Como o setor mais fundamentalista e o setor mais popular dos evangélicos vão reagir aos escândalos?
Olá! Dez, nove, oito… Lula e Haddad correm contra o tempo para ter dinheiro em caixa, enquanto Bolsonaro conta os últimos dias em liberdade. Botem a gelar o espumante.
.A caminho da forca. Uma possível confissão do tenente-coronel Mauro Cid de que ele negociou as joias a mando de Jair Bolsonaro, assim como adulterou seu cartão de vacinação, só confirmariam duas coisas que todos já sabiam. Primeiro, durante quatro anos o Estado brasileiro foi assaltado por uma gangue de escroques que, por trás de um discurso fundamentalista, tinha apenas o interesse em enriquecer às custas do patrimônio público. E, segundo, formada por militares e ex-militares, a turma de Bolsonaro fez o que fez porque contou com a tradição histórica de impunidade para quem veste farda. Não faltaram colunistas na grande imprensa saindo em defesa dos coitadinhos militares que ingenuamente teriam aceitado ingressar num governo com a melhor das intenções. E, claro, há ainda um José Múcio que acha que seu cargo é o de Ministro da Defesa dos Militares, sempre pronto a inocentar os quartéis em qualquer episódio, incluindo o 8 de janeiro. Apesar disso, este cordão sanitário não é suficiente para esconder a realidade. A CPMI do 8 de janeiro teve um momento de suspensão da letargia com o depoimento de Walter Delgatti, o "hacker de Araraquara". Mesmo sempre dez passos atrás da PF e do STF, a sessão ressuscitou a CPI e jogou mais problemas no ventilador bolsonarista, inclusive nos militares. E para fechar a semana com chave de ouro, Alexandre de Moraes autorizou a quebra dos sigilos bancário e fiscal de Jair e Michelle. O silêncio dos seguidores do capitão nas redes sociais, onde ele reinou por muito tempo, só comprova que o estrago foi perturbador. A pergunta agora é: como o setor mais fundamentalista e o setor mais popular dos evangélicos vão reagir aos escândalos? Estes fatores esvaziam a tese de Thomas Traumann de que uma prisão de Bolsonaro poderia levar a um “ressurgimento” da massa bolsonarista em defesa de seu líder, e que era também uma preocupação do STF até a semana passada. Mas que ninguém espere uma prisão do capitão Jair Messias para amanhã. Segundo Helena Chagas, a estratégia em curso é ir sangrando Bolsonaro até que a opinião pública não tenha mais dúvidas sobre o acerto de uma condenação seguida de prisão. Enquanto isso, Flávio Dino segue fazendo o trabalho de higienizar o Estado. Além de fazer as investigações do caso Marielle avançarem, Dino atacou outro símbolo do bolsonarismo, exonerando os policiais rodoviários que assassinaram Genivaldo de Jesus Santos em um camburão-câmara-de-gás. Mais um sinal de que a impunidade fardada pode estar chegando ao fim.
.Pisca alerta. Surfando numa popularidade crescente, que vai inclusive solapando as bases de seu antigo adversário, Lula pode dedicar-se a pensar no futuro. O governo lançou o ousado Plano de Transformação Ecológica aproveitando o eco da Cúpula da Amazônica e o lançamento do PAC que pretende abarcar mais de cem itens da economia, com destaque para a fusão do Plano Safra com o Plano ABC e a criação do mercado de carbono. Mas o principal objetivo de Lula continua sendo o mesmo: gerar crescimento com distribuição de renda num país que tem a pior mobilidade social do mundo, segundo a OCDE. E, embora o presidente esteja conseguindo reunir condições políticas favoráveis, o cenário econômico ainda é precário porque o Estado não tem margem de manobra no orçamento. O plano inicial era resolver esse problema através da dobradinha novo arcabouço fiscal e reforma tributária. Porém, o Senado ainda não tem data para apreciar a reforma tributária e, considerando que a Lei de Diretrizes Orçamentárias (LDO) também precisa ser aprovada, é provável que o imbróglio não se resolva este ano. Além disso, a equipe econômica já percebeu que a capacidade de arrecadação da reforma ficará aquém de suas expectativas. Uma das alternativas buscadas por Haddad é a taxação dos fundos exclusivos ligados à nata dos investidores do país - que somam R$ 245 bilhões - e também extinguir o juro sobre capital próprio com que as empresas remuneram seus acionistas, o que geraria R$ 10 bilhões à União. Ainda não seria a sonhada cobrança de impostos sobre dividendos ou grandes fortunas reivindicada pela esquerda, mas aponta o caminho da distribuição de renda tão almejada por Lula. No entanto, esse plano tem dois problemas. Primeiro, apesar do impacto simbólico, a arrecadação não seria suficiente para sanar as necessidades do governo. Mas o segundo problema é ainda mais importante: tocar nos ricos no Brasil sempre é uma jogada arriscada. Ainda mais quando o governo ainda não conseguiu superar problemas históricos e graves, como os apagões elétricos e o aumento no preço dos combustíveis. Por isso, Lula deve manter-se atento aos pontos fracos de seu governo, pois são eles que podem vir a canalizar insatisfações.
