O Brasil tem vivenciado diversos casos de ataques e ameaças a estudantes, professores e escolas neste último mês de abril como no caso da Escola Estadual Thomazia Montoro em São Paulo e da creche de Blumenau. No Distrito Federal, ameaças foram registradas em diversas escolas das regiões administrativas e até mesmo na Universidade de Brasília, o que levou as autoridades da Câmara Legislativa, da Secretaria de Segurança Pública e da Secretaria de Educação a se mobilizarem.
Na segunda-feira (24), o deputado Gabriel Magno (PT) realizou uma audiência pública com professores, estudantes e representantes do poder público do DF para debater a violência contras as escolas e afirmou que essa violência contra as escolas não nasce dentro delas.
“Faz muita diferença entender que a escola virou uma vítima, um alvo de um ataque muito organizado, de grupos extremistas inclusive, de ódio, que nós vimos crescer no mundo inteiro nos últimos anos, no Brasil também, que elegeu a escola como esse espaço de ataque. A violência que nós estamos vendo nos últimos anos e nas últimas semanas com muita preocupação não nasce no seio da escola e dentro da escola, não é a escola que produz. Pelo contrário, a escola tem a capacidade de produzir o antídoto, de produzir a solução e talvez por isso ela virou alvo”, disse.
:: Enfrentamento ao discurso de ódio e a violência foram temas de audiência pública ::
Em entrevista ao Brasil de Fato DF a professora da Faculdade de Educação da Universidade de Brasília e integrante da Campanha Nacional pelo Direito à Educação, Catarina de Almeida, explica como se configuram esses atos violentos.
“Esse tipo de violência contra as escolas são atos executados por adolescentes e jovens que geralmente participam de subcomunidades ou tem algum vínculo com esses grupos extremistas que atuam contra pessoas, estudantes, professores e professoras, buscando matá-los ou feri-los de alguma forma. Então são esses atos em que esses estudantes vão para a escola planejando executar ataques na tentativa de ferir e matar pessoas dentro da escola”, afirma.
A professora é uma das autoras do Relatório "O extremismo de direita entre adolescentes e jovens no Brasil: ataques às escolas e alternativas para a ação governamental", publicado pela Campanha Nacional pelo Direito à Educação em dezembro de 2022.
Catarina também aponta que, além da pandemia, muitos fatores contribuem para esse aumento da violência de estudantes dentro das escolas. Um dos aspectos da pesquisa que desenvolve aponta vínculos entre o crescimento do discurso de ódio e das práticas de extremismo no Brasil, com o armamento da população e da perseguição à instituição escolar.
“Esses projetos nos últimos anos são voltados para atacar escolas no que se refere aos seus conteúdos, às suas professoras e seus professores. E a questão da pandemia, quer dizer, não só esses jovens ficaram mais expostos e mais em contato com a internet, com as redes e de alguma forma com essas subcomunidades, como também ficaram sem socialização, com processo de maior isolamento, importante para essa faixa etária. Ficaram mais expostos a vários tipos de violências e a pandemia acontece junto com várias outras questões problemáticas da nossa sociedade que favorecem o processo de adoecimento psíquico”, disse.
Luciana Custódio, diretora do Sindicato dos Professores do Distrito Federal (Sinpro-DF), afirma que uma das causas dessa violência é a legitimidade de discursos de ódio na sociedade, causados por intolerância às diferenças.
“Obviamente que a escola não é um espaço que se organiza de forma separada da sociedade, então se tem violência na escola é porque tem violência na comunidade que ela está inserida e a escola é um protótipo da sociedade. Então se tem um discurso de violência imperando na sociedade, ele vai ser reproduzido no ambiente escolar”, observa.
Militarização?
O projeto de militarização das escolas implementado em unidades de ensino durante o primeiro mandato do governador Ibaneis Rocha (MDB), em 2019, prevê uma gestão compartilhada entre a Secretaria de Educação do DF (SEEDF) e a Polícia Militar do DF (PMDF). Uma das justificativas para o projeto é de que a disciplina militar diminuiria a violência nas escolas.
“Infelizmente a alternativa que o governo encontrou aqui no DF foi uma alternativa ainda aliada com o governo federal que é o de militarizar as escolas. Essa solução para tentar coibir a situação de violência é uma alternativa falaciosa e mentirosa com a própria população, porque se tem violência nas escolas é porque tem violência na comunidade em que a escola está inserida. O que a gente precisa é criar um sistema de proteção em nível de políticas públicas”, destaca Luciana Custódio.
:: Militarização de escolas do DF não melhora desempenho escolar nem diminui violência ::
O que fazer?
Questionada acerca dos últimos casos, a Secretaria de Justiça e Cidadania do Distrito Federal afirmou em nota que “a educação é um direito inalienável de todas as crianças e adolescentes e deve ser garantido em colaboração com o Estado, a família e a sociedade como um todo” e que “é essencial que os pais se permitam ouvir seus filhos quanto aos medos e inseguranças, e que possam contar com o apoio do Estado para garantir sua segurança e acesso ao sistema de garantias de direitos”.
A professora Catarina de Almeida salienta a importância do diálogo entre escola e comunidade e dos acompanhamento por pais e responsáveis ao que as crianças e adolescentes têm consumido na internet.
“No âmbito da família, para as famílias que têm condições, é muito importante olhar a mudança de comportamento no perfil do jovem ou do adolescente, acompanhar o que ele está acessando, o que ele tem lido, ter uma relação muito dialogada sem muitos segredos com seus filhos. E esse diálogo entre escola e família também é importante, a escola vai precisar ter condições de infraestrutura para desenvolver projetos com conjunto de profissionais de diversas áreas atuando para lidar com questões apresentadas pelos jovens e adolescentes”, destacou.
Luciana Custódio acredita que além disso, o governo deve monitorar e combater as fake news.
“É importante demais que a Secretaria de Segurança Pública e essas outras secretarias e o governo tenham uma ação efetiva de monitoramento das fake news senão a gente vai criar um ambiente que ao invés da gente criar uma política de combate à violência, a gente vai estar potencializando a violência nas escolas".
Outra situação apontada como alternativa pela diretora do Sinpro é que o governo distrital implemente uma educação em turno integral, oferecendo turno contrário, com atividades de educação artística de educação física, educação musical. "Nós não somos contra policiais nas escolas, mas nós queremos os policiais como nós tínhamos antes no batalhão escolar, que tem uma perspectiva pedagógica e uma perspectiva preventiva”, afirmou.
No dia 13 de abril, a Secretaria de Segurança Pública do DF junto com a Secretaria de Educação apresentaram um plano de segurança para as escolas. As ações envolvem o reforço no efetivo policial, a participação de vigilantes e o monitoramento da deep web e perfis em redes sociais que fazem apologia à violência nas instituições de ensino. Além disso, haverá pontos de observação, em locais definidos a partir de estudos realizados pelas secretarias, para elencar as unidades que demandam maior cuidado.
Como denunciar?
Para denunciar, a Secretaria de Segurança Pública indicou encaminhar vídeos, imagens, áudios, prints de mensagens em redes sociais e números de telefone e nome de perfis envolvidos pelo site pcdf.df.gov.br, no e-mail [email protected] , pelo número de telefone 197 ou whatsapp (61)98626-1197.
O Ministério da Justiça e Segurança Pública também criou um canal de denúncias, é o Escola Segura, para reportar o endereço (URL) de conteúdos publicamente disponíveis na web com ameaças de ataque às escolas e à comunidade escolar.
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Fonte: BdF Distrito Federal
Edição: Flávia Quirino