Novas revelações também trazem consequências políticas para diferentes personagens
Olá! O Brasil irá, finalmente, acertar as contas com a destruição ambiental, a desigualdade de renda e descobrir quem mandou matar Marielle?
.O último puxadinho. O que não faltam são boas notícias para animar os dias de Fernando Haddad. A prévia da inflação de julho é de queda, com redução nos preços de alimentos, energia e gás, e o mercado já reduziu a expectativa de inflação para 4,90% ao ano. A agência de risco Fitch Ratings elevou a nota do país pelo “desempenho macroeconômico e fiscal acima do esperado” e pela estimativa de que “o novo governo trabalhará para melhorias adicionais”. E até o FMI elevou a previsão de crescimento brasileiro para 2,1%.
Mas, se Haddad está em alta, lá embaixo está o irredutível Campos Neto. O presidente do BC que era tratado como divindade no auge do bolsonarismo-farialimismo, agora está descobrindo não só que é mais um ser humano, como pode prestar contas à lei, mais precisamente ao TCU, que abriu apuração sobre a possibilidade de terceirização da gestão de ativos da instituição. Mas, obviamente, a pressão maior se deve à teimosia em manter a estratosférica taxa de juros, pressão que deve aumentar até a reunião do Copom na próxima semana.
De tão otimista, o mercado recém convertido ao Lulismo fala em queda de até 0,75%, o que é bastante improvável. Porém, a paciência do governo acabou e, como todos os outros índices econômicos apontam melhoras, a irresponsável política do BC levará a culpa pelo pequeno número de postos de trabalho criados em junho. E se a redução da Selic for de apenas 0,25% como alguns preveem, o governo vai abrir fogo para que o Senado derrube Campos Neto. Mesmo que a semana que vem não traga boas notícias do Copom para Haddad, um plano B do governo está em curso: o pacote de dezessete medidas para o mercado de capitais e seguros anunciado nesta semana tem potencial, segundo os analistas, para aumentar a concorrência, aumentar a oferta e baratear o crédito, independente da taxa Selic, e pode ser que, finalmente, os planos do novo PAC saiam da gaveta de Rui Costa.
.Ainda é cedo para comemorar. A redução da taxa Selic é essencial para aumentar o crédito e o consumo, mas ela não é a única peça da estratégia econômica de Lula e Haddad. O tripé inclui ainda aumentar a arrecadação e retomar a industrialização. E, nestes casos, o desafio do ministro da Fazenda parece ser tão árduo quando dobrar Campos Neto.
A medida provisória que regulamenta e taxa os sites de apostas esportivas pode trazer até R$15 bilhões por ano para o caixa da União, mas o alívio nas contas e o fôlego para investimentos devem mesmo ser obtidos com a segunda fase da reforma tributária. Como o assunto aqui é taxação de renda e, principalmente, dos super ricos, a ideia não vai contar com o mesmo apoio do centrão na primeira fase da reforma. A proposta de Haddad atingiria um pouco mais de 2.500 pessoas, ou seja, 1% do contingente dos mais ricos, e só aí arrecadaria R$10 bilhões. Mesmo assim, encontrou resistência de Arthur Lira. Caso a reforma não ande ou a arrecadação seja menor, Haddad poderia ter oposição dentro do próprio partido, já que a alternativa seria diminuir investimentos.
Outro temor da esquerda é que a impossibilidade de aumentar a arrecadação leve o governo a transferir parte da responsabilidade do Estado para o mercado, ou seja, traga privatizações através das “parcerias” público-privadas hoje concentradas no saneamento, mas avançando também em presídios privados, e outras áreas. E se tudo isso já não fosse suficiente para tirar a tranquilidade do ministro, as conclusões do novo censo demográfico apontam que mais cedo ou mais tarde vamos ter que conversar sobre uma reforma da previdência.
.Nem tão verde. O tema da reindustrialização é tão importante para determinar o futuro do país que Lula atribuiu a tarefa a Geraldo Alckmin. O “novo arcabouço industrial”, como tem sido chamado pelo presidente e seu vice, tem três eixos: rejuvenescimento da indústria, inserção nas cadeias globais de suprimento e descarbonização.
