"Uma conquista da sociedade brasileira". Assim o pesquisador de políticas educacionais e professor da Universidade Federal do ABC (UFABC) Fernando Cássio avalia o Programa Nacional do Livro Didático (PNLD), que o governo paulista, chefiado pelo bolsonarista Tarcísio de Freitas, quis abandonar. O recuo só veio após decisão judicial.
Tarcísio e o secretário estadual de Educação, Renato Feder, anunciaram no último dia 1º que os livros, oferecidos sem custos pelo Ministério da Educação (MEC), seriam substituídos por material digital, e as aulas seriam realizadas com apoio de slides. A mudança de planos foi anunciado nesta quarta (16).
Em entrevista ao Central do Brasil, programa do Brasil de Fato em parceria com a TVT, Fernando Cássio disse que o PNLD, que existe há décadas, não é perfeito e pode ser alvo de críticas. Entretanto, tem papel fundamental para a educação no país.
"Embora a gente possa ter nossas críticas em relação ao PNLD, do ponto de vista da concentração de contratos na mão de grandes editoras, é um programa que distribui para as escolas públicas no Brasil inteiro livros didáticos de alta qualidade, com impressão profissional. Os mesmos que circulam nas escolas privadas, e são avaliados por especialistas", pontuou.
Cássio destacou, ainda, que as exigências do PNLD têm reflexos até mesmo na rede privada de educação, já que induzem as editoras a fazer melhorias nos materiais como um todo. "A própria forma como a sociedade brasileira é retratada, como a diversidade no país é retratada, isso mudou nos livros didáticos por conta do PNLD, por conta das exigências dos editais", resumiu.
O especialista aponta que a medida que chegou a ser anunciada (e depois tirada de cena) ilustra a forma de agir do governo paulista em suas mais diversas instâncias. Ao tomar a decisão de forma unilateral, o executivo chefiado por Tarcísio feriu o princípio da gestão escolar democrática, previsto na Constituição.
"O próprio secretário de Educação diz que eles gostariam de 'evitar o duplo comando': o livro diz uma coisa, o slide diz outra. Isso é uma leitura do trabalho de professores e professoras como um trabalho que não tem nenhum tipo de criatividade, nenhum tipo de atividade intelectural. Entende a professora e professor como mero passador de slides em sala de aula, o que mostra profundo desconhecimento sobre o que é educação e o que é que se faz numa sala de aula", pontuou, destacando que Feder é empresário do ramo de tecnologia.
Em nota em que confirmava ter voltado atrás, o governo paulista não mencionou a decisão judicial, e afirmou que agiu "a partir da escuta e do diálogo com a sociedade". Segundo a administração Tarcísio, todos os alunos da rede pública, de ensino fundamental e médio, terão acesso a material digital e impresso, o que inclui os livros do PNLD e material específico da rede pública de São Paulo.
Confira abaixo a entrevista de Fernando Cássio na íntegra:
Edição: Thalita Pires