Quando a seleção feminina de futebol do Brasil participou do primeiro torneio mundial de mulheres, organizado pela Fifa em 1988, as condições eram precárias. Os uniformes do time masculino foram reaproveitados e as próprias atletas ficaram responsáveis por fazer ajustes nas peças. A limpeza da farda era realizada no chuveiro do hotel também por elas e as caneleiras usadas pelas jogadoras eram improvisadas com papelão.
A história é mais uma na lista de dificuldades e superações historicamente vivenciadas pelas mulheres que jogam futebol no Brasil. Até 27 de agosto, parte dessa jornada está exposta no Museu do Futebol, na mostra Rainha de Copas. Localizado no histórico estádio do Pacaembu, em São Paulo, o espaço é um dos museus mais visitados do país e honra o esporte que se tornou símbolo da nação.
Com imagens, dados e histórias, a exposição retrata o desenvolvimento da modalidade no Brasil, a partir da realização do Mundial Experimental de Mulheres, em 1988 na China. São informações pouco conhecidas e divulgadas, já que o torneio não teve transmissão.
"Nós brincamos que foi quase uma arqueologia do presente, de um tempo muito próximo, mas que foi muito pouco documentando. Foi uma pesquisa feita olho no olho. Contamos com os depoimentos e os acervos pessoais das jogadoras e, em especial, o acervo da Cláudia da Silva, única jornalista brasileira que fez a cobertura do evento. No contexto de uma exposição é muito desafiador", conta Marília Bonas, diretora técnica do Museu do Futebol.
Segundo ela, mesmo o licenciamento de imagens foi difícil, por causa da falta de referências no acervo. Após reunir o material, o desafio da equipe envolvida na exposição foi organizar tudo em uma narrativa que levasse ao público a real dimensão de uma das grandes histórias de superação do futebol brasileiro.
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"Essa turnê experimental na China, sem estrutura, as jogadoras foram sem tradução, com a cobertura de uma única profissional da mídia. Foi, de fato, uma arqueologia compor e recompor esses movimentos, trazer essas imagens, que são raríssimas e lindíssimas, de uma maneira interessante para o público", diz Marília.
A partir do torneio experimental de 1988, a mostra abre espaço para a trajetória da seleção feminina em todos os mundiais que se seguiram. A luta por igualdade está presente, assim como a história das mulheres que protagonizaram essa história.
Marília Bonas afirma que o momento de crescimento e projeção que o futebol feminino vive no Brasil se expressa também no sucesso da mostra, que chegou a receber mais 6 mil visitantes em um dia.
"Estamos muito felizes de poder fazer o Museu do Futebol ser a casa do futebol das mulheres, dentro desse contexto de trazer essas histórias, de trazer, principalmente, as vozes das pioneiras. A maior parte delas não pôde continuar no esporte e a maior parte delas, mesmo que tenha jogado uma copa, jogou uma copa apesar de um monte de questões. É muito maluco pensar nisso no país do futebol, esse tipo de assimetria e violência."
Em paralelo à exposição, o espaço criou uma mostra virtual que reúne o acervo inédito da jornalista Claudia da Silva. Imagens, trechos de matérias, textos e depoimentos estão reunidos e disponibilizados gratuitamente.
O Museu do Futebol está aberto para visitação de terça a domingo, das 9h às 18h (entrada até às 17h). Às terças-feiras a entrada é franca, nos outros dias, os ingressos custam R$ 20,00 (inteira) e R$ 10,00 (meia).
Edição: Thalita Pires