Apesar da promessa de dinheiro para isso, não são poucos os problemas que Alckmin terá de enfrentar. Por exemplo, o que fazer com os setores que empregam muita mão de obra, mas ficaram defasados tecnologicamente para competir internacionalmente, como têxtil, móveis, calçados? Os três segmentos somam mais de 1,5 milhões de empregos com baixa formação dos trabalhadores. Como capacitar essa massa de trabalhadores para que migrem para setores mais avançados?
Outro desafio é o lobby do “centrão industrial”, aquele ramo conservador e atrasado, mas guloso por incentivos, como a indústria automotiva, que recebe muito mas entrega pouco apesar do apoio de empresários e sindicalistas. Já entre os ramos que devem ser beneficiados pela ação de Alckmin e do BNDES estão a indústria militar, a de saúde e o agronegócio. Mas com uma condição: a meta é saltar direto para uma economia verde e sustentável, sintonizados com o discurso ambiental e a política internacional do governo.
Na próxima semana, o governo deve anunciar um inédito e pioneiro plano de transição ecológica. Os primeiros passos devem ser a regulação do mercado de carbono e a fiscalização sobre os seis setores mais poluentes: siderurgia, química, alumínio, cimento, plásticos e papel. Além disso, deve aumentar a imposição de critérios ambientais para a liberação de crédito agrícola.
Porém, o Plano corre o risco de ficar nas boas intenções ou apenas na propaganda. Primeiro, porque o próprio governo não faz a sua parte. O Plano da Petrobrás para 2024-2028, por exemplo, prevê 85% dos investimentos para energias fósseis e apenas 15% para a descarbonização. Segundo, porque o mercado de carbono e os títulos verdes, papéis emitidos para financiar projetos com benefícios ambientais, são uma saída bastante questionável para a crise ambiental, jogando água no moinho do mercado financeiro, e com resultados duvidosos, como lembra o estudo de Larissa Packer.
.Todos os centrões. Considerando que os grandes desafios do governo passam necessariamente pelo Congresso, a avaliação no Planalto é de que entregar alguns ministérios para o centrão é o menor dos males. Hoje, a base governista é suficiente, no máximo, para barrar um pedido de impeachment, mas não para aprovar com tranquilidade projetos estratégicos.
A reforma ministerial também é uma oportunidade para Lula ajustar a primeira montagem dos ministérios, cuja composição foi o resultado de duras negociações e acomodações com o centrão sob pressão golpista da trupe militar e bolsonarista. E não é à toa que o “fogo amigo” na Esplanada esteja correndo solto, afinal é óbvio que será o PT quem perderá cargos.
Além disso, algumas apostas de Lula não se comprovaram. Entre os ex-governadores, apenas Flávio Dino tem mostrado trabalho, enquanto Camilo Santana ainda não saiu do labirinto da reforma do ensino médio, Wellington Dias desapareceu depois do anúncio da volta do Bolsa Família, e Rui Costa não entregou nem o novo PAC e nem a articulação política. Em compensação, a indicação do economista petista Marcio Pochmann à presidência do IBGE, sob uma avalanche de histeria do mercado, mostra que Lula prefere os aliados leais e confiáveis.
Com uma intensa agenda internacional pela frente, é provável que Lula anuncie os novos ministros até o próximo dia 7. Enquanto isso, a “escola centrão de toma-lá-dá-cá” continua rendendo seguidores. No centrão midiático, a Globo voltou a concentrar quase 60% das verbas publicitárias do governo, enquanto secam as fontes do braço midiático do bolsonarismo, Record e Jovem Pan. E até os inventores do bolsonarismo ganham seu quinhão para uma reconversão: de olho na verba para a indústria militar e para seguir a doce vida do governo passado, os militares andam se esforçando para agradar Lula e o Planalto, incluindo países do Mercosul nos treinamentos militares.
.Ponto Final: nossas recomendações.
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Ponto é editado por Lauro Allan Almeida Duvoisin e Miguel Enrique Stédile.
Edição: Geisa Marques