MEIO AMBIENTE

Por que o Parque Harmonia em Porto Alegre é exemplo de devastação ambiental

Com essas palavras de ordem, ambientalistas se manifestaram diante de parlamentares, governo Melo e a empresa GAM3

Brasil de Fato | Porto Alegre |
Instituto Gaúcho de Estudos Ambientais e movimentos em defesa do Parque iniciaram campanha pela suspensão e reavaliação da obra do tal "parque temático" - Foto: Gabriel Poester

"Suspende, suspende, suspende". Assim a maioria dos presentes à segunda reunião chamada pela Comissão de Saúde e Meio Ambiente da Câmara Municipal de Porto Alegre - a pedido de movimentos ambientalistas - se manifestaram diante de parlamentares e representantes do governo e da empresa GAM3. Ganhadora do direito de uso e abuso do Parque Harmonia - região com cerca de 400.000 m² segundo estudos topográficos de 2005 e cuja biodiversidade está sendo dizimada - a tal empresa e representantes do governo Melo não conseguiram convencer a comunidade presente e nem parte dos vereadores de que seus objetivos sejam a melhoria da área. 

Pior, ficou provado que há uma quantidade imensa de irregularidades legais e crimes ambientais.

Para se ter uma ideia quanto às irregularidades, esteve presente uma das arquitetas responsáveis pelo projeto original que afirmou publicamente que a obra em andamento não condiz com o que foi aprovado em instâncias cabíveis. Independente das críticas que temos ao projeto original, trata-se por si só de justificativa inquestionável para a suspensão das obras. Segundo ela, o que está em andamento não tem aval da Comissão Municipal de Desenvolvimento Urbanístico e Ambiental (CMDUA) nem EVU (Estudo de Viabilidade Urbanística). Isso sem falar na ausência de estudos sobre impacto de vizinhança, de ruídos, manejo de solo e preservação da fauna e flora.

Tais irregularidades legais se dão nos marcos de uma desregulamentação ambiental devastadora vivida em nossa cidade. Para além da responsabilidade central do governo Melo, a fala de um técnico do Ibama presente nessa reunião do dia 11.07, joga luz sobre o quanto a maioria da Câmara de Porto Alegre é co-responsável. Segundo ele, na origem de tais irregularidades está a aprovação, pela Câmara, de uma legislação ambiental inconstitucional - em desacordo com a lei federal - e mais permissiva à destruição ambiental.  

"Devastação, descaracterização e gentrificação"

Com esse título muito apropriado, o Instituto Gaúcho de Estudos Ambientais e movimentos em defesa do Parque iniciaram campanha pela suspensão e reavaliação da obra do tal "parque temático".

Segundo Paulo Brack, professor de Botânica e membro do Instituto, cerca de ⅔ da vegetação foi dizimada. Além das mais de 400 árvores derrubadas, tanto o governo quanto a GAM3 emudeceram ao serem questionados sobre o destino das 85 espécies de aves que viviam na região. Em entrevista à imprensa local, o botânico menciona estudo que mostra o Parque Harmonia como o segundo de Porto Alegre em riqueza de espécies de aves, só perdendo para o Saint-Hilaire. 

Tal devastação obviamente descaracteriza o Parque cuja biodiversidade inclui(a) mata nativa de restinga, campos e pequeno banhado - um ambiente tipicamente campeiro, público e democrático que serviu de espaço tanto para o Acampamento da Juventude nos Fóruns Sociais quanto de querência para o Acampamento Farroupilha e de assembleias de trabalhadores, como bem lembrou um ativista social presente na reunião. À devastação e descaracterização soma-se a exclusão social - chamada de gentrificação. 

Também na reunião de 11.07 foi mencionado o quanto o cercamento e obstrução de acesso aos banheiros públicos afetam a população moradora de rua da região. O absurdo é tal que o próprio secretário do Meio Ambiente(sic) usou sua longa fala somente para falar nos "investimentos" e "retorno mercadológico" da nova concepção do espaço.

Governo e GAM3 em "harmonia" com o projeto ecocida 

E por falar em secretário do Meio Ambiente, Urbanismo e Sustentabilidade, Germano Bremm, serviu (desculpe o termo chulo) de "papagaio de pirata" da empresa GAM3 ao insistir na tese de que a derrubada criminosa das árvores se dá por serem "plantas exóticas".

Como bem explicou uma ambientalista presente na reunião anterior, o conceito de "planta exótica" serve somente para situações em que há invasão de determinado espaço causando problemas na biodiversidade. Não é o caso das espécies que foram dizimadas no Harmonia porque já estavam adaptadas há décadas ali.

Por essa definição quem é exótico mesmo é o secretário, que deveria ser responsável pelo meio ambiente da cidade, mas destila sede de lucro e só falta andar com uma motosserra na mão.

Aliás, sua caneta funciona como tal, pois todas as "atualizações" e "detalhamentos" do projeto foram feitos com seu aval, incluindo aí o salto quântico de derrubada de árvores, que pulou de 80 para mais de 400 (usando a permissividade da legislação ambiental local) através da Autorização para Remoção de Vegetais - ARV.

Assim como no Harmonia, o projeto esdrúxulo na Redenção e a concessão no Parque Marinha do Brasil fazem parte da sanha privatista deste governo que é exemplo de como pensa e age o capital sem disfarces progressistas.   

Já a participação da GAM3 na reunião serviu para confirmar o que a maioria já sabia: o negócio deles é business daquele tipo bem rasteiro e culturalmente pobre de marré.

Quanto à posição da presidência da Cosmam e do MP, esperamos que a primeira reveja sua posição lastimável diante dos fatos, sugerindo estar tudo bem e o segundo não se furte a criminalizar os responsáveis.

Por isso tudo, o "suspende, suspende, suspende" é mais que desejo; é urgência em defesa da vida neste canto sulino do planeta!

Suspensão imediata das obras;
Nova vistoria do MP com presença de representação dos movimentos sociais;
Reavaliação e redesenho do projeto segundo parâmetros de respeito à biodiversidade local;
Embargo imediato de shows e atividades que impactem o ambiente.

*Professora de História, escritora, da coordenação do Projeto PoAncestral – Muito além de 250 e integrante dos Coletivos Preserva Redenção e Parque Harmonia

* Este é um artigo de opinião. A visão da autora não necessariamente expressa a linha editorial do jornal Brasil de Fato.

Fonte: BdF Rio Grande do Sul

Edição: Katia Marko