Cerca de 20 organizações e movimentos sociais convocaram uma audiência popular para esta quarta-feira (28), na Universidade Federal do Vale do São Francisco (Univasf), em Juazeiro (BA), a fim de discutir o Projeto de Lei no 12/2023 que visa reduzir a área de preservação permanente (APP) nas margens do Rio São Francisco.
De acordo com Tânia Cristina da Silva, do Movimento Popular de Cidadania (MPC), o ponto mais crítico do PL municipal é a redução dos atuais 500 metros de APP para 100 metros, em desacordo com o Código Florestal Brasileiro. "Apesar da legalidade da proposta do Poder Executivo, embasada pela alteração proposta na Lei nº 14.285, sancionada em dezembro de 2021, ressalta-se que a redução da APP contraria estudos e discussões em convenções mundiais que defendem a proteção dos cursos de água", destaca a militante.
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A legislação federal de 2021 de que fala Tânia Cristina foi sancionada pelo então presidente Jair Bolsonaro (PL), permitindo aos municípios legislarem sobre rios federais que cortam seus territórios. A redução proposta pelo município abrangeria uma área de aproximadamente 800 hectares, entre a comunidade quilombola Barrinha da Conceição, localizada em área vizinha ao Rodeadouro, até a antiga fazenda Mariad.
Uma parte dos conselheiros do Conselho Municipal de Meio ambiente (CMMA) de Juazeiro solicitou que fosse realizada uma audiência pública para amplo debate do PL pela sociedade. Mas estes conselheiros alegam que a proposta foi barrada pelos representantes do Poder Executivo no Conselho. A audiência popular, a ser realizada nesta quarta, foi a alternativa encontrada pela sociedade civil organizada para promover um debate amplo no município.
Pressão imobiliária
A proposta apresentada pelo município alega que a área em questão já não possui os 500 metros preservados, como previsto na legislação federal. Clérison dos Santos Belém, do Instituto Regional da Pequena Agropecuária Apropriada (Irpaa) e representante da sociedade civil no CMMA/Juazeiro, aponta uma pressão do setor imobiliário, que já ocupa o trecho.
Ele afirma que há interesse de empresas privadas em alargar as áreas de ocupação, sem necessariamente recuperar as áreas já degradadas ou promover ações de compensação. "Não seria melhor a gente fiscalizar e punir quem está fazendo ocupação irregular? Não seria melhor reflorestar, recaatingar, recuperar essas áreas que estão à beira do rio?", questiona.
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Tânia Cristina, do MPC, acrescenta ainda que a aprovação do projeto redução legalizaria empreendimentos irregulares "que já se apossaram das margens ribeirinhas, impedindo o acesso de comunidades tradicionais, como ribeirinhos, pescadores; impacta, em médio prazo, na segurança hídrica, a partir do assoreamento do rio, entre outros fatores que contribuem para a intensificação das mudanças climáticas".
Clérison Belém lembra também que o Poder Executivo, propositor do projeto, não aponta um critério técnico para a redução da área de proteção. De acordo com o conselheiro, a Secretaria de Meio Ambiente de Juazeiro fez um estudo que não traz dados científicos que a justifiquem, se contrapondo à legislação federal vigente que prevê, pela largura da calha do leito do rio São Francisco, que a margem de proteção deveria ser de 500m.
O Brasil de Fato entrou em contato com o secretário do Meio Ambiente do município, Islédio (Leo) Bandeira, no entanto, até o fechamento da reportagem, ele não havia respondido.
Era previsto que o projeto fosse apreciado na Câmara antes do recesso parlamentar, mas a movimentação popular em torno do PL coibiu essa tramitação. As organizações também adotaram medidas legais junto à justiça comum, além de recorrer ao regimento do CMMA/Juazeiro para exigir transparência em todo o processo.
"Temos ciência de que a aprovação do projeto de lei será uma grande afronta à sociedade juazeiren-se e, principalmente, ao Velho Chico, também estamos confiantes que logo será embargado por instâncias jurídicas", afirma Tânia.
Fonte: BdF Bahia
Edição: Alfredo Portugal