Se você for no Ver-o-Peso, você vai encontrar coisas que dificilmente você vai encontrar no Recife
Os mercados públicos se consagraram por serem espaços de comercialização de produtos alimentares, mas também de convívio e trocas culturais entre a população local e turistas que visitam as cidades.
É difícil definir a data exata em que os mercados públicos começam a se espalhar no Brasil. Mas, foi no século XIX, no Brasil Império, que surgiu a necessidade de se ter pontos de comércio mais salubres e com maior controle por parte do Estado. Então, por conta de um discurso médico, que surgem os mercados como conhecemos hoje.
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"É nestes grandes edifícios, com pé direito alto, box organizados, e a partir disso, você tem a inclusão daquele comércio que antes era informal. É um local que a cultura da cidade em seu sentido mais amplo, com a gastronomia, a religiosidade, passa a ser incorporada dentro desse espaço. Os mercados públicos passam a mimetizar a cultura local e a diversidade”, explica o historiador Dirceu Marroquim, doutorando pela USP.
Quer provar o famoso sanduíche de mortadela? Vá ao Mercado Municipal de São Paulo (SP), Quer saborear a culinária mineira? Só visitar o Mercado Central de Belo Horizonte (MG). Se você quer provar tacacá, a maniçoba ou o famoso peixe-frito com açaí é só ir no Mercado Ver-o-Peso, Belém (PA).
Todos esses mercados públicos têm em comum semelhanças na sua estrutura arquitetônica, feitos para acolher o comércio e a circulação de pessoas. Mas, os mercados pelo Brasil carregam, principalmente, a riqueza gastronômica, histórica e cultural dessas cidades.
“Conhecer um mercado público é conhecer o seu povo e sua cultura. Se você for no Ver-o-Peso, você vai encontrar coisas que dificilmente você vai encontrar no Recife ou em Curitiba. Você encontra o local, o característico que representa aquela cidade, seja no souvenir, seja na própria oferta alimentar. Então conhecer o mercado é de alguma forma tocar a alma daquela cidade”.
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Com inspiração francesa, foi instalado no coração do Recife um dos mercados públicos mais antigos do país que data de 1875: o Mercado de São José. É o mercado mais antigo do Brasil com estrutura em ferro. Para o historiador, hoje o mercado traduz a cultura regional.
“Hoje ele apresenta literatura de cordel, souvenirs, mas também tem um comércio de peixe, de ervas, bens religiosos de matriz africana, então é um local que efetivamente apresenta essa complexidade da cultura do Recife, como cada um dos mercados públicos são, cada um ao seu modo.”
Maria da Conceição de Lima Tavares, mais conhecida como 'Ceça das Ervas', é comerciante no Mercado de São José há quase 38 anos. Descendente de indígenas, Ceça trabalha com ervas secas e flores.
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“Eu nasci em mercado público, meu pai era locatário do mercado das encruzilhadas. Estudei e me formei, mas não exerci, gosto mesmo é de mexer com as ervas. O Mercado de São José é muito importante pra mim e pra todos que passam por ele, trabalhamos com pessoas da terra, mas também com turistas que vem de longe comprar ervas aqui”.
Ceça das Ervas ressalta que as vendas estão voltando ao normal após o período mais restrito da pandemia. “As pessoas procuram muito o mercado, quando chegam no Recife, elas não querem ir para o Alto da Sé ou para o Porto, elas querem conhecer o mercado”.
O historiador dá uma dica para quem visitar os mercados. “Quando estiverem em um mercado público, olhem pra cima, olhem além das lojas e o que está sendo oferecido como produto. Olhem os detalhes, o teto, as colunas…isso faz com que essa interação e ancestralidade desses espaços ganhem mais força”.
Ao longo da sua história o Mercado de São José passou por algumas reformas e foi tombado como patrimônio nacional na década de 1970 pelo Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (Iphan). Neste momento o prédio está passando por uma restauração.
Edição: Douglas Matos