Em defesa da comunicação pública brasileira, políticos, representantes do Governo e do movimento de radiodifusão comunitária no país participaram, nesta quinta-feira (29), do lançamento da Frente Parlamentar Mista em Apoio às Rádios Comunitárias.
Composta por 200 deputados federais e 8 senadores de diversos partidos, a Frente tem como objetivo discutir procedimentos e ações que viabilizem e fortaleçam a atuação do setor de radiodifusão comunitária através da simplificação e desburocratização de seus processos. Segundo o requerimento de registro da Frente, a proposta é "tornar os procedimentos relacionados à exploração destes fundamentais veículos de comunicação cada vez mais céleres em seus trâmites e simplificados".
A cerimônia realizada na Câmara dos Deputados foi marcada pelo anúncio, por parte do Governo Federal, de mudanças nas legislações referentes ao setor e pelo tom de unidade entre movimentos e poderes Executivo e Legislativo em torno da luta pelo direito à comunicação. Segundo o presidente da Frente, deputado federal Jadyel Alencar (PV-PI), trata-se de um momento histórico em que parlamentares, governo e movimentos "formam uma só programação, uma só sintonia".
"As rádios comunitárias desempenham um papel fundamental na promoção da justiça social, na democratização da comunicação, no fortalecimento das comunidades locais e no combate às fake news. Entender todos esses desafios e buscar soluções é o dever desta frente parlamentar", afirmou o deputado.
Novo decreto
Durante o evento os representantes do Ministério das Comunicações (MCom), Wilson Weilish, e da Secretaria de Comunicação Social da Presidência da República (Secom), Ricardo Zamora, confirmaram a notícia que a Pulsar Brasil havia adiantado: que o Governo Federal está preparando um decreto para atualizar as legislações que instituem e regulamentam o serviço de Radiodifusão Comunitária (RadCom), em especial o Decreto 2.615/98.
De acordo com Zamora, a Secom tem trabalhado especificamente para viabilizar a veiculação de publicidade institucional em rádios comunitárias. Segundo ele, "isso era uma competência precípua da Secom".
"Determinadas informações da comunicação institucional do Governo têm que ser prestadas lá na ponta. E quem faz isso são as rádios comunitárias", frisou.
O secretário destacou ainda que, além do novo decreto, o governo deve publicar também uma instrução normativa para regular a destinação dos recursos às rádios.
"Como as rádios nunca receberam publicidade institucional, nós vamos fazer algumas medidas inaugurais: cadastro, prova de vida, documentação, regularidade fiscal, enfim, um conjunto de questões que são necessárias para viabilizar", explicou Zamora.
Na mesma linha, o secretário de Comunicação Social Eletrônica do MCom, Wilson Weilish, enumerou algumas das novidades do novo decreto que, segundo ele, "está em um caminho avançado".
De acordo com Weilish, o novo texto deve alterar a atual regra que determina que a "cobertura restrita de uma emissora do RadCom é a área limitada por um raio igual ou inferior a mil metros a partir da antena transmissora", passando a considerar apenas a altura e a potência da antena.
Outra modificação diz respeito ao prazo de renovação de outorga, que passará de três para dez anos. Neste ponto, o secretário reconheceu que o prazo vigente contradiz a própria lei que institui a radiodifusão comunitária (Lei 9.612/98). Por fim, o representante do MCom disse que o governo também pretende ampliar o prazo para solicitar a renovação de outorga. O prazo atual é de um a três meses antes do vencimento. Com o novo decreto passaria para dois a 12 meses anteriores.
Democratização
Convidada a participar da mesa do lançamento, a jornalista e integrante do Conselho Político da Associação Mundial de Rádios Comunitárias (Amarc Brasil), Taís Ladeira, ressaltou os mais de 25 anos de compromisso do movimento de Radcom com a luta pela democratização da comunicação no Brasil.
"A Radiodifusão Comunitária vem de uma luta por espaço, pela palavra, pela voz, pela democratização do simplesmente existir. Porque, definitivamente, os programas televisivos e as rádios comerciais não conseguem representar a diversidade da população brasileira", pontuou.
De acordo com a jornalista, a atual legislação "apequena, empobrece e coloca no gueto as rádios comunitárias, impedindo que elas possam se autossustentar".
"É assim que as rádios comunitárias vivem, infelizmente: num gueto. Numa classificação como 'Serviço Especial' que de especial não tem nada. O que tem é perseguição, é falta de apoio, é pobreza, é não conseguir pagar as contas, essa é a realidade", denunciou.
Ainda sobre este ponto, a representante da Amarc Brasil fez questão de destacar o lugar de direito das rádios comunitárias conforme o que estabelece o artigo 223 da Constituição Federal em relação à complementaridade dos sistemas de comunicação no país.
"Nós somos simplesmente o setor público previsto na Constituição brasileira. Entre estatal, privada e pública, nós somos radiodifusão pública, sim! Querer nos colocar numa caixinha menor é uma irresponsabilidade com a democracia na comunicação no Brasil", comentou.
Participação Popular
Sobre o lançamento da Frente Parlamentar, Ladeira celebrou a iniciativa e reforçou a importância da articulação como "uma ponte" de interlocução dos movimentos dentro das Casas que legislam sobre a radiodifusão no Brasil.
"Nós temos agora uma ponte concretamente para dentro da Câmara e para dentro do Senado. Então quando estiver sendo discutido aqui qualquer mudança que possa passar agora pela Comissão de Comunicação, que foi criada recentemente, ou pela de Ciência e Tecnologia, essa Frente precisa ser ouvida. E essa Frente precisa ouvir os movimentos de rádios comunitárias, as organizações, a militância, os representantes e as representantes dessas associações, dessas iniciativas pelo Brasil afora".
Ainda durante a cerimônia, a representante da Amarc Brasil entregou ao presidente da Frente uma cópia da carta assinada pelas associações e organizações do movimento de Radcom com as reivindicações feitas ao governo de transição, em dezembro de 2022. Segundo ela, o documento representa parte da memória das articulações e da atuação das rádios nos últimos anos.