A proposta do governo para um novo arcabouço fiscal para o país encaminhada nesta terça-feira (18) ao Congresso Nacional contém uma lista de 13 despesas que não estarão sujeitas às restrições sobre gastos previstas no projeto. Segundo o governo, as exceções já estão previstas na Constituição e, segundo economistas ouvidos pelo Brasil de Fato, garantem investimentos em áreas prioritárias.
O novo arcabouço fiscal limita o crescimento das despesas do governo federal a 70% do crescimento da arrecadação da União no ano anterior. Isso significa que, se o governo prever receber R$ 100 milhões em impostos a mais em 2024, por exemplo, poderá aumentar seus gastos em R$ 70 milhões em 2025 . Esses valores são ilustrativos.
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Pela proposta do governo, porém, não entram nesse limite os gastos com projetos ambientais financiados por doações. Hoje, o teto de gastos não autoriza essas despesas, mesmo quando elas são pagas com recursos que não saem dos cofres públicos.
Também não entram no limite do arcabouço despesas de hospitais universitários federais custeadas com receitas próprias ou doações, outro ponto que o teto proibia.
Para o economista e professor da Universidade Federal de São Paulo (Unifesp), André Roncaglia, as exceções são razoáveis pois respeitam o que diz a Constituição e mantêm um certo controle sobre as contas públicas – objetivo principal do arcabouço.
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A economista Clara Brenck, pesquisadora associada no Centro de Pesquisa em Macroeconomia das Desigualdades (Made) da Faculdade de Economia e Administração da Universidade de São Paulo (FEA-USP), também aprovou a lista de exceções e disse que elas dão um “alívio” ao arrocho do teto de gastos, que entrou em vigor no governo de Michel Temer (MDB).
“Com esse novo PL [projeto de lei], que coloca algumas das despesas fora da regra, temos uma aliviada. Por exemplo, na Saúde, nas universidades, nas questões das mudanças climáticas – que é um ponto essencial do novo governo”, explicou ela. “Eu sou favorável a grande parte das exceções.”
“Na apresentação do novo arcabouço fiscal já tinham colocado como exceção o Fundeb, o piso da enfermagem, as regras constitucionais. Agora foram colocadas no documento novas exceções. As questões ao meu ver são importantes”, acrescentou ela.
Confira a lista completa:
1. Transferências constitucionais a estados e municípios para repartição com recursos de petróleo e tributários;
2. Repasses do Fundo de Manutenção e Desenvolvimento da Educação Básica (Fundeb) a estados e municípios;
3. Transferências a estados e municípios de recursos de concessão florestal;
4. Transferências para pagamento do piso nacional da enfermagem;
5. Créditos extraordinários, liberados em emergências;
6. Despesas com projetos socioambientais custeadas com recursos de doações ou acordos judiciais ou extrajudiciais;
7. Despesas das universidades e hospitais universitários federais custeadas com receitas próprias, de doações ou de convênios;
8. Despesas custeadas com recursos de transferências dos demais estados e municípios para execução de obras;
9. Despesas com acordos de precatórios a serem pagos com desconto;
10. Despesas com precatórios do Fundo de Manutenção e Desenvolvimento do Ensino Fundamental e de Valorização do Magistério (Fundef) devidos a estados e municípios;
11. Despesas da Justiça Eleitoral com as eleições;
12. Despesas com aumento de capital de empresas estatais não financeiras;
13. Despesas de cobrança por recursos hídricos da Agência Nacional de Águas (ANA);
Regra segue dura
Roncaglia ressaltou que as regras do novo arcabouço seguem restritivas, o que tende a criar tensão para o governo do presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT). Ponderou que o mercado financeiro, que segue pressionando o presidente, pode ter sido atendido.
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“A regra é bastante restritiva e por isso desagrada a base de apoio do governo. Mas ela também diminui a desconfiança do mercado financeiro, que é um dos principais constrangimentos do governo hoje. A questão dos juros, do câmbio”, disse Roncaglia. “Acho que Haddad [ministro Fernando Haddad, da Fazenda] ‘caminhou neste gelo fino’ para que a gente tenha pelo menos algum arcabouço fiscal aprovado”.
Roncaglia que a proposta do ministro mantém nos limites do arcabouço eventuais despesas do governo para capitalizar bancos públicos. Isso pode limitar ações de governo para expandir o crédito, por exemplo.
Para o professor, isso foi feito para viabilizar a aprovação do arcabouço no Congresso. “Eu achei que a inclusão dos bancos públicos na regra desnecessária. Ela constrange demais as possibilidades do BNDES e Caixa atuarem de maneira significativa.”
Edição: Rodrigo Durão Coelho