OPINIÃO

Os velhos, os novos e os grandes desafios da Petrobras aos 70 anos de idade

Empresa sobreviveu, mas com sequelas; reestatização e preços independentes são fundamentais para seu futuro

Brasil de Fato |
Não pudemos usufruir das vantagens criadas pelo Pré-Sal
Não pudemos usufruir das vantagens criadas pelo Pré-Sal - Sadi Machado / Divulgación

A Petrobras chega aos seus 70 anos tendo sobrevivido a mais uma incursão privatista. Mas com sequelas. Foram R$ 290 bilhões em ativos vendidos desde 2015. Fazem parte dessa lista campos de petróleo, refinarias, gasodutos, distribuidoras de combustíveis e de gás de cozinha (GLP), usinas eólicas etc. A Petrobrás - do poço ao posto, do poço ao poste - foi fatiada e, apesar de se manter viva, não é a mesma empresa integrada de antes. 

Não foi só a Petrobras que sofreu nos últimos anos, todos os brasileiros foram vítimas dessa política saqueadora e extrativista. Graças ao Preço de Paridade de Importação (PPI), gasolina, diesel e GLP alcançaram os maiores valores da história do Brasil, em 2022. 

A Petrobras, que foi criada para garantir a segurança energética do país, estava servindo para gerar inflação e pobreza. A inflação ficou por quase um ano na casa dos dois dígitos. Além disso, os preços recordes do GLP fizeram o consumo de lenha disparar e atingir o maior patamar dos últimos 13 anos. 

Mesmo que tenhamos atingido a autossuficiência de petróleo, conquista histórica atribuída à Petrobras e ao Pré-sal, não pudemos usufruir disso pagando preço justo pelos combustíveis. Desde a adoção do PPI, nós e qualquer outro país que não produza um pingo de petróleo, tivemos que pagar o mesmo preço pelo combustível. 

A situação foi agravada com a privatização das refinarias. Em 2021 a Acelen passou a controlar uma das maiores refinarias do país, a Rlam (hoje Mataripe), na Bahia. Depois foi a vez da Reman, no Amazonas, SIX, no Paraná, e Clara Camarão, no Rio Grande do Norte. Desde a primeira privatização, o povo da Bahia, do Norte e agora do RN teve que desembolsar, em média, 6% a mais pela gasolina, 3,3% pelo diesel e 14% pelo GLP. Monopólios privados regionais foram impostos às populações dessas regiões. 

Outro agravante se deu com a venda da BR Distribuidora e da Liquigás. Desde que foram privatizadas, a margem de distribuição e revenda do diesel subiu 117%, da gasolina aumentou 82% e do GLP, 87%. Para se ter uma ideia, quando a Liquigás foi vendida, em dezembro de 2020, a margem era de R$ 28 e hoje está em R$ 53. 

Com relação à transição energética, venderam parques de energia eólica da estatal, grande parte das usinas de biocombustíveis e os investimentos na área se restringiram à descarbonização de alguns processos. Com isso, a Petrobras parou no tempo, enquanto as grandes petrolíferas no mundo corriam a passos largos. 

O saque foi finalizado com uma política de distribuição de dividendos nunca vista na história. Para dar vazão ao dinheiro da venda de ativos e de preços abusivos, a direção da empresa aprovou pagamentos que muitas vezes excediam o próprio lucro da Petrobras. 

Além de uma política totalmente irresponsável – que empresa distribui mais do que tem de lucro? –, ela serviu apenas para enriquecer os grandes acionistas da companhia. Apesar de ser estatal, a Petrobrás tem como maior parcela de acionistas os investidores estrangeiros (47%). 

Outro episódio chamou atenção. O BNDES vendeu em 2020 grande parte de sua participação na Petrobras e deixou de receber R$ 20 bilhões em dividendos, valor que teria por direito caso se mantivesse dono das ações da Petrobras. Pirataria pura e simples. 

Com tanta destruição, os novos desafios para a Petrobras são da mesma magnitude. Primeiro, é fundamental a reestatização dos ativos vendidos, a começar pelas refinarias. É justo que façamos com que os amazonenses tenham que pagar 44% pelo GLP, pelo simples fato de a Reman ter sido privatizada? É justo que o povo baiano tenha que pagar 15% a mais pelo diesel porque a Rlam foi privatizada? Ou reestatizamos ou as desigualdades regionais se aprofundarão ainda mais. Segundo, temos que garantir uma política de preços realmente independente. O fim do PPI foi um avanço, garantindo preços menores, no entanto ela ainda está submetida aos preços internacionais. Vimos isso em agosto, quando entidades de importadores chantagearam a Petrobras até ela subir os preços do diesel.

A Petrobras tem que ter uma política independente e com preços justos. Para isso, é fundamental a expansão de sua capacidade de refino, com novas refinarias e ampliação das plantas já existentes. Também precisa voltar a ser a importadora de combustível do país. Se a estatal importar todo o diesel necessário não dará espaço para as chantagens e sabotagens. 

Por fim, temos o grande desafio da transição energética. A renda petroleira tem que servir para que a Petrobras faça grandiosos investimentos em energia limpa, principalmente em biocombustíveis, eólica e solar. Sabemos que a emergência climática está se dando de forma mais rápida do que os cientistas estimavam. 

A Petrobras já se atrasou demais e tem o dever de liderar a transição energética nacional. Os petroleiros lutarão até o fim para que a Petrobrás sirva ao objetivo que foi criada, que é abastecer e dar segurança energética com preços justos à população brasileira. Parabéns, Petrobrás! Parabéns, petroleiros! Que venham mais 70 anos!

 

* Adaedson Bezerra da Costa e Eduardo Henrique Soares da Costa  são secretários-gerais da Federação Nacional dos Petroleiros (FNP)

** Este é um artigo de opinião e não necessariamente expressa a linha editorial do jornal Brasil de Fato.

Edição: Rodrigo Durão Coelho