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Acordo entre vinícolas e MPT, sem atuação de sindicatos, foi um erro, diz coordenador da Oxfam

"Sindicatos são instituições de diretos humanos", lembra Gustavo Ferroni sobre caminho para combate ao trabalho escravo

Ouça o áudio:

Segundo o Ministério do Trabalho, 2.575 pessoas foram resgatadas em condições análogaa à escravidão em 2022 - Sérgio Carvalho/ Inspeção do Trabalho

“Por que os sindicatos não foram envolvidos no TAC [Termo de Ajuste de Conduta] firmado entre o Ministério Público do Trabalho e as vinícolas?” O questionamento é do especialista Gustavo Ferroni, Coordenador Justiça rural e Desenvolvimento da Oxfam.

Na semana passada, as produtoras de vinho Aurora, Garibaldi e Salton ,envolvidas no caso dos 207 trabalhadores resgatados em situação análoga à escravidão no Rio Grande do Sul, assinaram um acordo de indenizações por danos morais no valor de R$ 7 milhões, que serão pagos às vitimas e também a instituições de combate a estes crimes.

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O valor ficou definido em acordo com o Ministério Público do Trabalho (MPT), assinado após audiência que durou mais de oito horas. Os termos preveem ainda 21 obrigações a serem cumpridas pelas vinícolas para aperfeiçoar o processo de tomada de serviços, incluindo a fiscalização das condições de trabalho e os direitos dos terceirizados para evitar que situações semelhantes aconteçam.

Na opinião de Ferroni o acordo falha, principalmente, por não envolver os sindicatos. “São instituições de direitos humanos, não podemos nos esquecer disso”, defende o especialista.

“Na Declaração Universal dos Direitos Humanos os sindicatos são uma das poucas instituições citadas”.

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O especialista vai além. Ferroni argumenta que “em locais onde os sindicatos do campo podem atuar não existem situações como essa. Podem haver infrações, mas trabalho análogo à escravidão não”.

No entanto, segundo o coordenador, os sindicatos estão ausentes, “muito por conta dos empregadores que firmam acordos coletivos excluindo a presença dos sindicatos”.

A argumentação de Ferroni parte do ponto de que o combate ao trabalho análogo à escravidão passa, principalmente, pela prevenção e fiscalização, não apenas pela punição”

“São alguns pontos. Primeiro precisamos prevenir, que significa garantir bons salários aos trabalhadores do campo e acesso à políticas públicas. Em Pernambuco, existe uma política de transferência de renda para trabalhadores safristas quando eles estão no período entressafras, destaca Ferroni.

Contudo, o especialista afirma que, sim, “a punição é importante, mas tem que estar amarrada a mudanças de conduta das empresas. O MPT precisa reconhecer que as grandes marcas são, sim, responsáveis pelo que os fornecedores fazem.

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“Quem define as condições são as grandes empresas, então elas precisam assumir as responsabilidade. a empresa não pode alegar que não sabia, ela tem obrigação de procurar saber”, finaliza.

Problema histórico e atual

“Não é novidade, mas é muito positiva a reação da sociedade”. Ferroni celebra que um crime recorrente chamou atenção da opinião pública.

“Ano passado tivemos casos muito semelhantes, inclusive em plantações de arroz, também no Rio Grande do Sul. Mas a reação foi diferente”, defende.

Mesmo tratando como algo que se repete ano a ano, o especialista argumenta que os últimos cinco têm sido mais críticos, por conta da reforma trabalhista, “que aumentou muito a terceirização e, consequentemente, levou vulnerabilidade extrema no campo.”

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Ferroni explica que empresas terceirizadas são especialistas em assediar trabalhadores de outras partes do país. Segundo o especialistas, elas atuam de maneiras que o trabalhador fica sem respaldo e muitas vezes nem conhece quem é o empregador.

Muito antes da reforma trabalhista, a herança colonialista é outro ponto que Ferroni traz para explicar a perpetuação desses crimes no país.

“Africanos foram sequestrados de suas regiões de origem para trabalhar em canaviais aqui. Hoje, é esse setor que mais está envolvido em casos de trabalho análogo à escravidão.”

Ferroni lembra que essa população foi esquecida nas leis que começaram a pôr fim à escravidão no Brasil. “Na lei do sexagenário, se o escravizado fosse rural, ele teria que trabalhar ainda mais 5 anos para o patrão/senhor para conseguir a liberdade”.

Caminhos

Nesta semana foi realizado Seminário Direitos Humanos e Empresas, o Brasil na Frente - Lei Marco no caminho global de mais regras para as empresas, organizado pela Oxfam, mas que envolveu diversos atores da sociedade civil.

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O encontrou foi prestigiado pelo ministro Silvio Almeida, da Cidadania e Direitos Humanos.

Um dos focos do evento, realizado em Brasília, foi elaborar maneiras de fazer com que o  PL 572/22 avance.

O projeto de lei cria o marco nacional sobre Direitos Humanos e Empresas e estabelece as diretrizes para a promoção de políticas públicas sobre o assunto. A proposta foi apresentada em 14 de Março passado pelos deputados federais na época Helder Salomão (PT/ES), Carlos Veras (PT/PE), Áurea Carolina (PSOL/MG) e Fernanda Melchionna (PSOL/RS), articulado com organizações e movimentos sociais, pesquisadores, universidades, assessores jurídicos populares, ambientalistas e comunidades atingidas, especialmente pelo rompimento das barragens de rejeito de mineração nas cidades de Mariana (2015) e de Brumadinho (2019), em Minas Gerais.

Atualmente, o PL 572/22 tramita na Câmara dos Deputados. Se aprovado no Congresso Nacional, será a primeira lei com este teor em todo o mundo. A lei marco avança para a responsabilização de empresas nacionais e estrangeiras com atuação no Brasil por violações aos direitos humanos, reconhecendo obrigações, também, por parte do Estado

“Precisamos criar um entendimento que funcione no Brasil, a partir da nossa realidade. Não adianta importar da Europa ou Estados Unidos marcos dos direitos humanos. Temo que ver o que o Brasil precisa por conta de sua história e realidade”, defende Ferroni

Esta lei poderia ser aplicada em situações de desrespeito às pessoas e ao meio ambiente, seja na área da mineração, em ocorrências de trabalho análogo à escravidão, como o caso recente envolvendo vinícolas na Serra Gaúcha.


Card Bem Viver / Brasil de Fato

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Edição: Lucas Weber