EM CINCO MESES

Dilma: banco do Brics aumentou empréstimos e reduziu custos

Ex-presidenta, que dirige o NDB desde abril, ressaltou resultados dos cinco meses de sua gestão

|
Discurso de Dilma Rousseff na Cúpula do Brics ressaltou trabalho de recuperação da liquidez do NDB nos últimos cinco meses - TV Brics

A ex-presidente brasileira Dilma Rousseff realizou um dos mais destacados discursos da jornada desta quarta-feira (23/08) da Cúpula do Brics, em Johanesburgo, na África do Sul.

Como presidente do Novo Banco de Desenvolvimento (NDB, sigla em inglês da instituição também conhecida como Banco do Brics), Dilma destacou os “muitos esforços que foram necessários promover nos últimos cinco meses, já que o NDB enfrentava sérios problemas de liquidez até o início do nosso mandato, em março de 2023”.

Segundo a ex-presidente brasileira, sua administração no banco precisou lidar com um cenário complexo, resultado dos problemas que a instituição enfrentou nos últimos anos, devido à pandemia de covid-19, as sanções impostas por países do Ocidente a membros do Brics, entre outras situações.

“Para superar essa situação, o NDB fortaleceu sua governança nos últimos cinco meses, contando com o apoio decisivo de nosso Conselho de Administração, que aprovou imediatamente nossa proposta de criação de um Comitê Executivo, com a responsabilidade de discutir e decidir sobre todos os assuntos estratégicos do banco. Isso acelerou nosso processo de tomada de decisão, com prazos devidamente estabelecidos e cumpridos”, declarou.

A presidente do NDB também ressaltou que a instituição diminuiu os custos dos empréstimos, apesar do aumento global das taxas de juros, o que, segundo ela, “indica que o NDB está no caminho certo para tornar uma gama mais ampla de investimentos mais acessível e adequada para nossos países membros”.

“Outros dois dados positivos sobre a posição atual do banco são: primeiro, os desembolsos feitos nos últimos cinco meses já são maiores do que os de todo o ano de 2022. Segundo, esperamos aprovar 12 novos empréstimos antes do final deste ano. Estamos solicitando ao Conselho de Administração que aumente o total autorizado de empréstimos para 2023, de US$ 6 bilhões para US$ 10 bilhões. Hoje, o NDB é um banco bem capitalizado, com alavancagem muito baixa, e possui todas as condições para expandir seu papel como uma ferramenta importante para realizar os projetos de desenvolvimento sustentável de que nossos países precisam”, apontou a ex-presidente brasileira.

Dilma também enalteceu a “busca por uma maior diversificação de moedas” como uma das prioridades do NDB durante sua gestão. “O Banco realizou várias captações bem-sucedidas em renminbi no mercado chinês e, na semana passada, também conseguiu realizar uma emissão pioneira em rands, aqui mesmo na África do Sul. Estamos em estágio avançado de obtenção das aprovações necessárias para emitir títulos em rúpias na Índia e também iniciamos estudos legais para nos capacitar a captar recursos em reais brasileiros”.

“De fato, o financiamento em moedas locais é um dos principais objetivos do NDB, como é claramente estabelecido na Estratégia Geral do Banco 2022-2026, que estipula que 30% de todo o nosso financiamento fará uso das moedas de nossos países membros”, acrescentou.

A outra prioridade destacada pela presidente do NDB é a inclusão de novos membros, e nesse sentido foi mencionada a adesão recente de Bangladesh, Egito e Emirados Árabes Unidos.

“A vocação do NDB é a de funcionar como uma verdadeira plataforma de cooperação entre os países do Sul Global, porque isso fortalece sua base de capital e incorpora uma ampla variedade de relações comerciais e diversos projetos de desenvolvimento. Isso possibilitará a construção de uma estrutura financeira que traga a marca do multilateralismo e de um mundo multipolar. Múltiplas e diversas vozes serão ouvidas”, frisou Dilma.

Leia abaixo a íntegra do discurso de Dilma na Cúpula do Brics, em Johanesburgo:

 

Senhoras e senhores, 

Os desafios do século atual tornam essencial que o desenvolvimento econômico seja sempre visto como um desenvolvimento sustentável e inclusivo.

