O julgamento no Tribunal Superior Eleitoral (TSE) sobre a inelegibilidade de oito anos de Jair Bolsonaro (PL) será retomado ao meio-dia desta sexta-feira (30) com o voto da vice-presidente do TSE, a ministra Cármen Lúcia.
A votação foi suspensa nesta quinta-feira (29) depois que votaram a favor da perda do direito político os ministros Benedito Gonçalves, o relator do caso no tribunal, Floriano de Azevedo Marques e André Ramos Tavares. O magistrado Raul Araújo foi o único até o momento que votou pela absolvição do ex-presidente.
A expectativa é que o voto de Cármen Lúcia seja favorável ao pedido do Partido Democrático Trabalhista (PDT), que acusa Bolsonaro de abuso de poder político e uso indevido dos meios de comunicação. Se as expectativas se concretizarem, a magistrada selará o futuro do ex-presidente, formando maioria no STF a favor da inelegibilidade.
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Cenário parecido ocorreu em abril de 2018, quando a ministra desempatou a votação sobre um habeas corpus preventivo ajuizado pela defesa de Luiz Inácio Lula da Silva (PT) a fim de evitar execução temporária da sentença condenatória, esgotadas todas as possibilidades de recurso. Na ocasião, Cármen Lúcia foi o sexto e decisivo voto contra o habeas corpus.
Após o voto da magistrada, Kassio Nunes Marques será o próximo a apresentar o seu voto. A expectativa entre os bolsonaristas é que o ministro faça um pedido de vista, ou seja, pedir mais tempo para analisar a ação. Marques, no entanto, já afirmou que uma inclinação a um pedido de vista é “pura especulação”, em entrevista ao UOL. "Eu nunca tratei desse assunto com ninguém. Pura especulação", declarou. Por fim, vota Alexandre de Moraes, presidente do TSE. Seu voto deve ser o quinto a favor da inelegibilidade.
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Votos até agora
A ação do PDT se baseou na reunião de Bolsonaro com embaixadores de países estrangeiros no Palácio da Alvorada, no dia 18 de julho do ano passado, bem como sua ampla divulgação, pela TV Brasil e pelas redes sociais do ex-presidente.
O julgamento começou na quinta-feira passada (22), quando o ministro Benedito Gonçalves, corregedor-geral do TSE, leu seu relatório sobre os autos do processo. A sessão, no entanto, foi suspensa após a arguição dos advogados de acusação e defesa, Walber de Moura Agra e Tarcísio Vieira de Carvalho Neto, respectivamente. Na última terça-feira (27), o julgamento foi retomado, mas somente Gonçalves apresentou o seu voto a favor da condenação.
Nesta quinta (29), Raul Araújo votou contra o pedido de inelegibilidade, baseando-se na defesa da liberdade de expressão. "Qualquer cidadão pode desejar um modelo de votação diferente daquele vigente no país. Tudo isso se insere no espectro constitucional na liberdade de expressão", disse Araújo.
"Não é todo o discurso [de Bolsonaro] que veicula informações inverídicas, estando presentes posições em que o investigado apenas expôs suas opiniões, como sobre o voto impresso. (...) A democracia não florescerá onde a liberdade de expressão for ceifada."
O ministro afirmou ainda que é necessário mensurar "com prudência a necessidade de intervenção do Poder Judiciário Eleitoral no processo eleitoral". "A conduta analisada afetou o processo eleitoral com gravidade tal que exige intervenção do Poder Judiciário para assegurar a prevalência do sufrágio?", questionou Araújo.
Na sequência, Floriano de Azevedo Marques votou com o relator pela inelegibilidade de Bolsonaro. Logo no início, Azevedo afirmou que minuta golpista, as lives, os depoimentos sobre o contexto das transmissões e as entrevistas à imprensa são "marginais para a análise dos fatos". O ministro afirmou que "os graves desafios" ao processo eleitoral que tiveram lugar antes e depois do pleito, "embora execráveis", não são necessários para configurar abuso de poder e desvio de finalidade na reunião com os embaixadores.
Azevedo destacou que as falas de Bolsonaro sobre o processo eleitoral durante a reunião, a sua apresentação como candidato à reeleição e de suas expectativas em relação ao resultado eleitoral, com mobilização de recursos públicos, já são suficientes para caracterizar abuso de poder. O ministro declarou que Bolsonaro teve claro objetivo de "angariar proveito eleitoral em desfavor de seus concorrentes".
O ministro ainda defendeu que o uso de um prédio público para uma finalidade diferente para o qual foi destinado – no caso, o Palácio do Alvorada – já seria suficiente para caracterizar improbidade administrativa, uma das previsões para inelegibilidade.
Após Azevedo, André Ramos Tavares foi o terceiro ministro a favor da inelegibilidade. O magistrado defendeu que o direito à liberdade de expressão não permite a propagação de mentiras. Disse ainda que houve "inequívoca inveracidade" com "efeitos nefastos, na democracia e no processo eleitoral". "O referido conteúdo é permeado por afirmações falsas e inequívocos ataques a partidos adversários e a ministros do STF e do TSE."
Tavares defendeu também que é "inviável" para o TSE ignorar os fatos notórios circunscritos à reunião com os embaixadores, que teve por objetivo causar "perturbações severas" contra a democracia e o processo eleitoral. "A candidatura foi beneficiada por uma tática que perpassou todo o conteúdo do discurso proferido no âmbito da cerimônia aqui analisada de maneira a agitar as bases eleitorais, no sentido canalizar votos para impedir que qualquer outro candidato, mais especialmente um deles, obtivesse vitória nas eleições de 2022, manipulando-se a polarização da sociedade em benefício eleitoral do investigado", afirmou Tavares.
"A respeito do caráter eleitoral, importante notar que a classificação de determinado ato com o típico da campanha não demanda necessariamente pedido de voto ou exposição de projetos. O cunho eleitoral do evento é verificado a partir da veiculação de táticas típicas de campanha, mais do que isso, uma tática muito própria do investigado."
Edição: Rodrigo Durão Coelho