Três homens foram executados nesta sexta-feira (19/05) no Irã, acusados de envolvimento na morte de membros das forças de segurança durante protestos que ocorrem no país desde setembro do ano passado, devido à morte da jovem Jina Mahsa Amini, conforme informações do Poder Judiciário.
Majid Kazemi, Saleh Mirhashemi e Saeed Yaghoubi foram condenados por "moharebeh", ou "guerra contra Deus", por terem sacado uma arma durante uma manifestação, em novembro, na cidade de Isfahan, divulgou o site do Mizan Online, ligado ao Judiciário.
As autoridades afirmaram que os homens mataram dois integrantes da força paramilitar Basij e um oficial. O trio foi preso em seguida e condenado à morte em janeiro deste ano.
Os homens também foram acusados de integrar "grupos ilegais com a intenção de desestabilizar a segurança nacional e de conspiração, o que levou a crimes contra a segurança interna", publicou o Mizan Online.
O website também escreveu que "provas e documentos sobre o caso e que as flagrantes declarações feitas pelos acusados" mostram que "os disparos realizados pelos três homens levaram ao martírio de três integrantes das forças de segurança".
Confissão sob tortura
Grupos de defesa dos direitos humanos, como a Anistia Internacional, afirmam que os três homens foram submetidos a tortura, forçados a confissões em vídeo e não tiveram acesso a um procedimento jurídico adequado.
Kamran Matin, professor sênior de relações internacionais da Universidade de Sussex, no Reino Unido, disse à DW que o julgamento dos homens foi típico das características do sistema jurídico do Irã.
"Os réus não nomearam seus próprios advogados. Mas esse é um procedimento padrão, especialmente quando envolve crimes políticos… Geralmente, a principal prova é a confissão, que muitas vezes é feita em circunstâncias suspeitas ou sob tortura", afirmou Martin.
O professor acrescentou ainda que um arquivo de áudio, no qual um dos homens diz que eles haviam confessado os crimes devido aos maus-tratos sofridos nas mãos das autoridades iranianas, foi contrabandeado para fora da prisão.
Na quinta-feira, o Departamento de Estado dos EUA pediu ao Irã que não realizasse as execuções. Um dia antes, por meio de uma nota escrita à mão, os três homens fizeram um apelo público para que não fossem executados: "Não deixem que nos matem".
Alemanha e EU condenam execuções
O Ministério das Relações Exteriores da Alemanha condenou as execuções: "O governo federal rejeita a pena de morte em todas as circunstâncias. Seguimos pedindo ao Irã que suspenda imediatamente essa forma desumana, cruel e degradante de punição", disse um porta-voz à agência alemã de notícias dpa nesta sexta-feira.
A União Europeia (UE) fez declaração semelhante. Um porta-voz pediu às autoridades iranianas "que parem imediatamente com a prática de impor e executar sentenças de morte contra manifestantes, o que deve ser fortemente condenado".
No Twitter, a comissária de direitos humanos de Berlim, Luise Amtsberg, expressou sua consternação: "Mais uma vez, o regime do Irã tirou a vida de três manifestantes. Mais uma vez, executou pessoas que defendiam a liberdade. Mal consigo encontrar palavras para descrever a escalada da violência e de execuções em massa".
A Anistia Internacional também se manifestou no Twitter: "Estamos profundamente chocados com esse ato flagrante de vingança do governo iraniano contra a valente geração de manifestantes no Irã".
Protestos desde setembro
As maiores manifestações em décadas eclodiram no Irã em setembro de 2022, depois da morte sob custódia da jovem Jina Mahsa Amini, uma curda iraniana de 22 anos que havia sido presa pela polícia da moralidade do Irã acusada de ter "usado de forma inapropriada" o véu islâmico.
As autoridades disseram que a jovem sofreu um ataque cardíaco, mas testemunhas afirmam que ela foi severamente espancada e morreu em decorrência da brutalidade policial.
Os protestos rapidamente se espalharam e se transformaram em pedidos de derrubada da teocracia que governa o Irã desde a Revolução Islâmica de 1979.
O sistema político iraniano é uma complexa combinação de autoridade clerical xiita e presidente e parlamento eleitos. O presidente cuida das questões governamentais do dia a dia, mas se orienta pelo profundamente antiocidental aiatolá Ali Khamenei.
Um órgão de vigilância composto por clérigos e juristas – alinhado ao líder supremo e inclinado a drásticas restrições políticas e sociais – tem o poder de vetar leis e decidir quem pode concorrer a cargos políticos.
Devido à onda de protestos em diversas cidades, Teerã lançou uma forte repressão por meio das forças de segurança, rotulando as manifestações como "tumultos" instigados por estrangeiros.
Milhares de iranianos foram presos e centenas foram mortos, inclusive dezenas de membros das forças de segurança. Grupos de direitos humanos afirmam que o Irã executou quase 600 pessoas somente em 2022, quase o dobro das 333 no ano anterior.
Neste ano, principalmente nas últimas semanas, mais de 200 pessoas foram executadas, conforme informações da Organização das Nações Unidas (ONU).
O crescimento da pena de morte, inclusive por acusações vagas, como "inimizade contra Deus" e "disseminação da corrupção na Terra", tem sido amplamente criticado.
Em grande parte, as manifestações diminuíram, embora ainda haja atos esporádicos, incluindo a recusa de algumas mulheres em usar o véu islâmico obrigatório.
gb (AFP, Reuters, dpa)