A missão do NDB é mobilizar recursos para investimentos no desenvolvimento logístico, econômico e social, expandir energias alternativas, combater as mudanças climáticas e construir conectividade com infraestrutura física e digital.

O respeito ao direito de cada país de definir sua própria estratégia de desenvolvimento está codificado no DNA do NDB. Nossas prioridades são as prioridades de nossos membros, porque o NDB é um banco criado por e para países em desenvolvimento.

Como presidenta do banco, estou comprometida em garantir que nosso trabalho seja feito sem impor condicionalidades ligadas a qualquer política pública ou projeto privado. Nosso apoio financeiro é fornecido sem condições onerosas.

Desde sua criação, o banco apoiou 98 projetos de investimento, correspondendo a aproximadamente US$ 33 bilhões. Apenas para 2023 e 2024, já temos um pipeline de 76 projetos, totalizando US$ 18,2 bilhões.

Para atingir essa posição de robustez operacional em um curto período de tempo, muitos esforços foram necessários, já que o NDB enfrentava sérios problemas de liquidez até o início do nosso mandato, em março de 2023.

É verdade que esses problemas foram, em grande parte, causados pelos efeitos cumulativos de algumas crises, como o trabalho remoto devido à pandemia de covid-19, conflitos geopolíticos e sanções, e seu impacto nas classificações das agências de rating, aumentos nos preços de energia e alimentos, levando à inflação, aumento acentuado nas taxas de juros em países desenvolvidos, entre outros.

A consequência para o banco foi uma séria crise de liquidez. Enquanto isso, para muitos países em desenvolvimento, os resultados foram pressões recessivas e aumento do endividamento devido a flutuações nas taxas de câmbio.

De fato, o NDB passou 15 meses sem realizar nenhuma emissão pública de títulos denominados em dólares e a última captação denominada em yuan ocorreu em outubro de 2022, por meio do programa “Panda Bonds”, que expirou, sendo retomado somente em maio de 2023.

Para superar essa situação, o NDB fortaleceu sua governança nos últimos cinco meses, contando com o apoio decisivo de nosso Conselho de Administração, que aprovou imediatamente nossa proposta de criação de um Comitê Executivo, com a responsabilidade de discutir e decidir sobre todos os assuntos estratégicos do banco. Isso acelerou nosso processo de tomada de decisão, com prazos devidamente estabelecidos e cumpridos.

Os resultados se materializaram rapidamente.

Identificando as verdadeiras necessidades de financiamento do banco e definindo uma estratégia de captação de recursos, o NDB voltou ao mercado internacional em 26 de abril, com uma emissão de US$ 1,25 bilhão.

Essa emissão foi mencionada nas observações iniciais do relatório da agência de classificação Fitch, que mudou a perspectiva atribuída ao NDB de “negativa” em 2022 para “estável” agora. Desde então, o Banco retornou ao mercado 13 vezes, levantando fundos em yuan, dólares norte-americanos, dólares de Hong Kong e rands sul-africanos, totalizando um valor de US$ 4,3 bilhões em menos de cinco meses.

Os custos dos empréstimos também diminuíram desde nossa primeira emissão este ano, apesar do aumento global das taxas de juros. A trajetória descendente de nossos custos indica que o NDB está no caminho certo para tornar uma gama mais ampla de investimentos mais acessível e adequada para nossos países membros.

Outros dois dados positivos sobre a posição atual do banco são: primeiro, os desembolsos feitos nos últimos cinco meses já são maiores do que os de todo o ano de 2022. Segundo, esperamos aprovar 12 novos empréstimos antes do final deste ano. Estamos solicitando ao Conselho de Administração que aumente o total autorizado de empréstimos para 2023, de US$ 6 bilhões para US$ 10 bilhões.

Hoje, o NDB é um banco bem capitalizado, com alavancagem muito baixa, e possui todas as condições para expandir seu papel como uma ferramenta importante para realizar os projetos de desenvolvimento sustentável de que nossos países precisam.

Junto com o reforço de nossa presença nos mercados financeiros tradicionais, o NDB reconhece a importância central de multiplicar as relações do Banco com investidores de todo o Sul Global: na Ásia, em particular, onde estão nossos escritórios; no Oriente Médio; na África; e na América Latina.

