A história da humanidade é timbrada pela inquestionável contribuição da ciência enquanto caminho para obtenção de conhecimento, resolução de problemas surgidos em determinados tempos, lugares e contextos históricos, aperfeiçoamento e superação de conceitos e estudos científicos, além da elaboração de novos e valiosos questionamentos ainda sem respostas. A ciência é, por isto, uma forma categorizada de acúmulo do conhecimento a partir da(s) experiência(s) humana(s).
Apesar da farta produção, o Brasil recentemente passou por um período de apagão e aversão à ciência. O ex-Presidente Jair Messias Bolsonaro – que ficou à frente do Palácio do Planalto entre os anos de 2019 e 2022 – adotou a ignorância como método de governo. No lugar de conduzir o país diante de inúmeros problemas, decidiu-se pela fabricação de um clima de guerra justamente para negar a eficácia do saber.
Uma vez instalado o caos, o então Presidente conseguia avançar em suas pautas e atender aos seus aliados de ocasião. Neste cenário, recordemos que Bolsonaro i) facilitou o acesso da população civil a armas, ii) financiou o estudo cívico-militar; iii) promoveu ofensivas contra o aborto legal; iv) reduziu verbas para o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), dentre outras questões absolutamente questionáveis.
Com uma estampa nova – típico de um procedimento facelift –, Tarcísio de Freitas foi eleito governador do estado de São Paulo e conserva a mesmíssima forma de governo de seu ex-chefe, Bolsonaro pai. Embora não utilize uma linguagem agressiva, carregada de palavrões e de um falso populismo do Capitão, Tarcísio produz um clima de tensão para alcançar objetivos escusos de seus aliados.
Na pandemia, Bolsonaro negou a existência do vírus e a eficácia da vacina, mesmo diante de estudos científicos produzidos por todo o mundo. Todavia, foi ele, o Capitão, contraditoriamente, o garoto propaganda na venda de ivermectina e hidroxicloroquina – ainda que sem nenhuma comprovação de resultado.
Enquanto Bolsonaro estimulou o consumo de remédio(s) sem eficácia em sua gestão, Tarcísio – sem cuspe e sem sinal de arma com as mãos – aboliu o uso do livro didático físico, contrariando, como fazia seu antigo chefe, as recomendações científicas e estudos avançados.
A semelhança e os métodos de operar entre Bolsonaro e Tarcísio não guardam relação apenas no que dizem respeito à ojeriza ao conhecimento e da artificialização do caos. Vai além, já que são ávidos por atender seus aliados financeiramente.
O governo de Bolsonaro, na pandemia, exigiu propina de US$ 1 por dose da vacina em virtude do fechamento de contratos com o Ministério da Saúde. Já no governo do ocupante do Palácio do Bandeiras, Tarcísio de Feitas, o seu secretário de Educação detém três contratos (objeto de investigação) com a pasta pelo fornecimento de 97 mil notebooks às escolas, o que custam R$ 75 milhões aos cofres do Estado.
Na fase inicial da pandemia, Bolsonaro pediu que seus seguidores filmassem o interior de unidades hospitalares para averiguar a ocupação dos leitos, criando-se, a partir de tal estímulo, riscos aos pacientes e constrangimento aos profissionais da saúde, como médicos, enfermeiros e auxiliares. Já Tarcísio, por sua vez, determinou que diretores e coordenação pedagógica monitore os professores em sala de aula.
Embora revestida de certo ar de formalidade, posto que a medida é decorrente de portaria, a finalidade de Tarcísio é idêntica àquela outrora incitada por Bolsonaro, qual seja: ignorar a ciência e as recomendações de especialistas no assunto, produzindo-se risco(s) e constrangimento(s) aos profissionais da área da educação, tal como seu mentor fez, à época, com os profissionais da saúde.
A ciência avançou – e seguirá avançando. Porém, Bolsonaro e Tarcísio seguirão sendo os mesmos negacionistas, independentemente da mão de verniz que se dê.
* Douglas Samoel Fonseca é graduado em História pela PUC/SP, mestrando em Psicologia Social pela mesma instituição, Coordenador do Cursinho Popular Padre Ticão da Frente Democrática de Ermelino Matarazzo (FDEM).
** Maria Lúcia Samoel Fonseca é assistente social e integrante da Frente Democrática de Ermelino Matarazzo (FDEM). É uma das coautoras do livro Democracia e(m) Crise: o travamento de lutas populares em Defesa do Estado de Direitos, editora Pedro & João, 2020.
*** Este é um artigo de opinião. A visão dos autores não necessariamente expressa a linha editorial do jornal Brasil de Fato.
Edição: Thalita Pires