Quando esse indicador é alto, ele pode ser revelador também papel da mulher na sociedade
Neste domingo, 28 de maio, o Brasil completa 14 anos do ato que instituiu a data como Dia Nacional de Redução da Mortalidade Materna com um desafio significativo: superar o alto crescimento do problema nos anos de pandemia da covid-19.
Segundo alerta do Fundo de População da Organização das Nações Unidas (UNFPA/ONU), em 2021, a taxa de mortalidade materna para cada 100 mil nascidos vivos foi superior a 107. A alta é quase o dobro, mais de mais de 94% em comparação a 2019, ano anterior à emergência sanitária global, quando o resultado chegou a 57 para 100 mil partos.
O parecer da ONU foi realizado com base em dados mapeados pelo Observatório Obstétrico Brasileiro do Ministério da Saúde (MS). Uma outra pesquisa da entidade observou que o cenário pode ser ainda pior, por causa da subnotificação.
De acordo com o estudo, o total de mortes de gestantes e puérperas registradas entre 2019 e 2021 foi 35% superior ao divulgado pelo governo no período. São casos que não foram considerados como parte das categorias determinadas pela Classificação Internacional de Doenças para a morte materna.
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São realidades que distanciam o Brasil ainda mais do cumprimento dos Objetivos de Desenvolvimento Sustentável do Milênio. A meta é diminuir a mortalidade materna para no máximo 30 falecimentos a cada 100 mil nascido até 2030.
Marcos Nakamura, pesquisador e obstetra do Instituto Nacional de Saúde da Mulher, da Criança e do Adolescente Fernandes Figueira (IFF/Fiocruz) e presidente da Comissão de Mortalidade Materna da Federação Brasileira de Obstetrícia (Febrasco) afirma que os números podem dizer muito sobre a realidade das mulheres e do próprio país.
“Quando esse indicador é alto, ele pode ser revelador também papel da mulher na sociedade. Situações de inequidade e dificuldade de acesso a determinados grupos de mulheres - seja devido à raça, cor ou renda - são reveladoras da situação do próprio país. Por isso, a mortalidade materna é um indicador utilizado pela Organização Mundial da Saúde e pelas Nações Unidas para o conhecimento das desigualdades nos países.”
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Segundo o médico, o Brasil viu a mortalidade materna diminuir consideravelmente a partir da década de 1990. A mudança foi fruto direto da criação do Sistema Único de Saúde (SUS). A partir do início deste século, o ritmo do avanço começou a estacionar, também caminhado junto com as dificuldades enfrentadas pelo SUS.
“As dificuldades em se reduzir a mortalidade materna começaram a se apresentar, ainda que avanços tenham ocorrido nas décadas de 2000 e 2010, por exemplo, praticamente a universalização do pré-natal. Hoje, temos uma cobertura do pré-natal de 98 a 99% da população. Porém, ainda temos dificuldades em cumprir o número adequado de consultas, o início do pré-natal precoce, além de uma dificuldade em ter um pré-natal de melhor qualidade, com acesso a todos os exames necessários.”
Nakamura afirma que há uma expectativa de queda na mortalidade materna em 2022, que ainda tem dados a serem divulgados. Ele ressalta que mesmo se declínio for confirmado, o Brasil precisa aprender lições com a pandemia.
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“A pandemia descortinou vários problemas na atenção obstétrica. A falta de leitos de unidade intensiva específicos para obstetrícia, dificuldades no transporte dessas mulheres dos locais de parto para unidades maior suporte clínico. Esses problemas foram mostrados muito fortemente na pandemia e devemos usar os recursos empregados e reverter para a atenção obstétrica no intuito de melhorar os próximos anos.”
O médico pontua que não é possível mudar essa realidade sem investimentos e recursos públicos em profissionalização, estrutura, tecnologia e insumos. Nakamura também cita a necessidade de mudanças legislativas e de aceitação por parte da população, especialmente na questão do aborto. Ele defende que o debate sobre a mortalidade precisa se ampliar e englobar a necessidade de valorização do papel da mulher na sociedade.
Edição: Rodrigo Durão Coelho