Essa busca por uma maior diversificação de moedas já rendeu benefícios concretos para o NDB, especialmente no que diz respeito à emissão em moeda local. O Banco realizou várias captações bem-sucedidas em renminbi no mercado chinês e, na semana passada, também conseguiu realizar uma emissão pioneira em rands, aqui mesmo na África do Sul. Estamos em estágio avançado de obtenção das aprovações necessárias para emitir títulos em rúpias na Índia e também iniciamos estudos legais para nos capacitar a captar recursos em reais brasileiros.

De fato, o financiamento em moedas locais é um dos principais objetivos do NDB, como é claramente estabelecido na Estratégia Geral do Banco 2022-2026, que estipula que 30% de todo o nosso financiamento fará uso das moedas de nossos países membros.

Queremos superar o descompasso entre os fluxos de caixa do projeto e do financiamento e reduzir as necessidades de proteção. É uma questão de eliminar os riscos que a exposição às taxas de câmbio e às taxas de juros internacionais representam para o financiamento de nossos mutuários soberanos e privados, para lhes proporcionar custos mais baixos e maior segurança. A captação e o financiamento em moeda local também promovem parcerias público-privadas e financiamento de projetos, bem como uma arquitetura financeira multipolar e multilateral inclusiva.

A Estratégia Geral do NDB também se concentra em outra prioridade importante, ou seja, a expansão da adesão ao banco. Em 2022, o NDB obteve um feito extraordinário quando três novos parceiros se juntaram ao banco, em uma excelente iniciativa que incluiu Bangladesh, Emirados Árabes Unidos e Egito entre nossos membros.

A inclusão de novos membros apoia a vocação do NDB de funcionar como uma verdadeira plataforma de cooperação entre os países do Sul Global, porque isso fortalece sua base de capital e incorpora uma ampla variedade de relações comerciais e diversos projetos de desenvolvimento. Isso possibilitará a construção de uma estrutura financeira que traga a marca do multilateralismo e de um mundo multipolar. Múltiplas e diversas vozes serão ouvidas.

Em resumo, o alcance financeiro e de investimento do NDB só crescerá porque:

1) garante um suprimento regular de fundos para investimento, com uma cesta de moedas que expressa a diversidade de nossa base de investidores, a custos compatíveis com as necessidades de nossos acionistas;

2) aumenta a captação e o financiamento em moedas locais;

3) inclui novos países como membros do banco, de acordo com os interesses de nossos acionistas;

4) multiplica parcerias com outros bancos multilaterais e instituições de desenvolvimento nacionais e internacionais;

5) fortalece nossa relação com o setor privado;

Essas iniciativas permitem que nossa instituição tenha um impacto cada vez maior no desenvolvimento de nossas economias nos próximos anos.

Como uma instituição voltada para países em desenvolvimento e economias emergentes, o NDB está fortemente empenhado em promover a inclusão social e de gênero. A capacidade de gerar prosperidade é a base para essa inclusão.

Para as mulheres, o NDB deve apoiar projetos capazes de garantir uma variedade de oportunidades, desde o estímulo ao empreendedorismo até o acesso a renda, serviços públicos e empregos de qualidade. A Aliança Empresarial de Mulheres do BRICS pode contribuir para isso.

Para países em desenvolvimento e economias emergentes, trata-se de superar a condição de meros fornecedores de commodities, considerando a imensa riqueza que temos em terras raras e diversos minérios.

O Sul Global precisa buscar agregar valor à sua riqueza e sua fonte de sustentabilidade. Ele precisa buscar a reindustrialização com novas características.

Senhoras e senhores,

Agora, diante da quarta revolução tecnológica e industrial, corremos o risco de nos tornarmos apenas consumidores dos produtos das “plataformas de alta tecnologia”, limitados, em nossas economias, a sermos usuários passivos de aplicativos digitais. Portanto, precisamos de uma conectividade inteligente e produtiva.

O NDB não atua sozinho. Precisamos trabalhar cada vez mais próximos e diretamente com nossos países membros para identificar melhor suas necessidades mais significativas e concentrar nosso apoio em projetos que tenham maior impacto adicional.

Estou confiante de que, juntos, podemos realizar essa visão. Muito obrigada.