LUTA SOCIAL

Por direito à moradia, famílias ocupam prédio abandonado há cinco anos em Porto Alegre (RS)

Organizada pelo Movimento de Lutas nos Bairros, Vilas e Favelas (MLB), ocupação Sepé Tiaraju abriga 80 famílias

Brasil de Fato | Porto Alegre (RS) |
Espaço estava subutilizado há quase cinco anos na região central de Porto Alegre (RS) - Foto: Divulgação/ Instagram

"Estou aqui porque preciso de moradia, estou ocupando meu espaço. Sou uma pessoa que trabalho. Estou aqui lutando para conseguir um cantinho para mim”, afirma Jair Martins, 55 anos. Organizadas pelo Movimento de Lutas nos Bairros, Vilas e Favelas (MLB), cerca de 80 famílias ocuparam um prédio federal localizado nas proximidades do centro de Porto Alegre abandonado há mais de cinco anos. De acordo com o MLB, as famílias alocadas na ocupação viviam em condições precárias, muitas vezes sem saneamento básico.

Antes da ocupação Jair morava de aluguel, o valor elevado, segundo ele, consumia praticamente todo seu orçamento. “Não dá nem para eu comprar um brinquedo para meus filhos, uma roupa para mim. O aluguel me tira todos os direitos de pagar até minha água, minha luz e não sobra nada do meu salário mínimo. Eu preciso de uma casa de um cantinho, dai vai me sobrar dinheiro e vou poder comprar as coisas que necessito. Por isso estou aqui tentando a sorte”, declara Jair. 

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A moradora e uma das coordenadoras da ocupação, Analise Thomaz também destacou a questão do aluguel. “Eu tenho 24 anos e ainda morava com meu pai, tentei pagar aluguel e não rolou, os alugueis custavam cerca de R$ 800, na Vila Jardim. Não tem como a gente ficar pagando isso. Sem dizer que estou desempregada há um ano e seis meses e não consigo emprego de jeito nenhum. É um inferno, mulher, negra conseguir emprego no Brasil é uma batalha diária”, desabafa. 

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Segundo levantamento do Sindicato da Habitação do Rio Grande do Sul, o preço do aluguel em Porto Alegre atingiu a maior alta dos últimos nove anos. De acordo com a entidade é a maior alta desde 2014, quando o aumento chegou a 11,93%. 


Jair e Analise estão entre as pessoas que ocuparam o prédio abandonado em Porto Alegre / Foto: Jorge Leão

O prédio, que levava o nome de Edifício Alles, tem 2,3 mil metros quadrados e era usado pela Emater, ligada ao Ministério da Agricultura. Em 2022, chegou a entrar em um feirão de imóveis lançados pela União, em que o governo não dava valor de venda, mas aguardava por propostas de possíveis interessados.

“Estamos aqui, ocupando esse espaço que estava subutilizado há quase cinco anos, que estava sendo usado como depósito da Emater e como garagem para um carro. Todo mundo precisa ter onde morar, todo mundo precisa ter o que comer, todo mundo precisa ter seus direitos básicos respeitados e eles não estão fazendo isso", afirma a coordenadora. 

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De acordo com Analise, no momento o espaço está sendo organizado. O local já conta com uma cozinha e espaços como creche e dormitórios.


O local já conta com uma cozinha e espaços como creche e dormitórios / Foto: Jorge Leão

Pelo direito à moradia digna 

"O direito à moradia é garantido pela Constituição Federal. A lei também diz que toda a propriedade tem que ter uma função social, ou seja, não deve ficar sem uso. E é em nome deste direito que as famílias ocuparam o espaço", ressalta o coordenador estadual do MLB, André Luis Ferraz.

Segundo André, a ocupação vem pra denunciar a falta de moradia do povo brasileiro. "A gente vem pra dar função social ao que é abandonado e fazer com que o direito constitucional à moradia seja cumprido. Enquanto morar for um privilegio a gente entende que ocupar é um direito nosso.

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Conforme ressalta o MLB, a ocupação nasce em um momento que o déficit habitacional no Rio Grande do Sul atinge mais de 220 mil famílias. O estudo "Déficit Habitacional e Inadequação de Moradias no Brasil", publicado em 2021 pela Fundação João Pinheiro (FJP), mostra que o déficit é de 220.927 domicílios no estado. Destas, 65.275 vivem em habitações precárias, 34.073 em coabitação e 121.579 em ônus excessivo com aluguel.

Dados do Departamento Municipal de Habitação (Demhab) apontam que há hoje em Porto Alegre mais de 60 mil famílias em programas habitacionais. E mais de 84 mil pessoas vivendo em 142 áreas de risco, mostra levantamento do Serviço Geológico do Brasil em parceria com a Prefeitura de Porto Alegre. 


"Enquanto morar for um privilegio a gente entende que ocupar é um direito nosso", afirma André Luis Ferraz / Foto: Jorge Leão

Sepé Tiaraju

O nome escolhido para a ocupação resgata o legado do líder indígena e revolucionário Sepé Tiaraju, que conforme destaca o movimento, lutou contra os reinos de Portugal e Espanha, resistindo à invasão das terras brasileiras pertencentes aos povos originários.

“Na nossa ocupação temos companheiros indígenas que estão lutando para não ter o marco temporal, lutando para ter a ocupação da cidade, para conseguirem ter acesso a estudo, acesso a vida na cidade, assim como manter seu estilo de vida na retomada”, destaca Analise. 


Fonte: BdF Rio Grande do Sul

Edição: Katia Marko