabertura de processo do licenciamento ambiental em 2021. Como consequência desses estudos, esta relevante memória do Bixiga foi descoberta. No caso da área da Estação 14 Bis, os vestígios identificados, até o momento, remetem à população urbana residente na cidade em meados do século XX. Contudo, os achados ainda estão sendo estudados e novas descobertas podem ocorrer”.
O Brasil de Fato procurou o Metrô de São Paulo e a concessionária LinhaUni, que opera a Linha-6 Laranja do metrô, questionando as medidas de segurança para a preservação do local, mas não conseguiu contato com as duas assessorias de imprensa neste sábado (11).
Edição: José Eduardo Bernardes