Na noite deste domingo (28), o presidente dos Estados Unidos, o democrata Joe Biden, anunciou em coletiva de imprensa que ele e Kevin McCarthy, o líder republicano da maioria na Câmara, chegaram a um acordo sobre o aumento do Teto da Dívida do país. O entendimento agora precisa passar pela Câmara e pelo Senado, mas muitos republicanos mais à direita e democratas mais à esquerda estão descontentes com o texto. Os riscos são grandes: segundo o Departamento do Tesouro, no dia 5 de junho os EUA devem ficar sem dinheiro para honrar com seus compromissos, o que levaria a um calote com consequências econômicas severas e a nível global.
O Teto da Dívida é um artifício legal criado em 1917, nos EUA, para regular quanto dinheiro o governo federal pode pegar emprestado para arcar com os custos do Estado. De lá pra cá, esse teto já foi aumentado mais de 100 vezes, saindo dos US$ 11,5 bilhões originais para os US$ 31,4 trilhões atuais. De 1929 até hoje, todos os presidentes tiveram que aumentar a dívida para assegurar que o país não desse um calote, uma vez que os gastos do governo americano são superiores à arrecadação.
Apesar do Departamento do Tesouro ter dado o prazo do 1º de junho, e depois atualizado para 5 de junho, o país já atingiu o Teto da Dívida em janeiro. De lá pra cá, o governo estadunidense está sobrevivendo de manobras financeiras para conseguir arcar com todos os pagamentos.
Com uma Câmara dos Deputados controlada, ainda que por uma maioria apertada, pelo Partido Republicano, a Casa Branca teve que jogar todos os esforços na negociação com a oposição. O tema levou, inclusive, ao cancelamento de paradas de Joe Biden durante a viagem ao encontro do G7, no Japão.
O que estava na mesa nas negociações?
O objetivo dos republicanos era claro: cortar gastos, sobretudo em programas sociais como o Medicaid, programa público de saúde que foi expandido no governo Obama e reduziu o número de adultos sem plano de saúde de 46,5 milhões em 2010 para 26,7 milhões em 2016. Donald Trump, que disputará as primárias para tentar ser novamente candidato à presidência pelos republicanos, fez um apelo para que os membros do partido não aceitassem nenhuma proposta que não garantisse 100% das exigências.
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Por outro lado, os democratas querem liberdade para gastar, principalmente às vésperas da eleição do ano que vem e com um presidente com baixa popularidade.
A proposta, que deve ser votada na Câmara na quarta-feira, aumenta o teto da dívida em US$ 4 trilhões até 2025, depois da eleição presidencial. Como contrapartida, o governo terá um limite de gastos que só não valerá para a área de Defesa e para gastos com veteranos do exército.
O projeto também cria exigências de trabalho para determinados grupos que recebem programas sociais, como Medicaid e Food Stamps (uma espécie de vale refeição do governo para pessoas de baixa renda). Por fim, o texto exige que verbas não gastas com o combate da covid-19 sejam devolvidas.
Recepção difícil
Após o anúncio do acordo, republicanos e democratas mais distantes do centro começaram a protestar. Nesta segunda (29), feriado de Memorial Day nos Estados Unidos, a mídia só quer saber se o plano vai, ou não, passar pela Câmara e pelo Senado, lembrando que o próprio Kevin McCarthy teve grandes dificuldades em se eleger como presidente da Câmara por conta de desentendimentos dentro do próprio Partido Republicano.
Em entrevista hoje à CNN, a deputada democrata Pramila Jayapal afirmou que não sabe se vai votar a favor proposta por preocupações com cortes de gastos em programas sociais. "É uma política péssima", afirmou. E Jayapal não é uma deputada qualquer, mas sim a líder da Bancada Progressista na Câmara, a maior do Partido Democrata, que reúne os congressistas mais à esquerda e conta com 100 deputados e deputadas.
Perguntada pelo jornalista Jake Tapper se os democratas da ala moderada, inclusive na Casa Branca, deveriam se preocupar com o voto da Bancada Progressista, a deputada afirmou que sim.
Do lado republicano, nomes da Bancada da Liberdade, que conta com 45 deputados e reúne alguns dos parlamentares mais à direita do partido, alinhados com Donald Trump, também começaram a criticar publicamente o acordo. "Eu não vou apoiar este acordo, é um acordo ruim", disse pelo twitter o deputado do Texas Chip Roy.
No entanto, Kevin McCarthy garantiu, em entrevista à FOX News, que 95% dos republicanos votarão pela aprovação do plano que, segundo ele, não dá nada aos democratas.
Biden, na coletiva de imprensa, não chegou a comemorar o acordo como uma grande vitória, mas afirmou que o importante era garantir que o país não desse um calote, e que nenhum dos dois lados tinha saído com tudo o que queria. "Essa é a responsabilidade de governar", disse o presidente.
Edição: Nicolau Soares