Nos dias 17 e 18 de julho, líderes da Comunidade dos Estados Latino-Americanos e Caribenhos (Celac) e da União Europeia (UE) se reunirão em Bruxelas, na Bélgica, sede do bloco europeu, para a 3ª Cúpula Celac-UE. O encontro será presidido por Ralph Gonsalves, presidente pro tempore da Celac e primeiro-ministro de São Vicente e Granadinas, além de Charles Michel, que está à frente do Conselho Europeu.
A última cúpula desta natureza ocorreu em 2015, e as partes voltarão a se encontrar num momento de grande transformação regional e global e com a composição política em cada região diversa. Esta edição já causou alvoroço, com as autoridades de Cuba e da Venezuela condenando veementemente a conduta e a atitude da UE nos dias que antecederam a Cúpula, especificamente quanto ao formato e conteúdo do encontro, bem como as posições políticas que têm destacado os membros do bloco Celac.
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No entanto, os líderes da região também destacaram a importância deste momento, especialmente porque a Celac continua crescendo em força e potencial com a participação ativa do Brasil e do México, as maiores economias da região. Líderes do bloco, como o presidente colombiano Gustavo Petro e o presidente brasileiro Luiz Inácio Lula da Silva, também ganharam reconhecimento global por serem as principais vozes em temas como a mudança climática, a guerra em curso na Ucrânia e a necessidade de acabar com a desigualdade socioeconômica.
Paralelamente à Cúpula dos chefes de estado, movimentos populares, sindicatos e partidos de esquerda de toda a América Latina, Caribe e da Europa realizam a Cúpula dos Povos. O evento também acontecerá em Bruxelas nos dias 17 e 18 de julho e busca ser um espaço democrático e plural para a troca entre pessoas, além de promover discussões sobre as principais questões enfrentadas pelos povos de ambas as regiões.
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Para Paula Andrea Polanco Palacio, integrante do INTAL Globalize Solidarity e integrante da equipe organizadora da Cúpula dos Povos, o espaço é “uma oportunidade para ir além das questões impostas oficialmente e levantar a questão sobre que tipo de integração regional queremos para nossos dois continentes e para construirmos relações saudáveis, democráticas e mutuamente benéficas.”
A programação de dois dias contará com palestras e intervenções de líderes renomados do movimento da América Latina, Caribe e da Europa, como João Pedro Stedile do Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra (MST) do Brasil, a ativista haitiana Camille Chalmers do partido PAPDA, a ativista e feminista peruana Aída García Naranjo, “Mocha”, e muitas outras.
Na noite de 17 de julho, no Festival de Solidariedade Cultural, os participantes ouvirão figuras progressistas, como o presidente colombiano Gustavo Petro, o parlamentar britânico Jeremy Corbyn, Jean Luc Melenchon do La France Insoumise e outros.
Rodrigo Suñe, da Assembleia Internacional dos Povos (AIP) e integrante da equipe organizadora da Cúpula dos Povos, destacou que o evento busca complementar o espaço oficial da Cúpula, destacando a perspectiva das pessoas organizadas em movimentos. Deve ir além de “boas declarações”, esclareceu Suñe, e “a Cúpula não deve ser apenas uma contribuição para as discussões políticas, especialmente nesta relação com a CELAC, mas também um processo importante que leve a um calendário de lutas conjuntas para o próximo período em torno desses eixos, de uma relação de não subordinação, de condições de igualdade e respeito à soberania e autodeterminação de nossos povos”.
Sociedade civil de quem?
A Cúpula dos Povos ganhou particular importância na sequência do descontentamento em torno do fórum oficial da sociedade civil, organizado quase exclusivamente pela UE e as suas entidades não governamentais, denominado “Fórum UE-América Latina e Caribe: Parceiros na Mudança”.
O evento foi criticado por organizações latino-americanas e caribenhas, como a ALBA Movimientos, que alegou que a região foi impedida de ajudar a construir o evento e que isso prejudicou a Celac e o espaço da Se caribenha nos últimos anos, chamado de Celac Social. A lista de eventos, participantes e palestrantes nunca foi divulgada pela UE, agravando a já significativa falta de transparência do processo.
Quando surgiram notícias de que ativistas de direita de Cuba e da Venezuela haviam sido convidados para o fórum, o descontentamento só aumentou.
Para Laura Capote, coordenadora da ALBA Movimientos, “o fato de que este fórum esteja sendo organizado pela direita mostra que, embora formalmente eles tenham uma política diferente, ou seja, uma política supostamente aberta à construção de relações regionais de outro tipo, discursivamente o que realmente interessa a eles é construir relações de dominação e sobretudo com aliados de interesses ou aliados na América Latina, Europa e Estados Unidos.”
Capote acrescenta que, neste sentido, a Cúpula dos Povos é ainda mais necessária e vai “dar voz à verdadeira sociedade civil organizada, que tem refletido sobre um grande número de questões que constam das agendas da União Europeia.”
Ela acrescenta que no fórum organizado pela UE, “eles não vão falar do modelo econômico, eles não vão falar da crise socioambiental decorrente do sistema capitalista, eles não vão falar da urgência de criar relações igualitárias e relativas a arcabouços de soberania, eles vão falar de outras coisas, das questões que interessam à União Europeia e que são ideias sobre as quais a própria União Europeia vai avançar, e que a suposta sociedade civil, certamente paga por eles, aplaudirá e dirá 'que ótimo, muito bom'”.
A Cúpula dos Povos acontece nos dias 17 e 18 de julho, na Vrije Universiteit Brussel. A programação do evento está disponível aqui.