Quando Luiz Inácio Lula da Silva olhar para os lados na Abadia de Westminster, em Londres, na cerimônia de coração de Charles 3º neste sábado (6), ele não encontrará muitos outros líderes do Sul Global. Com o Brasil tendo fricções com os EUA por visões diferentes sobre a guerra na Ucrânia e sua relação com a China, o presidente brasileiro busca construir mais pontes, afirma pesquisadora ouvida pelo Brasil de Fato.
Nesta sexta-feira (5), Lula encontrou o primeiro-ministro britânico, Rishi Sunak, que prometeu um investimento de cerca de R$ 500 milhões no Fundo Amazônia, um projeto de preservação ambiental da maior floresta tropical do mundo. Já no sábado, a programação é acompanhar a cerimônia que ungirá Charles III como novo monarca.
De acordo com informações da DW, Lula participará após a coração de uma cerimônia com outros dez líderes mundiais, como o chanceler federal alemão, Olaf Scholz, e o presidente francês, Emmanuel Macron. Existe também a possibilidade de que o Reino Unido apoie a candidatura do Brasil para sediar a COP30 em Belém, em 2025.
Lula será o único presidente do Brics no evento, o bloco formado por Brasil, Rússia, China, Índia e África do Sul. Outras lideranças da América Latina, como os presidentes de Argentina e México, tampouco estarão presentes.
Inclusive, a guerra envolvendo um dos países do bloco econômico é um dos assuntos candentes da política internacional do momento. A invasão da Ucrânia pela Rússia afetou a diplomacia mundial e a posição do Brasil desagrada os Estados Unidos. Com a visita ao Reino Unido, o país busca construir pontes com diversos atores em meio à tensão crescente na geopolítica global, afirma Karen dos Santos Honório, professora de Relações Internacionais da Universidade Federal da Integração Latino-Americana (UNILA).
"O Brasil joga em vários tabuleiros ao mesmo tempo. O Lula sabe que é importante, principalmente nesse contexto, esse aceno ao Ocidente. E não é só importante de uma forma simbólica em relação à posição do Brasil na guerra da Ucrânia, passa por isso também, mas passa muito mais pela visão pragmática de que para o Brasil ser um ator relevante e conseguir seus objetivos no cenário internacional, ele também precisa contar com o apoio, ou estabelecer relações pragmáticas e produtivas para o próprio país, com esses atores [ocidentais]", diz Honório.
A posição de Lula sobre a guerra da Ucrânia já foi criticada em um tom acima do comum para a diplomacia. Após o ministro das Relações Exteriores da Rússia, Serguei Lavrov, ser recebido pelo seu homólogo brasileiro, Mauro Vieira, no Itamaraty, os Estados Unidos responderam.
John Kirby, porta-voz do Conselho de Segurança Nacional da Casa Branca, afirmou que "o Brasil está papagaiando a propaganda da Rússia e da China sem olhar para os fatos" e tem uma postura "profundamente problemática".
A porta-voz da Casa Branca, Karine Jean-Pierre, também endossou coro ao afirmar em coletiva que a posição de Lula "não é neutra" e que o tom da coletiva de Lavrov e Vieira teria sido chocante.
Nesse cenário tenso, a professora da Unila lembra que o Brasil busca se equilibrar e conseguir vantagens na disputa global entre China e Estados Unidos. E o Reino Unido é uma parada importante porque os britânicos são apoiadores "históricos" da petição brasileira por um assento permanente no Conselho de Segurança da ONU — outro ponto recorrente das falas de Lula durante suas viagens internacionais.
"A política externa brasileira do governo Lula 3.0, que foi também a política durante o primeiro e segundo governo, é multidimensional quando a gente pensa em atores do cenário internacional. Tem seu eixo e diretriz muito focado nos parceiros e nas parcerias Sul-Sul, mas não deixa de lado parceiros mais tradicionais, ou do primeiro mundo", afirma Honório.
Edição: Patrícia de Matos