A discussão sobre os direitos da Natureza vem ganhando força pelo mundo. Há diversos exemplos de conquistas relacionadas ao Direito da Natureza, como a nova Constituição do Equador, a primeira no mundo a reconhecer expressamente no seu texto os Direitos da Natureza.
A Constituição do Equador foi um marco para todos que defendemos os direitos da natureza. Ela surge através do pensamento dos povos indígenas do Equador. Trata-se de novidade para a sociedade dominante, oriunda do neocolonialismo. Porém, não para os povos originários da América Latina, os quais sempre mantiveram uma relação de respeito para com a Natureza.
Se conseguirmos no Brasil fazer com que também sejam reconhecidos os direitos de Natureza, a primeira grande consequência será fazer com que esses grandes projetos que afetam de modo irremediável os ecossistemas, sobretudo na Amazônia, não possam ser realizados, pois afetariam de maneira a não permitir sua regeneração, o que, na prática, equivaleria a um ecocídio. Um exemplo disso é a Hidrelétrica Belo Monte, no rio Xingu, Pará.
Recentemente, o rio Laje, em Guajará-Mirim (RO), foi reconhecido como um ente vivo e sujeito de direito. Essa foi a primeira vez que um rio teve seus direitos reconhecidos por lei no país. Este marco legal estabelece que o Rio Laje possui o direito de "manter seu curso inalterado", de "prover e receber nutrição" e "coexistir com condições físico-químicas que garantam seu equilíbrio ecológico".
A partir de agora, a própria mentalidade do Judiciário poderá mudar no sentido de fazer com que esse reconhecimento seja efetivo, o que significa que nenhum projeto que cause morte no rio possa ser implantado na sua bacia. O STF já deu sinais de que nossa Constituição é ecocêntrica, e não antropocêntrica.
O reconhecimento do Rio Lage é um passo gigantesco para que outros rios, ou outros ecossistemas no Brasil, tenham esse reconhecimento até que se chegue ao nível que chegou a Constituição do Equador e, em seguida, da Bolívia.
Diante da emergência climática em que vivemos hoje, o reconhecimento dos direitos da Natureza pode nos ajudar a sair desse caminho rumo a um abismo que coloca em risco a própria espécie humana.
Trata-se de uma nova relação com a Natureza. O pensamento de René Descartes, que via o homem como mestre e senhor da Natureza, não mais deve vigorar. Em seu lugar, deve-se colocar o pensamento dos povos originários. Esse será nosso grande passo civilizatório deste século.
*Felício Pontes, procurador regional da República e assessor da REPAM-Brasil
Edição: Rodrigo Durão Coelho