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Canto do Galo, uma gafieira e tanto!

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Mas a classe média do bairro não frequentava esses lugares. Pinheirense tinha o nariz empinado e fingia não gostar desses ambientes populares - Creative Commons
Eu e uns conterrâneos começamos a chamar o estabelecimento de Bar do Chico da Ritinha

Houve uma época em que havia muitas gafieiras em São Paulo. Eu frequentei várias. No bairro de Pinheiros tinha um lugar muito bom para dançar forró, chamava-se Asa Branca; e depois surgiu no largo da Batata uma gafieira das boas, chamada Canto do Galo.  

Mas a classe média do bairro não frequentava esses lugares. Pinheirense tinha o nariz empinado e fingia não gostar desses ambientes populares. A frequência era de trabalhadores braçais e empregadas domésticas, além do meu grupo de estudantes e conterrâneos.  

Quando comentei com a Célia, minha namorada, que frequentei bastante o Canto do Galo, chegamos à conclusão que devo ter dançado com uma empregada doméstica da família dela, assídua frequentadora, que acabou arrumando um namorado lá e se casando com ele.  

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Um detalhe dessa gafieira era uma placa na parede: “proibido dançar de sandálias havaianas”. Então, era comum encontrar alguma frequentadora com o sapato apertado ou maior que o pé, emprestado da respectiva patroa (ainda que às vezes a patroa não soubesse desse empréstimo). 

O conjunto que tocava lá era sempre o mesmo, e minha turma tinha uma admiração especial pelo baterista, não pela sua qualidade, mas pelo visual, que não chegava a ser o do Falcão, atual rei do brega, mas era bastante “avançado” para a época.  

Terno claro, camisa verde e gravata vermelha, sapato de duas cores, branca e marrom, e óculos escuros. Parecia muito com um roceiro da minha terra, conhecido como Chico da Ritinha.  

Por causa disso, eu e uns conterrâneos começamos a chamar o estabelecimento de Bar do Chico da Ritinha. E passou a ser conhecido por esse nome. 

Um sábado à noite, depois de uma viagem de férias, fui ao Bar do Chico da Ritinha. Pensei que estaria abarrotado de gente, mas não tinha ninguém. Estranhei. Nem os instrumentos do conjunto musical estavam nos devidos lugares.  

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Havia um homem atrás do balcão, fui conversar com ele. Perguntei o que aconteceu e ele me respondeu com sotaque italiano:  

— Aqui agora é lugar de família. Comprei e pus ordem na casa. 

Não falei nada. Só pensei: “bobalhão”, e fui pra outro lugar.  

Mais uns meses depois, passei lá e estava fechado, com a placa “passa-se o ponto”.  Bem feito, pensei. Tomara que tenha tido muito prejuízo.

 

*Mouzar Benedito é escritor, geógrafo e contador de causos. Leia outros textos

**Este é um artigo de opinião. A visão do autor não necessariamente expressa a linha editorial do jornal Brasil de Fato.

Edição: Douglas Matos