RELAÇÕES DE PODER

Temer e Bolsonaro entregaram a chave do cofre e toma lá dá cá com Congresso ficou mais caro

Governo Lula precisa de um misto de criatividade, pressão popular e articulação bem feita para negociar com parlamento

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“O ‘é dando que se recebe’ ficou mais caro, por conta do empoderamento do Congresso, por conta do país que ficou devastado e precisa ser reconstruído, e por conta também do Congresso muito mais à direita, que tem mais margem de manobra para se relacionar com o Executivo, acho que em alguma medida isso tem que ser atendido. Não tem que fazer jogo duro e começar a levar invertida no legislativo, porque isso pode se consumar em derrotas”, comentou o cientista político Cláudio Couto, professor do departamento de gestão pública da FGV-SP, convidado do terceiro episódio da terceira temporada do podcast Três por Quatro.

Couto falou também sobre a dificuldade do novo governo do presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) em negociar com senadores e deputados. Ele explica que há um impasse, já que, atualmente, o Congresso é muito mais poderoso do que foi em suas primeiras gestões. Couto afirma que o Executivo perdeu a “capacidade de pautar a agenda do legislativo, até porque muito dessa capacidade vinha de um certo controle que o governo tinha sobre o orçamento, e aí podia condicionar a liberação de recursos à conduta dos parlamentares”.

João Pedro Stédile, economista e liderança do Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra (MST), confirma e aponta para a pressão interna contra o novo governo Lula. “É público e notório que o governo não tem tido capacidade de articulação política, ou seja, os ministros do Planalto estão falhando. Não têm tido capacidade de ir lá no Congresso e articular, ou pelo menos anular a direita. Eles ficaram jogando como se fosse o mundo republicano: o governo faz sua parte, o congresso faz a deles”, ponderou.

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Nas últimas semanas, matérias importantes para o Governo Federal ficaram empacadas em Brasília, como o Projeto de Lei 2630/2020, conhecido como PL das Fake News, que foi retirado de pauta; a indicação de Lula ao Supremo Tribunal Federal, que ainda não saiu do papel; e a derrota no decreto do saneamento no Congresso. 

“É de fora pra dentro que você consegue de alguma forma produzir isso. E mesmo assim, com sutileza, porque se de alguma forma o governo passar a impressão de que está jogando o seu grupo contra os seus congressistas, de novo, tem troco. A gente não está falando de amadores, estamos falando de políticos profissionais que sabem jogar esse jogo, que não vão simplesmente ceder a qualquer tipo de pressão”, afirma Couto.

Stédile apontou as expectativas para o fim deste imbróglio: “O que está faltando é o governo tomar a iniciativa de propostas concretas e colocar a direita e a extrema-direita na defensiva. Agora, quem tá agindo na ofensiva é a direita e a extrema-direita, e o governo fica reagindo apenas”.

Entretanto, Couto pondera sobre o risco de retaliação que o governo poderia sofrer, isto, caso tentasse se impor arbitrariamente contra a ala mais conservadora do Congresso Nacional. Para ele não se trata de uma questão moral, e sim de uma questão política, de relações de poder.

A relação entre Congresso Nacional e Governo Federal é importante para uma boa gestão do novo governo Lula, mas, segundo Stédile, o governo não pode ficar refém do que se decide no Congresso. O economista adverte do compromisso que o governo tem com a população e os movimentos sociais, e da necessidade de organizar propostas concretas que enfrentem os problemas do povo, tais como o desemprego, a renda, a industrialização do país e a construção de casas.

Couto lembra que não é possível ignorar a forte presença da oposição no atual governo. Segundo o professor, os políticos de direita e extrema-direita do país têm poder para fazer barulho e vão criar embaraços muitas vezes, como ocorreu, por exemplo, com a instalação da própria CPI do MST.

A grande aposta do governo Lula para este primeiro semestre de 2023, é a aprovação do projeto de Arcabouço Fiscal. O cientista político se mostra otimista quanto à aprovação da matéria e acredita que a mesma deve passar apenas com algumas modificações.

O podcast Três por Quatro é apresentado por Nara Lacerda e Igor Carvalho, que atuam na equipe de jornalismo do Brasil de Fato. Novos episódios são lançados toda sexta-feira pela manhã.

 

Edição: Rodrigo Gomes