No Brasil, já temos as ferramentas necessárias [para descriminalizar aborto]
O voto da presidenta do Supremo Tribunal Federal (STF), Rosa Weber, pela descriminalização do aborto ainda não pode ser considerado um avanço. A avaliação é da psicóloga e pesquisadora Nathália Diórgenes Ferreira Lima, coordenadora do curso de Serviço Social da Universidade da Integração Internacional da Lusofonia Afro-brasileira (Unilab).
“A legalização do aborto é a ponta do iceberg para o controle da vida, dos corpos, da capacidade reprodutiva e capacidade de trabalho das mulheres. Se eu, uma mulher, não tenho direito a decidir sobre o meu corpo, eu vou ter direito a mais o que na minha vida?”, questionou Diórgenes durante entrevista concedida ao programa Bem Viver desta quinta-feira (28).
A edição do Bem Viver desta quinta-feira (28) pode ser ouvida no player acima. Diariamente, o programa vai ao ar na Rádio Brasil Atual (98.9 FM - Grande São Paulo), de segunda a sexta-feira, das 11h às 12h.
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A posição da especialista vem do entendimento da Marcha Mundial das Mulheres, movimento do qual ela é militante, que entende que a legalização do aborto é apenas o início de uma série de alterações que a sociedade brasileira precisa encarar.
Diórgenes traz esse questionamento para explicar, por exemplo, por que ainda é difícil encontrar mulheres em espaço de poder, como no Congresso Nacional ou no próprio STF.
Na última sexta-feira (22), Rosa Weber votou a favor da descriminalização do aborto realizado durante as 12 primeiras semanas de gestação. No entanto, o julgamento foi paralisado temporariamente para que siga em plenário físico, o que ainda está sem data certa para ocorrer.
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Para Diógenes, esta letargia da suprema corte permite que mulheres, em especial negras, sigam sofrendo violências do próprio Estado.
“A gente precisa ligar a questão do aborto às desigualdades maiores que acometem as mulheres brasileira. Quando a gente fala de aborto, a gente fala do paradoxo de maternidade, que significa as mulheres negras serem negadas do direito à maternidade, afinal são elas as mais acometidas por mortes maternas. Ou quando têm sua maternidade roubada pelo Estado por conta de um jovem negro assassinado”, afirma a pesquisadora.
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Diórgenes vê o 28 de setembro como “uma oportunidade de dialogar com a sociedade”.
Há 33 anos, esta é uma data de mobilização internacional de movimentos feministas. Em 1990, foi criado o Dia da Luta pela Descriminalização e Legalização do Aborto na América Latina e Caribe.
Naquele ano, houve o 5º Encontro Feminista Latino-americano (EFLAC). O evento ocorreu na Argentina e definiu o 28 de setembro como uma data para visibilizar a situação do aborto na região e gerar conscientização.
Desde então, oito países da América Latina passaram a permitir que o aborto seja realizado em qualquer circunstância, desde que feito até determinado período de gravidez.
México, Colômbia e Argentina passaram pela mudança nos últimos três anos. Contando com o Uruguai, que legalizou o aborto em 2012, tais decisões legais fazem parte da chamada “onda verde” na América Latina.
Entre todas essas mobilizações, Nathália Diórgenes apresenta a Argentina como um exemplo de inspiração para o Brasil.
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“Eu gosto muito da Argentina. Elas tiveram a legalização massificando a luta pelo aborto, tornando popular, a ponto de, mesmo perdendo uma votação, elas não desistirem e seguirem mobilizadas”.
A pesquisadora faz referência a 2018, quando, na Argentina, o projeto de lei que propunha a legalização do aborto chegou a ser aprovado na Câmara dos Deputados, mas rejeitado pelo Senado argentino.
Menos de três anos depois, na virada de 2020 para 2021, o projeto de lei voltou ao Congresso e, desta vez, foi definitivamente aprovado e sancionado pelo presidente Alberto Fernandez.
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No Brasil, Nathália Diórgenes defende que “já temos as ferramentas”.
Ela faz referência à Frente Nacional contra a Criminalização das Mulheres e pela Legalização do Aborto, “que é formado por diversos movimentos, sindicatos, ONGs, centros de pesquisas... É uma série de organismos que compõem e formam pauta conjunta este debate”.
A entidade é a responsável por organizar as mobilizações que acontecem por todo país nesta quinta-feira. A Frente articula 80 organizações espalhadas por todas as regiões do país e 14 Frentes Estaduais.
Confira aqui onde acontecem atos nas ruas de todo o país.
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Edição: Rodrigo Chagas