.Faz um Pix. Já se passou um mês desde a votação da reforma tributária na Câmara e o jantar de pacificação do centrão, mas a prometida reforma ministerial continua em banho maria e sempre adiada para a próxima semana. Isso porque a agenda do presidente Lula está voltada para o exterior em agosto e setembro, com destaque para a cúpula dos BRICS no fim do mês. Mas, se na imprensa, o governo e o centrão repetem os mesmos movimentos de puxa e afrouxa, nos bastidores parece que as coisas estão muito mais tranquilas. Além de agradar Arthur Lira durante o lançamento do Novo PAC, Lula e Alexandre Padilha não se cansam de repetir que Silvio Costa Filho e André Fufuca já são praticamente pré-ministros e só falta definir o endereço. Além disso, a Caixa Econômica e as agências reguladoras também devem ter novos representantes indicados pelo bloco de Arthur Lira. E isso - acreditem se quiserem - parece satisfatório por hora. O pânico maior está entre ministros petistas e de aliados que podem ter seus ministérios desmembrados ou cadeiras trocadas para acomodação de Fufuca e Costa Filho. Prova da tranquilidade com o cumprimento dos combinados está no fato de que, cada um à sua maneira, governo e centrão, já pensam na sucessão de Arthur Lira em…2025. Também pode ser medida pelas ações de Lira, em tabelinha com o Planalto, para dar um freio na CPI do MST, isolando a ala bolsonarista e o próprio relator Ricardo Salles. A CPI deve morrer de inanição nos próximos dias, não sem antes ter um embate em torno do relatório de Salles, pronto desde sempre, e um relatório alternativo da base governista. O isolamento do bolsonarismo contribui para deixar a vida de Lira e do governo mais tranquila, mas também para que o PP possa avançar sobre os deputados do PL e tentar atraí-los com o bom trânsito com o Planalto - leia-se liberação de emendas, agora até por Pix - próximo das eleições municipais.
.Ponto Final: nossas recomendações.
.Por que a África está se tornando campo de batalha entre Rússia e Ocidente. Entenda as raízes da nova onda de instabilidade no continente africano. Na BBC Brasil.
.Os enigmas da Argentina. Depois das primárias, Claudio Katz tenta explicar o que parece ser uma crise sem fim no nosso país vizinho. N’A Terra é Redonda.
.O assassinato de Marielle e a polícia sob o comando de Tarcísio. No Jornal da USP, Bruno Paes Manso analisa os traços comuns entre as chacinas policiais no Rio de Janeiro e em São Paulo.
.Do assentamento ao Parlamento. Na Jacobin, a trajetória da jovem deputada estadual pernambucana Rosa Amorim, militante do MST.
.100 mil mulheres lotaram Brasília na Marcha das Margaridas. A Pública traz relatos e imagens da marcha ocorrida esta semana e os decretos do Governo conquistados com a mobilização.
.Como os trabalhadores conquistaram o final de semana. Porque, ao contrário do que se pensa, o descanso semanal não foi criado por deus. No Jacobin Brasil.
.Como o Secos & Molhados desafiou a ditadura. Conheça os bastidores da banda que revolucionou o Rock brasileiro nos anos 1970. No Outras Palavras.
*Ponto é editado por Lauro Allan Almeida Duvoisin e Miguel Enrique Stédile.
** Este é um texto de opinião. A visão do autor não necessariamente expressa a linha editorial do jornal Brasil de Fato.
Edição: Geisa Marques