O que está por trás do escândalo das joias da família Bolsonaro?
Olá, para poder destravar a economia, Lula tem que ficar de olho no Congresso e nos seus próprios ministros.
.Nem tudo o que reluz. Depois de semanas de tiroteios com o mercado financeiro e fogo amigo no tema dos combustíveis, o governo Lula ganhou uma preciosa folga na mídia, graças à mais recente patacoada da família Bolsonaro. O episódio da tentativa de entrar com joias avaliadas em R$16,5 milhões, um suposto presente do governo da Arábia Saudita para Michelle Bolsonaro, resultou numa investigação da PF sobre peculato, descaminho e lavagem de dinheiro. Ou talvez corrupção passiva: as jóias poderiam ser um suborno pela venda de uma refinaria brasileira para um grupo árabe ou para a expansão dos negócios de sauditas e da milícia em Angra dos Reis. De imediato, o escândalo interrompeu os planos da volta de Bolsonaro e a turnê que o PL pretendia fazer com Michelle pelo país. E se este inferno astral não for suficiente, o desgaste pode se prolongar caso avance o pedido de CPI na Câmara. Porém, nem assim o governo Lula deixou de se incomodar. Isso porque o portador das tais jóias era o ex-ministro e almirante Bento Albuquerque, cujos principais auxiliares ainda estão no Ministério de Minas e Energia com Alexandre Silveira (PSD). Além da influência do almirante bolsonarista no ministério, os petistas já haviam perdido a paciência com Silveira devido às trocas no Conselho da Petrobras, preterindo indicações do governo por nomes afinados com o centrão e Bolsonaro. O problema é que o destino de Silveira deve ser o mesmo do ministro das comunicações Juscelino Filho (União Brasil): por enquanto, nada.
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.Inflação no Congresso. Até agora, Lula se valeu de sua capacidade de comunicação e de seu capital político para enfrentar militares e o mercado. Afinal, ele sabe que governa um país dividido e marcado por uma grave crise econômica. Por isso, vai se tornando urgente formar maioria no Congresso. Na lista de temas a serem votados estão a reforma tributária, o novo arcabouço fiscal, medidas provisórias e ainda a necessidade de barrar a CPI dos atos democráticos que poderá ser usada para desgastar o governo. É por isso que Lula tem se mostrado disposto a engolir sapos do tamanho de Juscelino Filho e Alexandre Silveira. O problema é que, mesmo com a permanência de ambos e o desgaste que isto implica, não há garantias de fidelidade partidária do União Brasil e do PSD. A única certeza é que quem sai ganhando com tudo isso é Davi Alcolumbre (União Brasil-AP), padrinho de dois ministros e que continuará à frente da poderosa CCJ no Senado. Já para o governo, os riscos aumentam agora que o pseudo-aliado Arthur Lira dissolveu a coalizão formada em torno de sua candidatura à presidência da Câmara e colocou em dúvidas a capacidade do governo de conquistar maioria. Ou seja, os sinais apontam para um cenário de cada um por si, inflacionando o preço dos votos no varejo do Câmara. É o que deixa evidente o presidente da Frente Parlamentar da Agropecuária, deputado Pedro Lupion (PP-PR), que promete arregimentar trezentos votos para o governo desde que a pauta do agronegócio não seja prejudicada. Na prática, Lula já se prepara para falar a única linguagem que o Congresso entende - o toma-lá-dá-cá - aumentando o cacife de Alexandre Padilha para que o Planalto concentre e monitore as emendas parlamentares.
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.Contagem regressiva. Outra parte da estratégia de Padilha é formar uma maioria política pró-crescimento para pressionar o Congresso, e o caminho para isso é a recriação do Conselhão, que deve juntar desde movimentos populares até parte do PIB. O principal problema do governo é que o tempo para arrancar uma vitória na economia está se esgotando. Acertadamente, Lula conseguiu jogar a responsabilidade pela crise no colo do Banco Central. Mas se o bolo não voltar a crescer, os descontentamentos podem aumentar. Aliás, a oposição já dá sinais de que a trégua de “boa vontade” está no fim, como indicam a fala do tucano Tasso Jereissati e a elevação do tom das críticas vindas da mídia tradicional. Mas neste quadro predominantemente negativo há alguns motivos para comemorar. O mercado parece que finalmente entendeu que os juros precisam baixar, embora as expectativas sejam moderadas, e Haddad conquistou alguma confiança. Por isso, Lula entende que é momento de agir. A equipe econômica se comprometeu a entregar ao presidente a proposta de novo regramento fiscal na semana que vem. A ideia é que a aprovação do pacote acalme o mercado e destrave os investimentos. Ao mesmo tempo, Lula aposta na economia de massas, dando o sinal verde para que Haddad tire do papel o “Desenrola”, seu programa de renegociação de dívidas, e aproveitou o oito de março para equiparar os salários das mulheres aos dos homens na mesma função e retomar a construção de creches. E se a relação com os militares continua abalada, um empurrãozinho na indústria bélica talvez garanta uma trégua prolongada. O governo também aposta que uma parte das soluções para a economia venha do exterior. O Mercosul é tratado com prioridade, fortalecendo os laços comerciais com os vizinhos, como Uruguai e Venezuela, e tentando resolver os imbróglios do acordo com a União Europeia, travado devido à irresponsabilidade ambiental do governo Bolsonaro. Sem falar, é claro, dos benefícios que a aproximação da China pode trazer para o Brasil.
.Ponto Final: nossas recomendações.
.A lógica do trabalho escravo contemporâneo. No Instituto Front, Nauber Gavski da Silva analisa os componentes do trabalho escravo e discute as perspectivas de mudança de endurecimento no tratamento de patrões.
.“As empresas-plataformas são o quê? " Em entrevista ao IHU, o sociólogo Ricardo Festi defende a redução da jornada de trabalho a partir do caso dos motoristas de aplicativos.
.Oito medidas para regular big techs garantindo liberdade de expressão. Quatro professoras apresentam propostas para a regulação das grandes empresas de comunicação desmistificando o fim da liberdade de expressão.
.Mais de 340 empresas com certificado de sustentabilidade são acusadas de crimes ambientais. Apuração da Agência Pública revela que selos de sustentabilidade são apenas “para inglês ver”.
.'Salgadinho é mais barato que fruta'. A BBC demonstra como alimentos ultraprocessados são subsidiados pelo governo e matam milhares por ano.
.Apelo por joias confirma relatório militar sobre Bolsonaro feito há 40 anos . No UOL, Matheus Pichonelli relembra que a ganância de Bolsonaro por metais preciosos já vinha de seu tempo no exército.
.Queridos homens, vocês são fracos. Edith Bruck, sobrevivente dos campos de concentração nazista, reflete sobre a luta contra o patriarcado hoje.
.“Close”, favorito ao Oscar de melhor filme estrangeiro, faz retrato doloroso sobre homofobia estrutural. Filme belga discute homofobia, masculinidade tóxica e violência entre jovens.
Ponto é editado por Lauro Allan Almeida Duvoisin e Miguel Enrique Stédile.
Edição: Sarah Fernandes