A área ocupada por lavouras de soja no Brasil deve atingir, em 2033, 55 milhões de hectares –cerca de 85% a mais do que ocupava em 2013. Nesse mesmo período, a área dedicada à plantação de arroz e feijão cairá 61% e passará a somar 2,2 milhões de hectares.
Isso quer dizer que, daqui a dez anos, haverá 25 vezes mais terra no país ocupada por plantações de soja do que por lavouras de arroz e feijão, juntos.
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As previsões constam do estudo Projeções do Agronegócio, Brasil 2022/23 a 2032/33, feito pela Secretaria de Política Agrícola, do Ministério da Agricultura e Pecuária (Mapa) e pela Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária (Embrapa). Ele foi publicado em julho.
O estudo traz um panorama da produção agrícola nacional e balizam investimentos públicos em pesquisa agrícola no país.
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De acordo com ele, a produção de grãos no Brasil deverá aumentar 24% em dez anos, chegando perto de 390 milhões de toneladas na safra 2032/2033. O crescimento se dará, principalmente, por conta da produção de soja, que já é o que mais se planta no país.
“As previsões apontam para a manutenção da tendência de produção para a exportação. Isso tem a ver com o crescimento da China, que demanda cada vez mais alimentos”, explicou Walter Belik, professor titular aposentado de Economia Agrícola do Instituto de Economia da Universidade Estadual de Campinas (Unicamp). Belik também é diretor do Instituto Fome Zero e presidente da Associação Prato Cheio.
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Dentre os grãos, entretanto, a produção de arroz e feijão cairá até 2033 –2% e 5%, respectivamente. Isso acontecerá porque a área plantada das duas culturas cairá 66% e 36%, também respectivamente, numa década.
As lavouras de arroz, por exemplo, ocupavam 2,3 milhões de hectares em 2013. Nesta safra, passaram a ocupar 1,4 milhão de hectares. Em 2033, serão de 489 mil hectares –queda total de 79% em 20 anos.
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O feijão ocupava 3,3 milhões de hectares em 2013. Nesta safra, baixou a 2,7 milhões de hectares. Em 2033, serão de 1,7 milhão hectares –queda 48%.
“O consumo de feijão vem caindo. O consumidor brasileiro come cada vez menos feijão”, acrescentou Belik. “Já o arroz está com consumo estagnado, mas há anos que temos que importar do Uruguai.”
Rumo à monocultura
Belik disse que, independentemente das tendências de consumo, o crescimento da soja e a queda do arroz e feijão preocupam. “Isso é ruim. Temos uma diversidade cada vez menor de culturas à disposição do brasileiro”, afirmou. “Fora a dependência que temos do mercado externo, para onde vai toda essa soja.”
Para Belik, o governo precisa aumentar o incentivo para a produção de alimentos e a agricultura familiar.
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Diego Moreira, da coordenação nacional do setor de produção do Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra (MST), também pede mais incentivos. “O governo brasileiro precisa recolocar o Estado em defesa dos interesses nacionais. Entre eles, está o interesse no combate à fome e na defesa da nossa população”, afirmou.
“O modelo hegemônico do agronegócio reforça a produção de matéria-prima. O aumento da área plantada de milho e soja para exportação coloca em risco a segurança alimentar da população”, acrescentou.
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Plano Safra
O governo federal anunciou em junho um Plano Safra para Agricultura Familiar com valores recordes. O programa destinará R$ 71,6 bilhões em crédito rural para fomento ao trabalho de pequenos produtores durante a safra 2023/2024 – 34% a mais do que na safra anterior.
Essa parte do Plano Safra terá incentivos extras para produção de alimentos e, principalmente, para produção de orgânicos.
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Também em junho, porém, governo anunciou um Plano Safra de R$ 364,2 bilhões à agricultura convencional –crescimento de 27% com relação ao da safra anterior.
Procurados pelo Brasil de Fato para comentar as projeções do governo sobre a safra de soja, arroz e feijão, o Ministério da Agricultura e o Ministério do Desenvolvimento Agrário não responderam até a publicação desta reportagem.
Edição: Rodrigo Durão Coelho