Após um período de seis anos de golpe e retrocessos, o ano de 2023 será marcado pela reestruturação do Estado brasileiro. As mudanças devem acontecer de forma real na vida das pessoas. Para isto, o plano de reconstrução do país deve conter políticas para o meio rural observando toda a sua diversidade e complexidade, especialmente com alternativa efetiva de combate estrutural à pobreza e à miséria nas áreas rurais e urbanas.
É preciso, então, promover o desenvolvimento nacional a partir da retomada de sua capacidade de investir e planejar o país. E como parte desta iniciativa é necessário constituir uma agenda de Desenvolvimento Rural Sustentável e Solidário com igualdade entre mulheres e homens, a partir de uma abordagem estratégica que supere a concepção, herdada do período recente e histórico, do meio rural como a parte atrasada em relação ao meio urbano.
A presença das mulheres é cada dia mais evidente no rural. Em 2017, elas foram identificadas como gestoras em 18,7% dos 5,07 milhões de estabelecimentos mapeados pelo Censo Agropecuário. Uma ampliação importante frente aos dados do Censo de 2006, quando elas representavam apenas 12,7%.
Apesar dos avanços, fruto de políticas específicas para as mulheres rurais implementadas entre 2003 e 2016, os desafios para a promoção da igualdade social e econômica entre mulheres e homens no campo ainda são latentes. As mulheres seguem sem ter assegurados seu direito à terra.
Apenas 19,7% das mulheres da agricultura familiar e 15,2% do segmento não familiar tinham acesso à terra, em 2017. O percentual de mulheres sem-terra era de 29,87%.
Por outro lado, as mulheres quando detentoras de terras, possuíam áreas menores em relação aos homens: 22,6% das mulheres da agricultura familiar, na condição de proprietária, concessionária ou assentada, tinham áreas com até 20 hectares. Assim, a dinâmica de acesso à terra continua concentrada nas mãos dos homens.
Se, os estabelecimentos da Agricultura Familiar são caracterizados pela diversidade e pluriatividade, são as mulheres as principais responsáveis. Os estabelecimentos dirigidos por elas se caracterizam pela produção de alimentos, plantas medicinais, mudas e sementes.
Elas também se dedicam a fabricação de calçados, roupas, móveis e cerâmicas. Essa produção, em geral, é voltada para o autoconsumo e manutenção da família. Contudo, as mulheres também desenvolvem atividades econômicas e geradoras de renda. 46,2% dos estabelecimentos dirigidos por elas tem como atividade econômica predominante a pecuária e criação de outros animais, 35,6% a produção de lavouras temporárias e 9,7% de lavouras permanentes.
Entretanto, os estabelecimentos dirigidos por mulheres ainda têm menor acesso a máquinas, equipamentos, assistência técnica, crédito e água. As mulheres seguem concentrando o trabalho de cuidados e reprodução da vida, e com menor rendimento médio mensal.
Considerando rendimentos da população ocupada, em 2017 o rendimento médio dos homens era R$ 2.410 enquanto entre as mulheres era R$ 1.868. A Subsecretaria de Mulheres Rurais (SMR) está na estrutura do Ministério do Desenvolvimento Agrário com o propósito de promover a igualdade entre mulheres e homens, incorporando essa perspectiva na elaboração e execução das políticas públicas para a agricultura familiar e desenvolvimento rural.
Uma parte da estratégia de atuação da SMR é a reedição e atualização de programas implementados nos governos progressistas de Lula e Dilma. Outra, é a criação de novas ações estratégicas para superar novos desafios como o combate à fome no campo e as mudanças climáticas, impulsionando novas políticas públicas para a efetivação da cidadania e promoção da autonomia das mulheres trabalhadoras rurais.
Nesta perspectiva, está em curso a construção de três programas voltados para as mulheres rurais:
1 - Programa Cidadania e Bem-Viver, que visa contribuir para que as mulheres do campo, das águas e das florestas possam viver com dignidade, tendo assegurados seus direitos civis, políticos e sociais. O programa está embasado em estratégias e ações integradas, que garantam o acesso das mulheres à documentação, à terra e ao território, a produzir e consumir alimentos saudáveis e a usufruir de um meio ambiente com qualidade e a viver sem violência e racismo.
2 - Programa Organização Produtiva de Mulheres Rurais, tem por objetivo promover o fortalecimento das organizações de mulheres rurais, por meio de ações articuladas que viabilizem o acesso às políticas públicas e que estimulem o desenvolvimento de processos produtivos e econômicos, que gerem alimentos e produtos saudáveis e sustentáveis e, ao mesmo tempo, promovam a valorização do trabalho e assegurem a autonomia econômica.
Está embasado em estratégias e ações que deverão ser desenvolvidas de forma integrada no âmbito dos processos produtivos, organizativos, econômicos e ambientais, nos quais as mulheres rurais, em sua diversidade e pluralidade, estão inseridas.
3 - Programa Gestão Social e Articulação em Rede, cujo objetivo é fortalecer os processos democráticos, ampliando a participação das organizações e movimentos de mulheres rurais nos espaços de participação social (ex. conselhos e nas conferências de políticas públicas), intensificando o diálogo em âmbito nacional e internacional e qualificando a contribuição das mulheres na gestão social das políticas públicas.
A SMR acredita que um Brasil capaz de assegurar a cidadania e o bem viver das mulheres rurais, bem como a organização produtiva para sua autonomia de forma articulada nacional e internacionalmente, promoverá um desenvolvimento agrário sustentável e solidário igual, o que é fundamental como parte de sua reconstrução porque: buscar reconstruir o meio rural passa por combate às desigualdades de gênero, geração, raça e renda, passa, necessariamente, pelas mãos das mulheres rurais.
*Subsecretária de Mulheres Rurais do MDA
Edição: Rodrigo Durão Coelho