O canal Escola Segura, criado pelo governo para receber informações de ameaças e ataques contra escolas, recebeu 9.139 denúncias em 90 dias de existência. Os dados foram obtidos pelo Brasil de Fato junto ao Ministério da Justiça e Segurança Pública, responsável pela medida em parceria com a SaferNet Brasil.
Os números representam uma média de 97 denúncias por dia desde a criação do canal, em 6 de abril deste ano. No entanto, há uma uma concentração significativa no primeiro mês de atuação devido à comoção social após o ataque em uma escola estadual em São Paulo, no dia 27 de março, e outro em uma creche particular em Blumenau, no dia 5 de abril.
Os dados também revelam um pico no dia 11 de abril, com 1.836 denúncias registradas. O governo não informa a região de maior incidência das denúncias por questões de segurança.
Para Telma Vinha, professora da Faculdade de Educação e coordenadora do grupo Ética, Diversidade e Democracia na Escola Pública do Instituto de Estudos Avançados, ambos na Unicamp, o canal permitiu "conhecer o tamanho do problema" que ela e outros pesquisadores vêm estudando desde 2001 no Brasil.
"Sabemos que milhares de ameaças foram investigadas e prováveis ataques desbaratados devido a forte atuação dos governos, da Secretaria de Justiça e das polícias nas diversas esferas federais, estaduais e municipais. Centenas de perfis de redes sociais foram suspensos e removidos e mais de dois mil casos estão em investigação."
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De acordo com o estudo liderado por Telma, de 2001 a 2023 foram 32 ataques realizados por estudantes e ex-estudantes, com 33 mortes. A maior parte dessas ocorrências está concentrada entre 2022 e 2023, com 18 ataques e 10 mortes, revelando uma escalada desse tipo de violência. Os crimes são cometidos em sua maioria por pessoas do sexo masculino, brancos, que apresentam gosto pela violência e transtornos mentais que foram negligenciados. Entre as principais motivações está a vingança por bullying ou outro episódio de sofrimento na escola e a aproximação desses jovens a uma cultura extremista.
"Se trata de um fenômeno complexo e multifatorial, não há certezas e nem será resolvido em curto prazo", pontua Telma, que acredita que a alta demanda de denúncias tem relação com o medo e a hipervigilância das pessoas diante dos casos recentes.
Diante da ofensiva, diversas instâncias de governos anunciaram medidas de combate a violência, como o reforço do policiamento nas unidades educacionais, palestras com agentes de segurança e investimento em sistema de câmeras e alarmes. O ministro da Justiça e Segurança Pública, Flávio Dino, se reuniu com representantes de redes sociais como o Twitter e o Tik Tok para cobrar medidas mais coerentes e responsabilidade das empresas pelos conteúdos que incitam esse tipo de crime, que foram amplamente compartilhados durante o pico de denúncias sem nenhum filtro. O governo também passou a monitorar o Discord, uma plataforma que atua sem regulação e que tem sido usada para organizar e ensinar jovens a realizarem esse tipo de crime.
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As medidas contribuíram para impedir que novos ataques fossem realizados no dia 20 de abril, quando se relembra o aniversário do Massacre de Columbine, nos EUA. A data causou pânico em cuidadores e muitos não enviaram os filhos para a escola nesse dia, quando foram disseminadas diversas informações falsas sobre ataques planejados para esta data. A especialista destaca que o foco em medidas de segurança pública, no entanto, não atinge a raiz do problema.
"Por se tratar de um tema forte, frequentemente são apresentadas respostas imediatistas de segurança e bem intencionadas. No primeiro momento pode ter sido necessário devido à preocupação com os novos ataques e o pânico generalizado, mas a médio prazo os estudos indicam que atuar somente nas consequências é pouco eficaz para a prevenção. Inclusive essas medidas podem promover outras violências e impactam negativamente o clima da escola", elucida.
Na avaliação de Telma é necessário que as medidas de segurança estejam acompanhadas de ações que contribuam para mudar a cultura e os valores da comunidade escolar e, principalmente, dos jovens, com foco em suas competências emocionais. "Como contribuir para mudar uma cultura das violências e impedir que as crianças e os adolescentes tenham o acesso à comunidades online que estimulam o ódio que ensinam a matar? O clima escolar positivo é promotor do bem-estar, do pertencimento e do cuidado de todos na escola", finaliza.
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Em nota, o Ministério da Justiça e Segurança Pública informou que o canal Escola Segura segue aberto para denúncias e não tem prazo para encerrar suas atividades. A pasta também disse que o edital de R$ 150 milhões para que estados e municípios apresentem propostas de reforço da segurança no entorno das escolas, com ampliação de patrulhas, rondas e aperfeiçoamento tecnológico para monitoramento está em fase de classificação das propostas recebidas.
Para denunciar qualquer suspeita de ataque basta acessar o site gov.br/escolasegura e enviar o máximo de informações que tiver sobre a ocorrência. A denúncia pode ser realizada de forma anônima. Em caso de emergência, o governo orienta a ligar para o 190.
Edição: Nicolau Soares