Um dos principais aspectos no primeiro dia de julgamento do Massacre de Paraisópolis no Fórum Criminal da Barra Funda, zona oeste de São Paulo (SP) foi o relato de duas testemunhas que afirmaram que as vítimas da ação policial chegaram sem vida ao hospital na madrugada do dia 1 de dezembro de 2019.
"As duas médicas que prestaram depoimento foram muito determinantes em afirmar as vítimas chegaram mortas no hospital. Em razão disso a gente conclui que a polícia alterou a cena do crime. As vítimas morreram em Paraisópolis e os policiais indevidamente transportaram os corpos, alterando a cena do crime", afirmou ao Brasil de Fato o presidente do Conselho Estadual de Defesa dos Direitos da Pessoa Humana (Condepe), Dimitri Sales, na noite desta terça-feira (25).
Sales destaca que os relatos das testemunhas confirmam a tese do Condepe, de que a operação policial que resultou no assassinato de nove jovens que estavam no Baile da DZ7, no bairro de Paraisópolis, naquela ocasião, teria sido premeditada pela Polícia Militar do Estado de São Paulo com a intenção de criminalizar o baile, "por motivação de vingança", após a morte de um tenente da corporação.
"A gente está muito convicto que as testemunhas contribuíram enormemente para a a tese de que a polícia previamente montou uma operação descumprindo os protocolos e, como consequência, assumindo o risco do que viria daquela operação, que foram as nove mortes", afirma Sales. "De modo geral, as testemunhas confirmam a tese de que polícia agiu com dolo eventual e por isso deve ser levada a júri popular", defende o presidente do Condepe.
'Criminosos fardados estão matando nosso povo'
Na manhã desta quarta, familiares das vítimas e entidades de direitos humanos se reuniram para pedir justiça e cobrar responsabilização dos policiais militares. “Criminosos fardados estão matando nosso povo. Queremos viver. Se tivesse um filho de bacana, seria outra situação. Infelizmente, eram todos de periferia”, afirma Maria Cristina Quirino, mãe de Denys Henrique, uma das nove vítimas fatais.
Dos 31 policiais militares que participaram da operação, apenas 12 se tornaram réus e agora passarão a ser julgados. Para os familiares das vítimas e sua defesa, houve conivência do Estado e dos órgãos, com a letalidade policial.
Durante o ato, Quirino lamentou que uma das linhas adotadas pela defesa seja a criminalização do funk e dos jovens assassinados. “Já tentaram fazer isso lá no início, quando a Justiça Militar pediu o exame toxicológico dos nossos filhos, tentando alegar que a possível causa da morte era por eles estarem sob efeito de entorpecentes. Essa tentativa é mais uma narrativa que eles usam para criminalizar [os jovens] e se livrarem do crime que cometeram.”
Relembre
Na noite de 1 de dezembro de 2019, imagens de violência promovida pelo 16º Batalhão da Polícia Militar paulistana no baile da Dz7 na comunidade de Paraisópolis, região sul de São Paulo, inundaram as redes sociais.
Naquela data, a Operação Pancadão, promovida recorrentemente pelo estado, provocou a morte de nove jovens, entre 14 e 23 anos. O caso ficou conhecido como Massacre de Paraisópolis.
A maioria dos jovens morreram asfixiados após o lançamento de spray de pimenta e bombas de gás pela PM, que encurralou os participantes do evento. Um deles morreu por traumatismo.
Na Justiça Militar, a Corregedoria da PM apurou a conduta de 31 policiais militares que estavam na ação. O órgão concluiu que os agentes não causaram as mortes dos frequentadores do baile.
As vítimas que saíram para se divertir e não puderam voltar para casa foram: Marcos Paulo Oliveira dos Santos, de 16 anos; Bruno Gabriel dos Santos, 22; Eduardo Silva, 21; Denys Henrique Quirino da Silva, 16; Mateus dos Santos Costa, 23; Dennys Guilherme dos Santos Franco, 16; Gustavo Cruz Xavier, 14; Gabriel Rogério de Moraes, 20; e Luara Victoria de Oliveira, 18.
Edição: Leandro Melito