As 400 cadeiras do auditório da Procuradoria-Geral do Trabalho (PGT), em Brasília, foram ocupadas no seminário sobre trabalho digno em frigoríficos realizado nos dias 19 e 20 de abril. A atividade marca os 10 anos da Norma Regulamentadora nº 36, conhecida como "NR dos Frigoríficos", que regula o setor.
Além de faixas e bandeiras cobrando grandes empresas do setor, como BRF e JBS, tiveram destaque as camisetas verdes usadas por trabalhadores em memória do sindicalista Siderlei de Oliveira, referência na luta nacional e internacional em defesa da NR 36, uma conquista alcançada pelo movimento sindical em 2013.
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O presidente da Confederação Brasileira Democrática dos Trabalhadores da Alimentação (Contac-CUT), Nelson Morelli, criticou o governo de Jair Bolsonaro (PL) em referência à destruição dos direitos e às investidas para alteração de normas regulamentadoras no país, como a NR 36.
"O governo anterior representou muitas destruições nos direitos trabalhistas. Foram inúmeras mobilizações para barrar qualquer alteração nas normas. Não se pode mexer naquilo que foi bom para a classe trabalhadora. A NR 36 é uma construção coletiva envolvendo entidades sindicais e órgãos públicos pensando na saúde dos trabalhadores. Ela teve na figura de Siderlei um exemplo de luta como sindicalista, legado esse que seguimos em defesa de nossas conquistas por condições dignas de trabalho", afirmou.
O sindicalista uruguaio Gerardo Iglesias, secretário regional da Regional Latinoamericana da União Internacional do Trabalhadores da Alimentação (Rel-Uita), trouxe à memória lutas locais que se desdobraram em ações nacionais e internacionais.
"Organizamos boicotes em fábricas, lutamos nos frigoríficos, nas ruas, fizemos congressos e participamos de seminários mundiais para defender a NR 36, que se tornou um patrimônio do movimento sindical", destacou.
Dignidade e humanização
São muitas as situações a serem resolvidas em relação ao trabalho digno em frigoríficos, como as pausas térmicas, as pausas psicofisiológicas e a subnotificação constante no setor, apontou o procurador do Ministério Público do Trabalho, Lincoln Cordeiro.
"Existem ausências de comunicação de acidentes de trabalho e vivenciamos hoje um movimento de retirada do pagamento da insalubridade dos trabalhadores, como se a gente pudesse acreditar que nos frigoríficos não houvesse ambientes insalubres. A permanência da NR 36 é um um ato de resistência dos trabalhadores."
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Para o ministro do Tribunal Superior do Trabalho (TST), Alberto Bastos Balazeiro, a NR 36 garantiu a dignidade da classe trabalhadora no segmento da indústria frigorífica.
"Existem desafios como o de impedir modificações deletérias que alterem a essência da NR 36 e também de implementar a norma, ou seja, fazer com que as condições de trabalho previstas na norma sejam executadas, com pausas, com segurança, com saúde, com ergonomia no sentido macro, não apenas de intervalo, de mobiliário, mas em outro sentido. Fazer com que a organização do trabalho corresponda ao meio de produção, mas também ao meio de dignidade e de vida", afirma.
Com uma experiência de 15 anos em frigoríficos, Gisele Adão, ativista LGBT+, falou igualmente sobre a importância de promover a defesa dos direitos humanos nos locais de trabalho.
"A NR 36 é a humanização da linha de produção. Existe vida atrás do pacote. E nós, mulheres, sabemos o peso da dupla jornada que nos impacta. A norma permite um momento de descanso, de sossego, mas não se resume às pausas, existe um corpo todo de direitos. Com a norma, você pode ir ao banheiro e tem um ambiente adaptado às pessoas e não às máquinas. Essa norma transformou vidas", disse.
Edição: Nicolau Soares