A gente mostra a importância do audiovisual como ferramenta de luta do nosso povo
"Utilizando o que tem de moderno, para fortalecer o que tem de ancestral". O lema da Ororubá Filmes demonstra o porquê de a realização da juventude indígena Xukuru de Ororubá ser tão precursora no Brasil. O co-fundador, Diego Xukuru, conta que a ideia parte de ter entendimento do audiovisual como uma ferramenta de luta não só para o seu povo.“Também para os todos os indígenas do Nordeste, do Brasil e também para os movimentos sociais em geral”.
O motivo, segundo ele, é que “as grandes mídias sempre favorecem e mostram o diálogo do que é de interesse dela, do ‘sistema’. E muitas vezes a realidade de cada povo indígena nunca foi mostrado como deveria ser. Daí saiu a importância de cada povo ter onde contar sua história”, afirma.
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E foi justamente a ideia de se fazer uma comunicação que transmita a perspectiva do povo Xukuru sobre sua própria história que proporcionou o surgimento da etnomídia, em 2008, após um curso ministrado pelo projeto Vídeo nas Aldeias.
“A gente passa nas escolas, nas aldeias, mostrando as produções sobre nossa própria história, trazendo mais jovens para a luta através do audiovisual também. Daqueles vinte jovens que fizeram o primeiro curso lá atrás, ficaram três. Mas hoje, a gente tem mais doze jovens de outras aldeias Xukuru. Foi um resgate através das nossas oficinas”, ressalta.
É por meio da página da Ororubá Filmes que a Assembleia do Povo Xukuru é transmitida, expressão máxima da organização sócio-política do povo indígena. Durante a pandemia, foi através das redes sociais e do canal da Ororubá Filmes no Youtube que foi possível viabilizar discussões em todas as 24 aldeias no município de Pesqueira (PE), incluindo instruções sobre os cuidados sanitários com a covid-19.
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“A gente fez nossa assembleia on-line e criou um site para colocar as cartas das assembleias, os áudios, as conversas de nossas as nossas lives”, conta o co-fundador do projeto.
No canal do Youtube, há uma série de conteúdos sobre a luta da etnia, que são transmitidos nas escolas indígenas Xukuru. Desde a aapresentação das lideranças, passando por um retrato da agricultura ancestral do povo, até o processo tradicional da utilização do barro para a confecção de louças.
Representante dos povos andinos do altiplano cundiboyacense, na Colômbia, Tatiana Quintero conheceu a Assembleia Xukuru em 2018. Do primeiro encontro, veio a ideia de fazer um mestrado sobre o trabalho da Ororubá.
A pesquisa "Comunicação Comunitária Indígena: a Ororubá Filmes como um processo decolonial" defendida na Pós-graduação em Comunicação da Universidade Federal de Pernambuco (UFPE) foi defendida no início neste ano e se propõe a entender como a etnocomunicação produzida pelo projeto consegue acelerar os processos de luta e reivindicação dentro do território.
Na assembleia de 2023, a pesquisadora teve a oportunidade de mostrar o resultado do seu trabalho à comunidade e entregar uma cópia ao Cacique Marcos Xukuru.
“Estar no território, voltar para o território com o resultado daquilo que a gente viveu e que a gente trocou é muito emocionante, principalmente ver o acolhimento das pessoas. É a vontade de ver, de saber quais são esses processos que são gerados por eles mesmos, pela comunicação que eles fazem. E, para mim é uma honra”.
Hoje, a comunicação e o audiovisual têm sido uma estratégia vital para ampliar as vozes e viabilizar direitos entre os indígenas. E, segundo Quintero, a Ororubá Filmes vem transmitindo todo esse conhecimento para outros povos do Brasil.
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“Acompanhei eles ministrarem oficinas em outros povos, sendo referência. E isso é muito importante porque assim eles se convertem em agentes multiplicadores e a luta avança muito mais rápido”, conta a pesquisadora.
“O importante de um indígena fazer uma oficina para outro indígena, além da linguagem, é que a gente fala o que a gente passa na realidade. Quando a gente vai até outros povos, a gente mostra a importância do audiovisual como ferramenta de luta, povos que lutam contra ataques de fazendeiros, ataques do governo, e usa como método de defesa também; assim como a gente já usou aqui dentro do povo Xukuru”, acrescenta Diego.
Edição: Douglas Matos